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    'Esgotado', medicamento Tamiflu tem eficácia contra gripe posta em xeque

    CLÁUDIA COLLUCCI
    JULIANA CUNHA
    DE SÃO PAULO

    01/04/2016 02h00

    Na corrida pela vacina contra a gripe H1N1 e pelo atendimento nos prontos-socorros, os paulistanos têm enfrentado um terceiro obstáculo: a falta do medicamento oseltamivir (Tamiflu) nas farmácias da capital paulista. Das seis farmácias da av. Angélica, em Higienópolis, somente duas tinham estoque nesta quinta (31). Na av. Paulista, de sete farmácias visitadas, ele não foi encontrado em nenhuma. O preço da caixa varia de R$ 117 a R$ 200.

    "Se tivesse o dobro, teríamos vendido, mas o estoque acabou na semana passada e até nosso fornecedor está esgotado", diz a farmacêutica Daniela Cacuta, da drogaria São Paulo, na av. Angélica. Essa busca frenética, porém, não é respaldada pelos médicos. Estudos independentes (sem patrocínio da fabricante Roche) têm apontado limitações na sua eficácia.

    A polêmica se arrasta desde 2009, quando dezenas de países começaram a estocar o remédio para o caso de uma pandemia de gripe H1N1. Em 2014, revisão de estudos da Cochrane (rede de cientistas independentes que investigam a efetividade de medicamentos) apontou que o Tamiflu não é mais eficiente do que um analgésico comum (paracetamol) para casos de influenza em geral.

    Segundo a Cochrane, o remédio não evita a disseminação da gripe influenza e diminui a persistência dos sintomas em apenas um dia, em média –de 7 dias para 6,3 dias em adultos e para 5,8 dias em crianças. Em 2014, estudo publicado na revista britânica "Lancet" mostrou que, nos casos de gripe H1N1, ele reduz o risco de morte em 19% quando ministrado em até dois dias após o início dos sintomas. "Para o influenza comum, não justifica o uso. Nos casos de H1N1, ele pode ser útil em casos bem selecionados [pacientes de risco]", diz o médico Álvaro Attalah, do Centro Cochrane Brasil.

    Gripe H1N1

    Segundo os estudos, os efeitos colaterais mais frequentes são náuseas e vômitos, além de distúrbios psiquiátricos (que não são especificados). Para o infectologista Esper Kallás, professor da USP, o Tamiflu é um remédio ruim. "A eficácia é limitada, e o impacto na epidemia de H1N1 é questionável", afirma.

    A melhor indicação do remédio, diz ele, é na prevenção de casos de gripe em pessoas sob risco de doença grave após a exposição ao vírus. "Por exemplo, uma senhora recebeu um transplante de medula e o marido chega em casa com H1N1. Daí, damos oseltamivir para ela antes mesmo que desenvolva a doença."

    O infectologista Artur Timerman, do Hospital Edmundo Vasconcellos, afirma que a corrida indiscriminada às farmácias não se justifica. "Ele só é válido para pacientes de risco ou se os sintomas de gripe [febre, prostração e falta de ar] forem significantes. E isso nas primeiras 48 horas após os sintomas."

    OUTRO LADO

    Em nota, a Roche informou que, desde a segunda quinzena de março, observa aumento excepcional e não previsto para esta época do ano na demanda por Tamiflu. "Os estoques relativos à apresentação de 75 mg esgotaram-se rapidamente." Segundo a Roche, novos lotes de Tamiflu chegarão em abril.

    Sobre os estudos que questionam a eficácia do remédio, a fabricante argumenta que diversos testes clínicos realizados com Tamiflu atestam a eficácia do medicamento na redução da gravidade e duração dos sintomas em pacientes com gripe, sendo seguro, bem tolerado e reduzindo o risco de mortalidade.

    A farmacêutica afirma que o remédio tem efeito antiviral e age dentro do organismo para interromper a replicação do vírus influenza A. "A Roche reitera todos os dados que constam na bula do produto aprovado no Brasil pela Anvisa." A empresa diz reforçar a qualidade de evidências clínicas do Tamiflu.

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