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    Em Curitiba, parceria com médicos ensina depiladora a alertar sobre DSTs

    ESTELITA HASS CARAZZAI
    DE CURITIBA

    30/08/2015 02h00

    Faz dois meses que a depiladora Elania de Oliveira Souza, 51, tem um bloquinho no balcão do seu salão de beleza. Quando precisa, saca a caneta e preenche um formulário: "Eu, depiladora amiga, encaminho minha cliente à unidade de saúde do bairro para orientações".

    Elania é uma das dez mulheres treinadas para serem "depiladoras amigas", num projeto-piloto feito na rede de saúde de Curitiba, idealizado pela Universidade Positivo. A ideia é ensinar as profissionais a identificar lesões que apontem doenças sexualmente transmissíveis e estimular as clientes a procurar auxílio médico.

    "A mulher brasileira vai todo mês à depiladora, mas ao médico vai uma vez por ano e olhe lá", diz a médica Andressa Gulin, professora da universidade e uma das idealizadoras do projeto. "E não é uma depilação que tira só os cantinhos. Elas estão na intimidade da mulher."

    Quando a ideia foi gerida, no início deste ano, os números preocupavam: aumentava a ocorrência de algumas doenças venéreas em Curitiba, e caía o número de mulheres que faziam seus exames preventivos. Na unidade piloto, a meta anual não estava sendo atingida.

    Theo Marques/Folhapress
    Depiladora Elania de Oliveira Souza (centro), rodeada de participantes do projeto no PR
    Depiladora Elania de Oliveira Souza (centro), rodeada de participantes do projeto no PR

    "A procura diminuía a cada mês", conta a chefe da unidade, Marcia Bora. Ela encampou a ideia de Gulin e da colega Tatiane Herreira Trigueiro, que leciona enfermagem na universidade. Com a ajuda de alunas e das agentes de saúde, mapearam as 18 depiladoras do bairro e fizeram o convite a cada uma.

    Num curso de quatro horas, elas aprenderam a diferenciar o que é normal do anormal e tiveram contato com a estrutura da unidade de saúde. A dica final é não diagnosticar, mas orientar a cliente a procurar um médico. O slogan do projeto fala por si: "Quem avisa amiga é".

    As aulas vieram ao encontro das apreensões das depiladoras. "Tem muita coisa que eu via e nem sabia o que era", conta Elania, que exerce a função há oito anos. "Agora, sinto mais confiança para comentar."
    Ela acredita que ter feito o curso ajuda a quebrar resistências. "Antes, se eu falasse alguma coisa, a cliente já se fechava. Se bobeasse, pulava da maca e ia embora", diz, aos risos. Agora, algumas inclusive tomam a iniciativa de partilhar dúvidas, porque já sabem do treinamento.

    No posto de saúde, houve um aumento do número de exames preventivos: de 21 por mês, pulou para 52. O resultado ainda é preliminar, mas anima a equipe.

    Para Gulin, o projeto ajuda a romper tabus, tanto em relação a DSTs quanto a resistências contra o SUS. "Há vergonha, preconceito. As pessoas costumam dizer 'Ah, mas vai demorar meses'. Não vai, a coleta é feita na hora."

    A médica vê no projeto uma oportunidade de atingir especialmente adolescentes que estão iniciando a vida sexual. "Elas não falam disso com a mãe, não marcam consulta com médico, mas vão à depiladora", diz Gulin.
    Para Trigueiro, as depiladoras podem ser "informantes-chave" da comunidade.

    A Prefeitura de Curitiba quer expandir o projeto para outras unidades ainda este ano. Vai acrescentar orientações sobre higiene e abordar doenças e situações mais prevalentes em cada bairro.

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