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    Falhas em tornozeleiras permitem que presos cometam novos crimes

    JULIANA COISSI
    DE CURITIBA

    09/05/2016 02h00

    Em agosto do ano passado, um juiz federal de Mato Grosso se surpreendeu ao ser rendido dentro de casa, em Cuiabá, por dois assaltantes —um deles usava uma tornozeleira eletrônica, aparelho cuja função é garantir que alguns dos egressos da prisão não cometam mais crimes. Acabaram detidos no mesmo dia.

    Poucos dias antes, um homem —também monitorado pelo equipamento— foi preso assaltando um ônibus em Serra (ES). No Paraná, a polícia fez uma operação há duas semanas para prender foragidos que violaram a regra.

    O equipamento, usado por presos da Operação Lava Jato, apresenta falhas e abre brecha para que detentos voltem a cometer crimes.

    Há no país 18.172 pessoas monitoradas por tornozeleira eletrônica, entre condenados que cumpriram parte da pena em regime fechado e aqueles que aguardam julgamento.

    Os monitorados por tornozeleira representam uma faixa ainda pouco expressiva, equivalente a 3%, dos 622 mil detentos no país, segundo o Depen (Departamento Penitenciário Nacional), vinculado ao Ministério da Justiça.

    O órgão estima que poderia ampliar o benefício para mais 25 mil detentos.

    Não há uma estimativa nacional de quantos monitorados violam de propósito o aparelho. "Mas tenho a sensação que são pontuais, residuais os casos, porque a pessoa prefere estar monitorada assim do que presa", disse o diretor do Depen, Renato de Vitto.

    No caso da Lava Jato, não há nenhum monitorado que tenha descumprido regras intencionalmente —mas houve falhas pontuais, como saídas do perímetro sem querer ou baterias descarregadas.

    Em alguns Estados, chega a 25% o descumprimento —caso do Espírito Santo, que implantou as tornozeleiras há apenas um ano e meio. Hoje são 182 beneficiados.

    Em Mato Grosso, a estimativa é que 20% dos 2.340 beneficiados burlem o aparelho.

    Segundo o secretário de Justiça e Direitos Humanos do Estado, Márcio Frederico de Oliveira Dorilêo, pelo uso da tornozeleira ser ainda recente —desde 2014 no Estado—, até mesmo os ex-presos custam a crer na sua eficácia.

    "Alguns desses que prendemos por burlar a tornozeleira diziam que não acreditavam que funcionasse. Outros admitiram que queriam arriscar mesmo assim."

    No Paraná, que tem 2.570 presos monitorados, a Operação GPS, em abril, prendeu 34 pessoa, algumas deles foragidas havia mais de uma semana. A taxa de fraudes do acessório no Estado é de 3%.

    São Paulo, com 233 mil presos, está desde março sem nenhum preso com tornozeleira —o contrato previa 4.800 aparelhos, mas o convênio com o consórcio que fornece os acessórios expirou sem poder ser renovado.

    Em nota, o governo disse que a nova licitação sofreu representação junto ao Tribunal de Contas do Estado e precisou ser cancelada, mas que um edital será publicado até o fim do mês.

    MAIS BARATO
    Monitorar presos eletronicamente é uma modalidade relativamente nova no Brasil. São Paulo foi o primeiro Estado a adotar a tornozeleira, em 2010. Atualmente, 17 Estados oferecem a medida.

    Além de uma pena alternativa ao regime fechado, a tornozeleira passou, na prática, a ser considerada como opção econômica para governos estaduais diante de cadeias lotadas.

    Em média, um preso brasileiro custa de R$ 1.400 a R$ 4.000 por mês se estiver em um presídio. Com a tornozeleira, o custo de aluguel do aparelho e do serviço de monitoramento varia de R$ 300 a R$ 350 mensais por pessoa.

    A decisão de usar o aparelho cabe ao juiz. O governo estadual contrata empresas de monitoramento. Se há algum sinal de irregularidade —retirada da peça, bateria descarregada ou saída do perímetro autorizado—, a tornozeleira apita e a central de monitoramento é avisada.

    Ela contata o monitorado para alertá-lo do problema. Se não o encontrar ou suspeitar que foi intencional, o governo avisa o juiz, que ouve advogado e Promotoria antes de decidir ou não por expedir um mandado de prisão.

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