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    Minha História

    'Não consigo comer nem dormir', diz refém da Catedral da Sé

    (...) Depoimento a
    FELIPE SOUZA
    DE SÃO PAULO

    06/09/2015 19h30

    Na sexta-feira (4), Elenilza Mariana de Oliveira Martins, 25, foi feita refém na escadaria da Catedral da Sé, no marco zero de São Paulo. Ela era ameaçada com um revólver por Luiz Antonio da Silva, 49, quando Francisco Erasmo Rodrigues de Lima, 61, tentou desarmá-lo e foi atingido por um disparo. Neste momento, ela conseguiu escapar. Silva foi morto, em seguida, por policiais.

    Confira o relato de Elenilza à Folha neste domingo (6).

    *

    Fui para a catedral da Sé (centro) depois de visitar a minha mãe, na mesma região. De lá, eu seguiria para o Tatuapé (zona leste), onde trabalho como balconista a partir das 15h. Entrei na igreja e fiquei perto da entrada principal, antes de começar as fileiras de bancos.

    Eu estava rezando ajoelhada quando um homem que eu nunca vi na vida me abordou por trás. Ele pediu para eu sair da igreja com ele porque ali estava "moiado" [gíria para arriscado, complicado]. Eu retruquei que não sairia e passamos a discutir.

    Ele então me mostrou uma arma e me arrastou para fora da igreja. Os policiais que estavam do lado de fora perceberam a situação e pediram para o bandido soltar a arma e levantar as mãos. Como ele não obedeceu, passaram a gritar que era para ele se render imediatamente.

    O sequestrador começou a gritar que eu era refém e deu tiros contra os policiais. Mas os PMs foram sábios e não reagiram.

    Os policiais começaram a negociar e tentaram chegar mais perto, quando o homem escorregou e caímos. Eu bati o rosto no chão e machuquei minha cabeça e minhas pernas. Nesse momento, aproveitei para segurar a arma dele. Não parava de gritar: "Não atirem, por favor."

    O bandido então golpeou meu olho direito com uma chave de fenda. Não afetou minha visão, mas fez um corte e ainda está bem roxo. Eu caí e vi um senhor de azul chegando. Quando me levantei, vi o bandido atirando nele.

    Corri pelas escadarias e os policiais começaram a atirar. Achei que fosse morrer. Passou um filme na minha cabeça. Lembrei de todas as pessoas da minha família, do meu filho de oito anos. Por sorte, os policiais foram enviados por Deus, não se anteciparam e agiram na hora certa.

    Fui resgatada e liguei para o meu marido e meu filho. Falei: Filho, te amo muito!

    Meu filho ficou muito triste. Ele soube o que aconteceu depois de ver tudo pela televisão e me perguntou se eu estava bem. Eu não comentei, mas desabei no choro.

    Estou muito abalada. Além das dores, minha tia ligou dizendo que tem reportagens mentirosas na internet. Algumas dizem que eu conhecia o sequestrador, outras que ele tinha me abordado depois de eu ter sacado dinheiro num banco. Eu nunca tinha visto nem o bandido nem o senhor que me salvou na vida.

    O [Dom] Odilo falou que eu entrei na igreja com o sequestrador, mas isso não aconteceu. Eu estava sozinha.

    Não sei se era um sequestro porque eu não tinha dinheiro. O bandido só falou para eu ir com ele.

    Eu fico lembrando daquilo o tempo inteiro e me bate um desespero. Não consigo comer nem dormir.

    Queria sair de casa para falar com a família do homem que me salvou. Queria dar um abraço na família dele e agradecer demais aquele ato de heroísmo. Só que não tive a oportunidade ainda porque tem repórter acampando na frente da minha casa. Estou sendo perseguida. Meu celular tem mais de 200 ligações perdidas.

    Minha chefe pediu para eu nem ir trabalhar nos próximos dias para a imprensa não me procurar no trabalho. Cada vez que um repórter bate no meu portão para me chamar, meu coração dispara.

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