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    Livro revela cultura da impunidade na 'capital do estupro' dos EUA

    RODOLFO LUCENA
    DE SÃO PAULO

    20/06/2015 02h00

    A cada 107 segundos, alguém sofre um ataque sexual nos Estados Unidos. A maioria dos casos, porém, não chega ao conhecimento da polícia, de autoridades ou mesmo de parentes ou amigos da vítima: 68% das ocorrências não são notificadas.

    Em consequência, quase todos os predadores ficam livres para seguir na perseguição de novas presas: 98% dos estupradores não passam nem sequer um dia na cadeia.

    O resultado é uma chaga social: 17,7 milhões de mulheres já foram vítimas de estupro ou de tentativa de violência sexual, de acordo com números divulgados pela Rainn, a maior ONG dos EUA contra esse tipo de crime.

    Em quase metade (47%) dos casos, o agressor é conhecido da vítima. E as universidades vêm se tornando um palco favorito de violadores.

    É o que mostra "Missoula: Estupro e Sistema Judicial em uma Cidade Universitária", mais recente livro-reportagem do jornalista e montanhista Jon Krakauer, autor do best-seller "No Ar Rarefeito" –relato de tragédia ocorrida com um grupo de escaladores do monte Everest em 1996.

    Missoula é uma cidade do Estado de Montana que recebeu o desagradável apelido de "capital do estupro" depois da revelação de uma série de casos registrados na área entre 2008 e 2012.

    Foram 350 no período, poucos deles tratados "adequadamente" pelas autoridades, segundo o Departamento de Justiça dos EUA.

    Muitos ocorreram no campus da Universidade de Montana, nas fraternidades estudantis ou em outros locais frequentados por alunos.

    Talvez para destacar o inusitado, o livro começa contando o dia em que uma estudante, violentada por um colega, recebe a notícia de que o estuprador tinha sido preso e confessara o crime.

    Com base em entrevistas, documentos da polícia, relatórios de investigações na universidade e atas de julgamentos, Krakauer recupera toda a história do caso.

    Vai além: mostra que o ataque à jovem foi um de uma fieira cometida pelas estrelas do adorado time local de futebol americano. Um foi condenado, mas outros tantos seguiram sem punição.

    "A Universidade de Montana, o Departamento de Polícia de Missoula e o Ministério Público do Condado de Missoula são responsáveis pela impunidade", conclui Krakauer em seu livro, mostrando uma sequência de erros e omissões que resultam no fracasso de processos.

    Funcionários da universidade deixam de denunciar casos às autoridades, que, por sua vez, não os leva à polícia. Esta, por sua vez, não treina adequadamente seus investigadores para esse tipo de acusação; quando a investigação é feita, o Ministério Público muitas vezes desiste da ação por medo de não conseguir uma condenação.

    FORA DA CAPITAL

    O livro Krakauer se concentra em Missoula, mas aborda um problema disseminado.

    O Escritório de Direitos Civis do Departamento de Educação dos EUA divulgou uma lista de mais de 90 universidades suspeitas de violação de leis federais sobre o tratamento de crimes sexuais.

    A lista inclui nomes como Harvard, Princeton e Universidade da Califórnia.

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