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    À mão: Caligrafia artesanal vira moda e dá toque vintage até a cartas de amor

    ESTÊVÃO BERTONI
    DE SÃO PAULO

    19/07/2015 02h00

    Zé Carlos Barretta/Folhapress
    O calígrafo Fábio Maca, 37, que desenhou o título desta página
    O calígrafo Fábio Maca, 37, que decidiu mudar de carreira e virar calígrafo

    Teve um dia em que Fábio Maca, 37, olhou para o que tinha rabiscado no papel e pensou: "Pô, minha letra é feia".

    "Eu estava num período de mudanças. Tinha trocado de trabalho e de namorada. E a minha letra era a mesma."

    O publicitário buscou ajuda especializada. De Andréa Branco, 49, uma das principais calígrafas do país, ouviu: "Calma, essa é a sua letra". Entendeu que aquilo era um traço de sua personalidade.

    Pôs a letra no papel e decidiu incliná-la. Esticou-a. Fez dela massinha de modelagem até se apaixonar por ela.

    Faz quase dois anos que Fábio largou a publicidade. Equipou-se com canetas, pinceis, tintas, escâner e impressora. Hoje, continua brincando com as letras. É calígrafo.

    Em casa, inventa tatuagens, quadros, pôsteres, cartões e convites de casamentos. Escreve também em lousas de restaurantes e bares.

    No Instagram, participa do "Minha Carta de Amor" (@minhacartadeamor), projeto em que recebe cartas amorosas e caligrafa trechos delas em cartazes, que são depois fotografados com os autores e postados na rede social.

    "Existe uma paixão na moçada hoje, principalmente em designers gráficos e publicitários, de fazer a letra, de descobrir esse prazer de escrever e de usar instrumentos e tintas diferentes", diz Andréa, que nos anos 80 trocou a pedagogia pela caligrafia.

    Em 1999 ela começou a ensinar para qualquer pessoa, de qualquer idade. Em 2003, abriu um curso só para designers. E só vê a área crescer.

    "A caligrafia é extremamente relaxante. Você pode criar uma fonte, digitalizá-la e disponibilizá-la mundialmente", afirma.

    Fabio Braga/Folhapress
    Alexandre Mieda, 36, com seus materiais de caligrafia
    Alexandre Mieda, 36, com seus materiais de caligrafia

    A tentativa de resgatar um modo "artesanal" de vida explica por que muitos jovens estão se voltando para a caligrafia, na opinião de Beatriz Modolin, gerente da WGSN, empresa especializada em análise de tendências.

    "Há um sentimento de nostalgia do tempo em que não havia tantas telas nos rodeando", afirma. Os novos calígrafos concordam com ela.

    Designer há 15 anos, Alexandre Mieda, 36, começou a se interessar pelas letras há um ano. "As coisas começaram a ficar muito engessadas com o computador. Tem muita coisa pronta, muito tutorial. Foi uma tendência natural: como podemos fazer isso diferente?", afirma.

    Mas fazer diferente, para Alexandre, foi fazer como se fazia no passado. "Teve uma corrente forte de querer inovar não inovando. O retrô e o vintage se tornaram moda."

    O publicitário Diogo Delog, 24, que faz trabalhos com caligrafia há dois anos num estilo influenciado pela arte de rua, pondera que a escrita à mão tem se aproveitado da internet. "É mais fácil disseminar um trabalho. Acompanho artistas de fora, e o cara de fora vê o que faço", diz.

    Ele, que também é grafiteiro e dançarino de break, afirma que a volta da caligrafia está também associada à vontade das pessoas de quererem algo único. O que explica os pedidos de letras exclusivas para tatuagens, algo que não era tão comum antigamente.

    Fábio Maca já criou algumas, por encomenda. Na hora de botar a ideia no papel, tenta se basear no jeito da pessoa que fez o pedido.

    A maioria das mensagens que escreve é otimista. Já fez duas para a palavra "equilíbrio". Nesta semana, trabalhava em "Love is all you need". "Tem muito do racional, mas tento sentir também na hora de criar", conta.

    Fábio reconhece o caráter artístico de sua atividade, mas diz não se sentir um artista. "Sou mais um artesão. Eu vou lapidando. Gosto de encontrar as letras", afirma.

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