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    Voluntários ficam até 4 dias em mata contra fogo na Chapada Diamantina

    JOÃO PEDRO PITOMBO
    ENVIADO ESPECIAL A LENÇÓIS E PALMEIRAS (BA)

    24/11/2015 02h00

    "Para aguentar isso aqui, só com muito sangue nos olhos", diz Edcarlos Guanaes, 31, enquanto faz uma concha com as mãos e resfria o rosto com água do rio.

    Acompanhado por Pita, uma vira-lata, ele descia a serra da Matinha pelo terceiro dia seguido depois de passar horas debelando focos de incêndio na região.

    Enquanto ele descia, um grupo de oito brigadistas fazia a rota contrária para combater o fogo na serra que fica junto ao vale do Capão.

    Próxima a pontos turísticos como a Cachoeira da Fumaça, a região é uma das mais visitadas da Chapada Diamantina, que há quase um mês é atingida por incêndios que consumiram uma área equivalente a 30 mil campos de futebol.

    A nova subida da serra fora organizada horas antes por voluntários da Associação de Condutores do Vale do Capão, que reúne guias que levam turistas pelas trilhas locais.

    No sábado (21), garrafas de água doadas espalhavam-se pelo chão da sede da associação. Roupas usadas por brigadistas também foram doadas por empresas. Havia calça da Light, camisas da Queiroz Galvão e da Mataripe, além de macacões da Petrobras -roupas de tecido mais grosso, adequadas para proteger do fogo e do calor.

    Cada voluntário levava uma garrafa de água e um saco plástico com sanduíche, biscoito e barras de cereal.

    A princípio, os brigadistas subiriam até o topo do morro de carona em um helicóptero do governo estadual, mas o surgimento de uma nova linha de fogo no meio da escarpa forçou uma mudança.

    No sábado, sob o sol escaldante do meio-dia e temperatura acima de 30°C, caminhariam por uma trilha de 4 km numa subida íngreme e em terreno acidentado até os primeiros focos de incêndio.

    Fizeram a rota em uma hora, carregando mochilas com mantimentos e bolsas de água de 20 litros nas costas. Nas mãos, enxadas e abafadores para combater o fogo.

    Além dos guias, o grupo tinha um agricultor, um pedreiro e o dono de uma quitanda, todos nativos ou moradores do vale do Capão.

    "Estamos nos revezando, deixando trabalho e filhos para tentar pôr fim ao incêndio. Isso aqui é nosso maior patrimônio", diz Thairon Augusto, 32, chefe da brigada.

    A principal preocupação é que o fogo chegue às nascentes de um dos três rios que nascem na serra da Matinha.

    MORRO ABAIXO

    Na estrada estava um grupo que havia acabado de ser resgatado por um helicóptero após ter ficado entre quarta-feira (18) e sábado (21) combatendo o fogo. Foram quatro dias perto dos focos, sem banho, à base de macarrão instantâneo, pão com goiabada e suco em pó.

    Quarenta quilômetros à frente, na comunidade Campo de São João, outro grupo de voluntários descansava à beira da estrada enquanto assistia colegas subirem um paredão de pedra na Serra da Bacia, que tinha parte da vegetação em chamas.

    Na estrada, na volta a Lençóis, a vegetação no horizonte misturava tons de marrom, rosa e vermelho, num contraste que lembrava um campo florido.

    De perto, porém, era só uma gradação da ação do fogo.

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