• Cotidiano

    Wednesday, 08-May-2024 23:01:17 -03

    EUA podem alertar grávidas contra viagens a países expostos ao zika

    DONALD G. MCNEIL JR.
    DO "NEW YORK TIMES"

    15/01/2016 14h50

    As autoridades federais de saúde dos Estados Unidos estão debatendo se devem alertar mulheres grávidas contra viagens ao Brasil e outros países latino-americanos e do Caribe nos quais mosquitos estão espalhando o vírus do zika, vinculado a danos cerebrais em bebês recém-nascidos. O alerta foi confirmado à noite.

    As autoridades dizem que essa é a primeira vez que os Centros para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) aconselhem mulheres grávidas a evitar uma região específica durante um surto.

    Alguns especialistas em doenças infecciosas afirmam que o alerta é justificado, ainda que possa ter um efeito devastador sobre as viagens e o turismo. Um porta-voz do CDC disse que a agência antecipava fazer um anúncio final desta quinta ou nesta sexta (15). "Não podemos tomar esse tipo de decisão no vácuo", disse Thomas Skinner, o porta-voz. "Estamos consultando especialistas externos".

    O vírus apareceu inicialmente na América do Sul em maio. Ainda que frequentemente cause apenas lesões superficiais na pele e febres, as mulheres portadoras, especialmente no primeiro trimestre de uma gravidez, mostram propensão maior a ter bebês com cabeças pequenas e cérebros danificados, condição conhecida como microcefalia.

    O Dr. Lyle Petersen, diretor de doenças transmitidas por vetores no CDC, disse na quarta-feira que a agência havia identificado o vírus do zika em tecidos de quatro bebês brasileiros, dois dos quais microcefálicos e mortos pouco depois do parto e dois dos quais morreram ainda no útero.

    A microcefalia tem diversas outras causas, entre as quais defeitos genéticos, rubéola ou a presença de citomegalovírus na mãe durante a gestação. Amostras extraídas dos fetos "pareciam indicar que uma infecção era a causa", disse o Dr. Petersen.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Cientistas brasileiros haviam anteriormente encontrado o vírus em tecidos e fluido amniótico de três fetos com má formação. "Isso certamente oferece provas muito mais fortes da conexão", disse o Dr. Petersen.

    Ainda que o alerta sobre viagens deva se aplicar mais evidentemente ao Brasil, que vem lutando com uma disparada alarmante no número de bebês nascidos com microcefalia, o mesmo pode se aplicar em breve a boa parte da América Latina tropical e ao Caribe.

    Foi identificada transmissão local do vírus do zika em 14 países e territórios do Hemisfério Ocidental: Brasil, Colômbia, El Salvador, Guatemala, Guiana Francesa, Haiti, Honduras, Martinica, México, Panamá, Porto Rico, Paraguai. Suriname e Venezuela.

    Alguns poucos casos isolados foram identificados nos Estados Unidos, entre os quais um no Texas na semana passada. No entanto, todos envolviam pessoas que acabavam de voltar de viagens ao exterior. Não foi identificada qualquer transmissão entre os 50 Estados norte-americanos. Apenas um caso foi confirmado em Porto Rico, mas porque os testes acontecem raramente e muitos casos envolvem sintomas amenos ou imperceptíveis, os médicos presumem que haja muito mais contaminações.

    Alguns virologistas norte-americanos já estão alertando mulheres grávidas ou que estejam tentando ter filhos a que evitem essas regiões. "Se minha filha estivesse planejando engravidar, eu a aconselharia a não viajar ao Caribe", disse o Dr. Peter Hotez, diretor da Escola Nacional de Medicina Tropical, no Baylor College of Medicine.

    "Isso vai dizimar o turismo no Caribe", ele acrescentou. "Mas não podemos esperar até daqui a nove meses, quando defeitos congênitos começarem a aparecer nas salas de parto".

    Assessores de imprensa de três operadoras de navios de cruzeiro –Royal Caribbean, Carnival e Princess– afirmaram esta semana que jamais haviam ouvido falar do vírus do zika e encaminharam o repórter à sua associação setorial, a Associação Internacional das Linhas de Cruzeiro.

    Elinore Boeke, a porta-voz da associação, disse que os viajantes deveriam verificar com as autoridades de saúde pública os destinos que pretendam visitar, e mencionou as atuais orientações de viagem do CDC, que sugerem apenas que visitantes evitem picadas de mosquito por meio do uso de repelente e roupas longas.

    Os navios de cruzeiro publicam boletins diários de saúde e segurança e instruem os passageiros sobre como evitar picadas, acrescentou Boeke.

    Os relatórios sobre a disparada na incidência de microcefalia já enervaram alguns viajantes. Na terça-feira, Ashley D'Amato Staller, 33, advogada em Haddonfield, Nova Jersey, que está grávida de seu quarto filho, abandonou seus planos para uma viagem a Porto Rico com 17 pessoas de sua família, depois de ler artigos sobre chegada do zika ao território.

    "Parte de mim sente que é preciso viver a vida, e assim que devo ir", ela disse. "Eu poderia abandonar a viagem e ainda assim terminar atropelada ou pegar a febre do oeste do Nilo, ou alguém poderia espirrar em cima de mim. Por outro lado, estamos falando do meu bebê, e nada é mais importante".

    As autoridades brasileiras anunciaram na terça-feira que estão avaliando mais de 3,5 mil casos de microcefalia em recém-nascidos. Até o ano passado, o país normalmente registrava cerca de 150 casos de microcefalia por ano.

    Não existe vacina para o zika, mas o Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos vem trabalhando em uma já há um mês, disse o Dr. Anthony Fauci, diretor do instituto.

    O Dr. Stanley Plotkin, um renomado inventor de vacinas, disse que uma vacina para o zika "não deve ser extremamente difícil de desenvolver", porque a doença é estreitamente associada à febre amarela e à encefalite japonesa, para as quais existem vacinas efetivas.

    Epidemiologistas estimaram que mais de 1,5 milhão de brasileiros estão infectados. O alarme quanto à microcefalia foi disparado em outubro, quando médicos no Estado de Pernambuco, nordeste do Brasil, perceberam um número incomum de bebês com cabeças pequenas.

    Ainda que o Brasil tenha aconselhado fortemente as mulheres grávidas a evitar picadas de mosquitos, um importante funcionário do setor de saúde foi além, duas semanas atrás, sugerindo que mulheres no Nordeste, a região mais atingida, postergassem seus planos de ter filhos.

    "Se ela puder esperar, deve esperar", disse Cláudio Maierovitch, diretor do departamento de vigilância de doenças transmissíveis no Ministério da Saúde brasileiro.

    Na terça-feira, o ministro da Saúde da República Dominicana teria supostamente aconselhado as mulheres do país a não ter filhos por enquanto. Mais tarde, outro funcionário do ministério esclareceu: se for detectada transmissão local do zika no país, o ministério dará esse conselho.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024