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    Paulistano toca piano durante filme clássico e recria clima de cinema mudo

    (...) Depoimento a
    ESTÊVÃO BERTONI
    DE SÃO PAULO

    20/06/2015 02h00

    Formado em engenharia mecânica –tradição na família–, o paulistano Tony Berchmans, 45, desistiu da carreira ainda na faculdade, quando montou um estúdio.

    Aficionado por trilhas de cinema, ele se licenciou neste ano do trabalho como produtor de jingles de comerciais de TV para se dedicar ao projeto Cinepiano, em que acompanha no piano filmes mudos como "O Circo", de Chaplin. Em 7 de julho, ele se apresenta em São Paulo.

    *

    O que faço era comum na época do cinema mudo: o filme não tinha nenhuma música composta, era lançado sem som e muitas vezes um pianista o acompanhava, de improviso, na sala de cinema.

    Minha proposta é recriar essa atmosfera usando um piano acústico e, quando dá, um projetor de 16 mm para cópias em película.

    Isso é muito marcante, porque tem gente que nunca viu um projetor. Faço questão de colocá-lo no meio da sala, para as pessoas ouvirem o barulho e terem a sensação de estar num lugar mágico.

    É surpreendente para o público acompanhar ao vivo a trilha sonora sendo tocada.

    A música de cinema é uma paixão de adolescente. Enlouquecia imaginando as cenas de "ET" (1982), do Spielberg, ao ouvir a trilha em LP. Nessa época, comecei a sonhar com a minha vida profissional.

    Divulgação
    O pianista Tony Berchmans toca, ao vivo, trilha sonora de filme "O Gordo e o Magro"
    O pianista Tony Berchmans toca, ao vivo, trilha sonora de filme de O Gordo e o Magro

    Sou engenheiro mecânico, mas nunca atuei na área. Fiz a faculdade porque era uma coisa de família. Meus irmãos são engenheiros. No meio dos estudos, montei um estúdio em Piracicaba, onde morava desde os oito. Meu pai se mudou para lá após se aposentar na capital como bancário.

    A minha família é muito musical. Tenho nove irmãos, e todos, em algum momento, aprenderam música.

    Estudei violoncelo e flauta, mas, para valer, toco só piano e acordeão.

    Meu estúdio foi uma experiência legal, mas no interior a gente tinha pouca chance de progredir financeiramente. Então eu consegui alguns estágios em estúdios grandes em São Paulo e fui trabalhar compondo jingles e trilhas para comerciais de televisão.

    Eu não entrei no mercado do cinema porque ele praticamente não existia no Brasil nos anos 90.

    Mas a paixão por trilha sonora sempre existiu. Eu era um colecionador de livros e discos até que, em 2006, acabei escrevendo um livro sobre a criação e a produção de música para o cinema.

    E essa obra foi muito bem-aceita, tanto pelas faculdades quanto pelo público cinéfilo.

    A partir do livro, comecei a dar palestras. Ministro praticamente todo ano um curso no MIS (Museu da Imagem e do Som), baseado no livro. Também fui convidado para ser o curador de um festival grande no Rio, em 2007.

    No ano seguinte, fui a Los Angeles visitar o agente do John Williams (autor da trilha de "ET"). Queria trazê-lo ao Brasil, mas não deu certo. Ele só se apresenta nos EUA.

    Nessa viagem, acabei vendo numa salinha de cinema em Hollywood o pianista Bob Mitchell acompanhando um filme mudo. Ele tinha 96 anos e era talvez o último representante vivo do cinema mudo.

    Eu nunca tinha visto aquilo. Falei: "Eu sou pianista, preciso voltar a estudar para valer. Preciso fazer isso".

    Já acompanhei uns 15 filmes diferentes, como o "Metrópolis" (1925), alguns suspenses do Hitchcock e os meus preferidos, que são as comédias de Chaplin, Buster Keaton e o Gordo e o Magro.

    A dificuldade maior do projeto é o piano, instrumento pesado e caro que não tem em todo lugar.

    Mas, se comparada a outros espetáculos, a produção não é tão complicada. Produzir o show de uma banda pode ser mais difícil.

    Uma vez, em Uberlândia (MG), caiu a força três vezes no meio da apresentação. Tecnicamente, foi um desastre, mas foi divertido porque mostrei a improvisação.

    Fiz umas 50 apresentações. Toquei na Noruega, na Itália e na Romênia. O público da Romênia foi incrível: 600 pessoas num teatro no domingo de manhã. Aquilo me deu um "insight": o espetáculo tem linguagem universal. Agrada crianças, adultos e velhos de qualquer lugar do mundo.

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