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    Vaquejadas são alvo de defensores de animais; caso vai parar no Supremo

    MARCELO TOLEDO
    DE RIBEIRÃO PRETO

    05/02/2016 02h00 - Atualizado às 10h30

    Uma dupla a cavalo persegue um boi que, antes enclausurado, dispara pela pista. Sob gritos da plateia, os vaqueiros emparelham o animal, depois o agarram pela cauda e o puxam com força: o objetivo é derrubá-lo antes da linha de chegada.

    Nascida no sertão como lembrança da lida do vaqueiro no campo, as vaquejadas viraram alvo de ações por todo o país e o caso foi parar no Supremo Tribunal Federal.

    São cerca de 4.000 provas por ano só no Nordeste, diz a Abvaq (Associação Brasileira de Vaquejadas). Só Pernambuco e Ceará têm mais de 700 provas cada um, com prêmios de até R$ 300 mil.

    Junot Lacet Filho - 3.mai.2015/Jornal da Paraíba
    Vaquejada no Parque Haras Ivandro Cunha Lima/Junot Lacet Filho_Jornal da Paraíba *** PARCEIRO FOLHAPRESS - FOTO COM CUSTO EXTRA E CRÉDITOS OBRIGATÓRIOS ***
    Vaquejada no Parque Haras Ivandro Cunha Lima, em Campina Grande, Paraíba

    Para as entidades, os animais são agredidos antes das provas, atirados de forma brusca no chão e podem sofrer estresse, hemorragia, fratura e até serem sacrificados.

    "A crueldade é inerente, o boi não corre à toa. Corre por ser perseguido, ter medo e tentar escapar da dor de ser derrubado", disse a presidente da Uipa (União Internacional Protetora dos Animais), Vanice Orlandi.
    O empresário do setor de nutrição animal Marcos Lima, 37, vice da Abvaq, reage: "A vaquejada recebe críticas sem muito fundamento".

    Segundo ele, as provas já são monitoradas por juízes de bem-estar, normalmente veterinários, que vistoriam currais e animais do evento.

    O acirramento das tensões entre organizadores e entidades de proteção animal ocorre desde 2015, com ações que vetaram provas, exigiram acordos de proteção, instituíram fundo de defesa dos bichos e forçaram fiscalização sanitária nas provas.

    No Nordeste, a polêmica existe no Piauí, na Bahia, em Pernambuco, em Sergipe e na Paraíba, onde um cavalo morreu em julho ao encostar numa cerca energizada. Em Alagoas, um vaqueiro morreu em abril, ao cair do cavalo.

    Em Estados como Bahia e Sergipe, elas viraram lei. No caso baiano, foi instituída uma doação de 2% da premiação dos eventos para fundos beneficentes de animais. Já em Sergipe, a lei obriga os eventos a fazerem a fiscalização sanitária dos bichos.

    CRÍTICAS

    Atitudes assim não isentam a vaquejada dos danos, diz Jane Haddad, da Apipa (associação piauiense de proteção). "Já vi boi espetado antes de prova e perder a cauda no puxão do vaqueiro. Poderia ter um cauda postiça. Amenizaria." No Estado, a vaquejada é, desde 2012, atividade esportiva e cultural.

    Há ações na Justiça em outras regiões. No Distrito Federal, elas foram vetadas, mas a decisão caiu, e a vaquejada foi declarada um esporte.

    Os casos mais recentes de ações judiciais ocorreram em Petrolândia (PE), que assinou acordo para vetar maus-tratos, e Barretos (SP), sede do principal rodeio do país -mas que nunca fez vaquejada. Os rodeios são alvo de críticas semelhantes das ONGs.

    Pesquisador de culturas populares do Instituto de Artes da Unesp, Alberto Ikeda disse que é preciso reflexão para evitar maus-tratos.

    "Enfrentar um animal para mostrar bravura é um acirramento da selvageria típica do homem. Indígenas também matam animais, mas só para sobrevivência."

    DIVISÃO DE MINISTROS DO STF

    As vaquejadas no Ceará foram parar no Supremo Tribunal Federal após o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, entrar com ação de inconstitucionalidade contra lei estadual de 2013 que trata a modalidade como prática cultural e esportiva.

    Janot diz que a vaquejada é explorada financeiramente como esporte e que laudos atestam danos aos animais.

    O STF se dividiu nos votos iniciais entre a preservação de direitos culturais e a proteção ao meio ambiente. O artigo 215 da Constituição garante o exercício de direitos culturais, enquanto o 225 prega proteção ao ambiente.

    O procurador-geral sustenta que o conflito de normas constitucionais se resolve em favor do meio ambiente.

    Para o relator da ação, ministro Marco Aurélio Mello, que concorda com Janot, há crueldade nas provas. Já Edson Fachin foi favorável à lei e argumentou que o próprio Ministério Público Federal reconhece a prática como manifestação cultural.

    A votação foi suspensa quando Luís Roberto Barroso pediu vistas, e não há prazo para voltar à pauta.

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