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    tragédia no rio doce

    Obras em barragem da Samarco foram iniciadas antes de licença sair

    ESTÊVÃO BERTONI
    DE SÃO PAULO

    01/03/2016 17h00

    Engenheiros da Integral, empresa contratada pela Samarco para fazer obras em Mariana (MG), informaram ao conselho de engenharia do Estado terem iniciado serviços ligados ao alteamento (elevação) da barragem de Fundão até 940 m acima do nível do mar um mês antes de a licença ambiental sair.

    A rapidez na elevação da parede da estrutura é tida pela Polícia Civil como uma das causas da tragédia de novembro que deixou 19 mortos.

    As informações sobre o início das obras constam das ARTs (Anotações de Responsabilidade Técnica) que os profissionais são obrigados a preencher e entregar ao órgão. Elas registram o período de realização, o valor do serviço e a data do contrato.

    Os engenheiros civis Benedito Ribeiro, Sérgio Ribeiro e Jacques Rodrigues declararam que a execução de "serviços de terraplanagem e obras civis do alteamento das barragens de Germano e Fundão" até 940 metros começaram em 28 de maio de 2015.

    As licenças prévia e de instalação dos alteamentos até 940 m, porém, só foram concedidas pelo Copam (Conselho de Política Ambiental), formado por governo e sociedade civil, em 30 de junho. A decisão foi publicada no "Diário Oficial" de 4 de julho.

    A Integral diz ter iniciado em maio "obras preparatórias para o alteamento" e a "construção de canteiros de obras". A Samarco afirma que essas obras tinham licença.

    Segundo a Secretaria do Meio Ambiente de Minas, "nenhum empreendimento pode ter início sem as devidas licenças ambientais". Nem canteiros de obras poderiam ser feitos sem autorização, de acordo com o órgão, que afirma apurar as irregularidades na barragem.

    Obras nas barragens

    Uma quarta ART de outro engenheiro da Integral, Lucas Lauro, também informa o início em maio de "serviços de normas e regulamentação de segurança e saúde no trabalho" no projeto de 940 m.

    O valor do contrato, assinado em 11 de junho entre as duas empresas, segundo as ARTs foi declarado em R$ 98 milhões. Segundo a Integral, a data da assinatura está incorreta nas anotações: o documento foi firmado em 18 de junho, 12 dias antes de a licença sair, e era retroativo a maio. O fato de o contrato ter sido feito depois do início das obras foi um "trâmite interno", segundo a empresa.

    No dia da tragédia, a Integral tinha na unidade da Samarco 295 funcionários, 40 deles em Fundão –sete morreram. As obras deveriam terminar em outubro deste ano.

    A Samarco também contratou antes das licenças outros projetos relacionados ao alteamento até a cota de 940 m.

    As ARTs mostram que a empresa Progen iniciou em maio um projeto de "canteiro principal". A empresa MDGeo começou em abril um "estudo hidrogeológico de simulação de fluxo subterrâneo" no cenário de 940 m.

    As duas dizem que os serviços se tratavam apenas de projetos e não sabem se eles foram ou não implantados.

    Fundão se rompeu na altura 898 m. Ela seria elevada até 940 m para comportar rejeitos dentro do projeto de expansão da Samarco.

    Segundo a ambientalista Simone Bottrel, que integra o Copam, as mineradoras têm o costume de iniciar obras sem licenças. "Aqui em Minas é desse jeito. As licenças vêm depois –e quando vêm. A gente fica estarrecido", diz.

    Ela afirma que, como o conselho não tem obrigação de fazer vistorias, depende das informações passadas pelas próprias empresas, e os dados muitas vezes são irreais.

    Avener Prado/Folhapress
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    OUTRO LADO

    A empresa Integral Engenharia afirma, em nota, que iniciou em maio "obras preparatórias" para os alteamentos até 940 m e diz que, para essas obras, a Samarco já possuía licenças ambientais.

    Segundo a empresa, as atividades tinham duas fases.

    A primeira previa obras periféricas em bueiros, drenos, acessos e obras de alteamento em uma baia. A fase dois, de construção de um tapete drenante, que estava sendo feita no momento da tragédia, só foi iniciada, segundo a Integral, depois da licença.

    A Samarco, que pertence à Vale e à BHP, diz que parte das obras da Integral iniciadas em maio tinha licença.

    "Por se tratarem de obras de longo prazo e que exigem um planejamento cuidadoso, é necessário um tempo para mobilizar mão de obra, treinar os novos funcionários, montar estruturas auxiliares como canteiro, escritório e vestiários", diz a empresa.

    A Secretaria de Meio Ambiente de Minas afirma que nenhum empreendimento pode começar sem licença. Sem o documento, nem os canteiros podem ser feitos.

    Inicialmente, a assessoria da Samarco disse à Folha que a Integral começara a construção dos canteiros em maio, mas mudou a versão para 5 de julho (dia seguinte à publicação da licença no "Diário Oficial") quando a reportagem a confrontou com a afirmação da secretaria.

    As obras que viabilizariam os alteamentos em Fundão, de acordo com a Samarco, só começaram em setembro.

    A licença, concedida em 30 de junho, detalha obras periféricas e preparatórias para viabilizar os alteamentos. Elas só poderiam começar após a autorização ser dada.

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