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    Entrada da PM no Paula Souza foi imprudente, dizem especialistas

    GUILHERME BRENDLER
    DE SÃO PAULO

    03/05/2016 02h00

    Zanone Fraissat/Folhapress
    Estudantes permanecem ocupando o prédio do Centro Paula Souza, na região central de São Paulo
    Estudantes permanecem ocupando o prédio do Centro Paula Souza, na região central de São Paulo

    A entrada da Força Tática da Polícia Militar sem autorização da Justiça no Centro Paula Souza nesta segunda-feira (2), ocupado por estudantes desde a semana passada, foi, no mínimo, imprudente, segundo especialistas ouvidos pela Folha.

    A ação policial foi ilegal, segundo o Tribunal de Justiça. De acordo com o juiz Luis Manuel Pires, a entrada da Força Tática ocorreu sem mandado judicial. No local, funciona a coordenação das escolas técnicas de São Paulo. A PM deixou o Centro Paula Souza na noite desta segunda.

    Para o constitucionalista José Afonso da Silva, ex-secretário de Segurança Pública do Estado (governo Mário Covas), se a reintegração de posse tivesse ocorrido de fato, a medida da Secretaria da Segurança Pública deveria ter sido amparada integralmente por autorização judicial.

    "Houve uma facilitação para que os funcionários entrassem no prédio. Não tendo havido confronto, o problema fica menos grave", afirmou. "Para permitir que os funcionários entrassem [no prédio], o certo seria ter buscado uma decisão judicial. Isso seria o correto, evitaria qualquer problema."

    "Quando a Justiça autoriza a reintegração, ela controla a execução e evita que haja algum arbítrio. Neste caso, não houve confronto, não houve coisa mais séria. O que cabe agora é uma ação disciplinar, se a decisão partiu da PM", conclui José Afonso da Silva.

    O professor da Faculdade de Direito da USP Conrado Hübner Mendes diz que a Polícia Militar de São Paulo, há alguns anos, vem testando os limites da legalidade. "O fato de o prédio estar ocupado [por estudantes] muda o regime jurídico da situação. Ingressar no local foi, no mínimo, imprudente por parte da PM", disse Hübner.

    "O Tribunal de Justiça, finalmente, tem imposto alguns limites à arbitrariedade policial, no caso das ocupações de estudantes. Nas ruas, no entanto, o Judiciário como um todo tem deixado a desejar."

    INTIMIDAÇÃO

    Para Frederico de Almeida, professor de ciência política da Unicamp e estudioso do tema, "a ação da PM foi claramente intimidatória. Não havia motivo para ingressar no prédio. Não houve, inclusive, qualquer abertura para o diálogo. A polícia agiu friamente, como tem que agir sempre, mas não houve chance de diálogo", diz.

    Almeida, que esteve no Centro Paula Souza desde o começo da tarde desta segunda, diz que a situação era muito tensa e desgastante. "Fiquei lá das 13h até o começo da noite. Eram os mesmos policiais que estavam de pé, parados. Foi uma situação muito desgastante para todos, inclusive para os PMs."

    O sociólogo Renato Sérgio de Lima, professor da FGV-SP e vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, afirma que a polícia tem seus argumentos ao dizer que entrou para garantir o ingresso dos funcionários.

    "Mas não foi uma decisão tomada na hora, foi uma decisão do comando da polícia ou da Secretaria da Segurança Pública, pois a Força Tática estava lá. Na segurança pública, a sociedade delega à polícia uma excessiva autonomia para tomar decisões táticas e, muitas vezes, ela adota atitudes políticas e estratégicas", afirmou.

    Para Lima, "isso não é saudável". "Além de agravar os conflitos, fragiliza as instituições. Precisamos saber qual foi, exatamente, a cadeia de comando. Se a secretaria contrariou uma decisão da Justiça, o governo precisa ser cobrado por isso. Qual linha de comando será responsabilizada?", questionou.

    Em nota, o governo Alckmin afirmou que em nenhum momento, "se adiantou na execução da reintegração de posse" e reiterou a posição da PM, de que os policiais, "unicamente, garantiram acesso ao prédio aos funcionários do Centro Paula Souza. Tanto é verdade que os estudantes continuam a ocupação".

    A nota do governo do Estado informa ainda que o secretário Alexandre de Moraes solicitou a audiência conciliatória –em que deverá ser decidida a expedição do mandado de reintegração de posse para esta terça-feira (3).

    OCUPAÇÃO - Estudantes fazem protesto no Centro Paula Souza

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