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    tragédia no rio doce

    A 400 km de barragem, Colatina (ES) mobiliza Exército em 'guerra contra lama'

    JOSÉ MARQUES
    FÁBIO BRAGA
    ENVIADOS ESPECIAIS A COLATINA (ES)

    18/11/2015 02h00

    Cerca de 130 homens do Exército, mais de 50 caminhões-pipa e helicópteros da Polícia Militar e da mineradora Samarco aguardam, no estádio municipal e em uma escola de Colatina (ES), a ordem: assim que a lama vinda de Mariana (MG) chegar à cidade, eles entram em ação.

    A mais de 400 km da barragem de rejeitos minerais de Fundão, que se rompeu no último dia 5, Colatina avalia que os resíduos transportados pelo rio Doce, responsável pelo abastecimento da região, chegarão ao município a partir desta quarta-feira (18).

    O fornecimento de água aos moradores já seria cortado a partir da 0h. A distribuição passará a ser feita em ao menos 50 tanques de 10 mil litros espalhados pelos bairros, além de seis poços artesianos que estão sendo perfurados.

    No auditório do estádio, o Corpo de Bombeiros, o Exército, a PM e a Defesa Civil discutiam nesta terça a logística da distribuição, em um quadro recheado de anotações.

    A prefeitura estuda captar água de outras fontes, como os rios Pancas e São João Grande, e as lagoas do Batista e do Limão. Também pesquisa a viabilidade de utilização de duas adutoras.

    Apesar do esquema de guerra para tentar suprir a suspensão do abastecimento público, a estimativa dos bombeiros é que a quantidade de água a ser distribuída de forma alternativa –com caminhões-pipa, por exemplo- não passará de 30% do volume habitual. Na prática, haverá racionamento.

    A cidade irá testar ainda o tanfloc, coagulante que acelera a decantação da lama e que foi empregado para tratar a água de Governador Valadares (MG), também afetada pelo "tsunami de lama".

    "Desde terça-feira (10) estou esperando a lama chegar. Quando avisarem que chegou, a gente parte", diz o motorista de caminhão-pipa Nivaldo Antônio Brida, 60.

    A maior parte do Exército estava aquartelada em salas de aula de um colégio que cedeu suas instalações. Eles embarcarão em cinco jipes, quatro caminhonetes, duas vans e uma ambulância assim que a água for cortada.

    Em alguns locais, é possível encontrar comerciantes que chegam à cidade em caminhões com galões de 20 litros de água mineral, que são vendidos por até R$ 30.

    Colatina tem cerca de 120 mil habitantes e será a primeira cidade de médio porte do Espírito Santo a receber os rejeitos de mineração.

    ESTOCANDO ÁGUA

    Até o final da tarde desta terça (17), a lama ainda estava em Baixo Guandu, na divisa com Minas. Ali, parte do município teve que ser abastecida pelo rio Guandu.

    O prefeito Duarte Júnior (PC do B) afirma que a cidade de 31 mil habitantes não corre risco de desabastecimento, mas deve economizar água "por conta da seca".

    No distrito de Mascarenhas, em Baixo Guandu, os moradores passaram a semana estocando água à espera do corte de fornecimento, que só aconteceu nesta terça, quando os rejeitos de mineração se aproximavam da usina hidrelétrica local. Vivem 600 pessoas no vilarejo.

    Além de cisternas, os moradores têm usado panelas, baldes, garrafas pet e até piscinas de plástico como reservatório. No último domingo (15), durante a distribuição de caixas d'água, policiais militares tiveram de conter pessoas que tentavam pegar mais de um recipiente.

    "Eu vivi mais de 50 anos aqui usando a água do rio Doce. Agora, ele virou um rio amargo para nós", lamentou a dona de casa Conceição Cipriano, 70, ao lado das panelas de água que encheu.

    Uma colônia de 50 pescadores locais não sabe mais como irá ganhar a vida. "Mesmo que a água fique limpa, quem é que vai querer comer os peixes daí?", questiona a pescadora Raquel Lopes, 35, apontando para o rio.

    A cerca de 20 quilômetros de Baixo Guandu, em Aimorés (MG), o fornecimento de água é feito pelo rio Manhuaçu, mas alguns moradores da zona rural utilizam a água do rio Doce e têm contado com o auxílio de amigos para conseguir se abastecer.

    "Passo o dia indo e vindo de barco para pegar galões e garrafas. Ninguém passou aqui para ajudar a gente, só passam voando de helicóptero", reclamou o vaqueiro Ilson Moisés, que afirma ter conseguido guardar um total de 4.000 litros de água.

    Colaborou THIAGO AMÂNCIO, de São Paulo

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