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    Após prender PM suspeito de tortura, delegado ganha até escolta de colegas

    ROGÉRIO PAGNAN
    LUCAS FERRAZ
    REYNALDO TUROLLO JR.
    DE SÃO PAULO

    23/10/2015 02h00

    Edison Temoteo/Futura Press/Folhapress
    Carro da PM, na madrugada de quarta (21), diante da delegacia onde sargento foi preso
    Carro da PM, na quarta-feira (21), diante da delegacia onde sargento foi preso por suspeita de tortura

    Desde que deixou a delegacia onde trabalha na zona leste de São Paulo escoltado por colegas, na madrugada desta quarta-feira (21), o delegado Raphael Zanon, responsável pela prisão de um sargento da PM suspeito de tortura, ganhou uma rede de proteção montada por outros integrantes da Polícia Civil.

    Ele, a namorada e a mãe passaram a contar com um apoio formal e informal que vai de escolta armada a um sistema de contrainteligência, segundo a Folha apurou.

    O temor dos policiais civis é de uma eventual represália por parte de colegas do PM preso, manifestada desde a noite da prisão, quando eles cercaram a porta do 103º distrito policial (Itaquera) e convocaram outros colegas por mensagens de WhatsApp.

    Por causa do tumulto na porta da delegacia, Zanon deixou o local escoltado por um grupo de elite da instituição.

    O delegado e sua namorada apagaram os perfis que mantinham em uma rede social por causa das inúmeras mensagens com xingamentos e ameaças, segundo disseram à reportagem alguns de seus interlocutores.

    A Folha apurou que policiais civis investigam pessoas que fizeram buscas de informações pessoais do delegado e de seus familiares em bancos de dados on-line.

    Segundo colegas de Zanon, ele também suspeita que seu telefone esteja grampeado.

    O delegado não foi localizado nesta quinta-feira (22). Em breve, ainda segundo colegas, deve ser transferido pela cúpula da Polícia Civil a outra delegacia, em uma tentativa de protegê-lo.

    Ao justificar a prisão do policial militar, Zanon disse apenas ter cumprido a lei.

    ELOGIOS

    Na madrugada de quarta (21), o sargento Charles Otaga foi à delegacia apresentar um rapaz suspeito de roubar R$ 60, com uma arma de brinquedo, em uma loja da região. O detido, Afonso de Oliveira Trudes, disse que fora torturado.

    Exame realizado no IML (Instituto Médico Legal) indicou que Trudes tinha lesões em várias partes do corpo, como costas, braços, coxas, nádega e pênis.

    Os policiais militares afirmaram ao delegado que os ferimentos haviam sido provocados pela bicicleta que o suspeito utilizou na fuga quando foi apanhado e colocado com ela na viatura. A PM também apresentou duas versões do boletim de ocorrência.

    O sargento foi preso em flagrante. Horas depois, a Justiça manteve a prisão, convertendo-a em detenção preventiva. O homem preso por roubo também segue detido.

    Enquanto a Polícia Civil defendeu Raphael Zanon, a Polícia Militar também saiu em defesa do sargento Otaga.

    Em nota, o comando da PM afirmou que o policial tem "mais de 60 elogios" de seus superiores e citou até ocorrências de que ele participou para "salvar inúmeras vidas".

    Otaga, por outro lado, é suspeito de envolvimento em pelo menos sete homicídios. A PM faz referência a esses casos na nota. "O sargento arriscou sua vida em sete confrontos armados, que resultaram em prisões e mortes de criminosos, dos quais três processos ainda estão em andamento. Não há, em sua carreira, indícios de irregularidades até o momento", diz trecho da nota.

    Além da histórica rixa entre as polícias, presente também em outros Estados, a tensão em São Paulo piorou após a chacina em Osasco e Barueri que deixou ao menos 23 mortos em agosto. PMs são os principais suspeitos.

    A Polícia Civil diz que a Corregedoria da PM atrapalhou as investigações ao fazer buscas sem aviso prévio. Já oficiais da PM se sentiram destratados por delegados.

    Também contamina o clima proposta em discussão na Câmara dos Deputados que pretende dar à PM a atribuição de investigar crimes, hoje exclusividade das polícias civis e federal. Os delegados são contra.

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