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    Professor da USP é investigado por uso de equipamento até em quadro de TV

    CHICO FELITTI
    COLUNISTA DA FOLHA

    10/04/2016 02h00

    A imagem de Ronaldo Nazário, de sunga e touca, tentando perder uns quilinhos adquiridos após sua aposentadoria dos gramados virou evidência em um inquérito civil que o Ministério Público de São Paulo instaurou para investigar um professor com mais de duas décadas de USP.

    As cenas, televisionadas pelo "Fantástico" em 2012, faziam parte do quadro "Medida Certa", em que o ex-jogador era auxiliado por uma equipe na busca por um corpo mais saudável.

    Um dos profissionais que apareceu no primeiro episódio foi o nutricionista Antonio Lancha Jr., que usou em seu consultório uma máquina chamada Bod Pod para medir, com rajadas de vento, o nível de gordura de Ronaldo.

    Reprodução/TV Globo
    Reprodução do quadro do Fantástico, "Medida Certa", com o ex-jogador Ronaldo Nazário
    Reprodução do quadro do Fantástico, "Medida Certa", com o ex-jogador Ronaldo Nazário

    PESQUISA

    O equipamento de ponta custa US$ 50 mil (cerca de R$ 180 mil) e fora comprado para uma pesquisa científica da USP sobre mulheres e lipoaspiração financiada pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa de SP).

    Segundo o contrato de bolsa científica, que era orientada por Lancha Jr., a máquina podia ficar no Instituto Vita, em Higienópolis. É onde o nutricionista atende pacientes particulares, mas só poderia ser usada gratuitamente em mulheres de 20 a 35 anos que tivessem sobrepeso —o grupo analisado.

    O nutricionista nega que tenha usado equipamentos públicos em suas consultas. Um dos profissionais mais conhecidos do mercado de nutrição e suplementação no país, Lancha Jr. escreveu cinco livros, dá entrevistas na TV e tem clientes famosos.

    Uma consulta com ele custa R$ 850. É também professor titular da Escola de Educação Física e Esporte da USP.

    OUTRO LADO

    Em um primeiro contato da reportagem, Lancha Jr. negou ter usado equipamentos financiados com recursos públicos em consultas particulares. "Havia um acordo com a Fapesp e o Instituto Vita, de conduzir lá as pesquisas."

    O Instituto Vita, onde foram feitos os testes em Ronaldo e em dezenas de outros clientes, segundo inquérito ao qual a Folha teve acesso, afirma que "está tomando conhecimento de uma série de informações e está colaborando com o Ministério Público no inquérito civil".

    Divulgacao/USP
    O nutricionista Antonio Lancha Jr.
    O nutricionista Antonio Lancha Jr.

    A USP também afirma colaborar com a investigação. A TV Globo informou que não pagou pela consultoria do nutricionista e que desconhecia a natureza pública do equipamento.

    Procurada, a Fapesp afirma que o bem "foi devidamente doado à USP quando do encerramento do projeto de pesquisa, conforme determinam as normas".

    A máquina foi devolvida à universidade, mas apenas em 2016, segundo o inquérito. Quatro anos após o fim da pesquisa —e de ter ficado famosa na televisão.

    Questionado posteriormente pela reportagem, que questionou onde esteve o Bod Pod e para que ele foi usado nesse período de quatro anos, Lancha Jr. não respondeu a e-mails e ligações.

    Após o inquérito ter virado assunto nos corredores da USP, surgiu outro imbróglio envolvendo o mesmo professor.

    *

    DOCENTE TERIA LIMITADO ACESSO A LABORATÓRIO

    Em uma noite de fevereiro, a porta de segurança do Laboratório de Nutrição e Metabolismo da Atividade Motora —coordenado por Lancha Jr.— passou a recusar impressões digitais de alunos e professores que até então podiam usar o local para suas pesquisas.

    Fontes da USP dizem que a medida partiu de Lancha Jr., por desconfiar que a denúncia ao Ministério Público tenha partido de dentro da faculdade.

    A USP não responde qual foi a razão das mudanças e afirma que não houve queixa formal. Alunos mostraram à reportagem e-mails enviados à direção, com queixas sobre a situação.

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