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    Jovens trocam universidade por sonho de vencer um torneio de peão

    MARCELO TOLEDO
    ENVIADO ESPECIAL A PIRACICABA

    13/02/2016 02h00

    Eles poderiam estar estudando para o vestibular, cursando faculdade ou mesmo trabalhando, como muitos jovens. Mas não querem saber de profissões tradicionais e apostam numa atividade que pode render até R$ 1 milhão em um fim de semana.

    Para isso, porém, precisam aprender, em séries repetidas à exaustão, a pular para a frente, ter postura em pé, contrair o abdome e manter o braço em equilíbrio com o corpo. Tudo isso antes de exercer a profissão propriamente dita.

    Filhos de empresários, comerciantes, marceneiros e estudantes, 34 jovens de São Paulo, Goiás e do Distrito Federal com idade entre 14 e 25 anos estão em Piracicaba para um curso de montaria de rodeio ministrado pelo tricampeão mundial Adriano Moraes, 45.

    Acampados na fazenda Três Corações, eles têm aulas intensivas no chão antes de encarar os temidos touros, que pesam até uma tonelada. Pelo curso de três dias, pagam R$ 550, sem moleza.

    "Carpir café é muito mais difícil do que isso", disse Moraes a um aluno que reclamou de cansaço.

    As atividades incluem ainda dicas para se fixar no lombo dos touros nas montarias, evitar fratura na clavícula ao levar uma rabada do animal e reagir conforme o boi pula.

    A orientação é diferente se ele pula para um lado ou quebra a paleta –no jargão, quando o animal muda de repente o sentido do pulo. Serão realizadas dez edições do curso até março.

    VOCAÇÃO

    "Não gosto de estudar e não me vejo fazendo faculdade. Sempre gostei do mundo rural. Quero ser peão, nasci para isso", disse Matheus Moraes, 15, filho de um empresário de Piracicaba.

    A opinião é compartilhada pelo marceneiro Maicon Duarte, 25, que pratica musculação e kung fu para se fortalecer para os rodeios. "Tudo o que eu faço é pensando nisso."

    Pai de Vinicius, 14, caçula do grupo, o empresário Leonardo Peressinotti, de Paulínia, disse que vive o dilema de deixar o filho montar ou se dedicar mais aos estudos.

    "Ele fez quatro rodeios por mês em 2015 e quase perdeu o ano na escola. A gente fala que a carreira não é para sempre, mas ele sonha em competir nos EUA."

    Destinado principalmente a futuros peões, o curso de um final de semana abriga também competidores nos anos iniciais de carreira, como Tiago Mariano, 25, que monta há três anos.

    "Desde pequeno sabia que isso [montar] seria minha profissão. Nunca quis morar em cidade grande ou estudar, não tinha o sonho de ser formado em nada. Se alguém pagar faculdade pra mim, eu dispenso", disse ele, responsável pelo trato de animais e plantas num sítio no interior e numa fazenda em Goiás.

    Alguns rodeios no país oferecem prêmios superiores a R$ 100 mil, como Barretos e a final da PBR (Professional Bull Riders). Mas, assim como no futebol, há um êxodo de peões –rumo aos EUA. Lá, o vencedor do circuito chega a ganhar US$ 1 milhão (cerca de R$ 4 milhões), fora a premiação de cada etapa.

    A última delas, em Las Vegas, vale US$ 250 mil (R$ 1 milhão) ao campeão.

    Vencedor da PBR em 1994, 2001 e 2006, Moraes amealhou US$ 3,2 milhões (R$ 12 milhões) em prêmios nos últimos dez anos de carreira –encerrada em 2008.

    "Mas poucos chegam lá. Quando comecei, meu primeiro título valeu um jogo de panelas. Só depois os prêmios melhoraram", disse.

    Prevenido, o goiano Luciano Souza, 25, disse que prestará vestibular para agronomia. "Quero as arenas, insistirei nisso, mas nunca se sabe como será o futuro."

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