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    Ex-diretor de manicômio conduzirá política de saúde mental no país

    CLÁUDIA COLLUCCI
    DE SÃO PAULO

    14/12/2015 19h14

    A nomeação de um ex-diretor de manicômio para a Coordenação Nacional de Saúde Mental, pelo ministro da Saúde, Marcelo Castro, provocou protestos em unidades de saúde em todo o país nesta segunda (14).

    O psiquiatra Valencius Wurch Duarte Filho foi diretor técnico da Casa de Saúde Dr. Eiras de Paracambi, o maior hospital psiquiátrico privado da América Latina, fechado em 2012 após longo processo na Justiça.

    No ano 2000, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados constatou graves violações de direitos humanos no manicômio, como prática sistemática de eletroconvulsoterapia, ausência de roupas, alimentação insuficiente e de má qualidade e número significativo de pessoas em internação de longa permanência.

    Duarte Filho também é criticado por ter se posicionado, em 1995, em entrevista ao "Jornal do Brasil", contra a atual lei da reforma psiquiátrica e o fim dos manicômios. Na época, ele disse que os fundamentos que nortearam a lei eram "de caráter ideológico e não técnico".

    Ana Carolina Fernandes-29.jun.2001/Folhapress
    Pacientes na antiga Casa de Saúde Dr. Eiras de Paracambi
    Pacientes na antiga Casa de Saúde Dr. Eiras de Paracambi

    Em nota conjunta, entidades e movimentos sociais, entre elas a Associação Brasileira de Saúde Coletiva, o Conselho Federal de Psicologia e Movimento Nacional da Luta Antimanicomial, pedem que o psiquiatra não assuma o cargo. Há também uma petição pública contrária à nomeação de Duarte Filho.

    "O anúncio contrapõe-se ao compromisso do governo federal com a continuidade da Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas, na perspectiva da garantia dos direitos humanos e do cuidado territorial e comunitário", diz a nota.

    Já a ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria) considerou "inadequada e intempestiva" a reação de protesto dos militantes do Movimento da Luta Antimanicomial contra a nomeação de Duarte Filho. Também criticou as manifestações por estar "impedindo médicos e profissionais de saúde de trabalharem nos serviços, negando atendimento aos pacientes."

    A associação diz não apoiar o modelo de assistência centrado em hospitais psiquiátricos, mas também não apoia a política atual, centrada nos CAPS (Centro de Atenção Psicossocial). " É insuficiente e, em geral, não qualificado para atender o paciente com transtorno mental grave e persistente."

    O modelo de assistência psiquiátrica que a ABP defende é o misto, com base ambulatorial (como o atual), mas com a implantação de um sistema hospitalar e extra-hospitalar "centrado na atenção básica e no atendimento ambulatorial com equipe multi e interdisciplinar e fortes vínculos com os recursos da comunidade, visando a real reinserção social e a reabilitação funcional dos pacientes com transtornos mentais".

    Para a ABP, não se pode julgar Duarte Filho sem antes ouvir o que ele tem a propor. "A situação atual é desoladora para todos nós médicos, profissionais de saúde mental, pacientes e seus familiares."

    O Ministério da Saúde diz que a nomeação foi técnica. "Entre outros cargos e funções na área de saúde mental, o dr. Valencius foi professor de psiquiatria e coordenador de internato e residência da UFF (Universidade Federal Fluminense). A indicação, portanto, é técnica", informou em nota.

    Procurado, o psiquiatra não foi encontrado para comentar sobre o assunto.

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