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    Rio de Janeiro

    Atrasado, Temer repudia estupro e cria ala da PF de crimes contra mulher

    DE BRASÍLIA

    27/05/2016 11h37 - Atualizado às 20h08

    No dia seguinte à repercussão negativa por não ter se pronunciado prontamente sobre o estupro coletivo de uma jovem de 16 anos no Rio de Janeiro , o presidente interino, Michel Temer (PMDB), divulgou nota nesta sexta-feira (27) repudiando o ocorrido.

    O peemedebista classificou como um "absurdo que em pleno século 21 tenhamos que conviver com crimes bárbaros como esse" e anunciou que o ministro Alexandre de Moraes (Justiça) convocou uma reunião na terça-feira (31) com secretários de segurança pública do país para tomar "medidas efetivas para combater a violência contra a mulher."

    Gabriel de Paiva - 26.mai.2016/Agência O Globo
    Adolescente, vítima de estupro coletivo, deixa hospital ao lado da mãe, no Rio
    Adolescente, vítima de estupro coletivo, deixa hospital ao lado da mãe, no Rio

    "Repudio com a mais absoluta veemência o estupro da adolescente no Rio de Janeiro. É um absurdo que em pleno século 21 tenhamos que conviver com crimes bárbaros como esse", disse.

    A ausência de um posicionamento do presidente interino gerou críticas na redes sociais. A Folha entrou em contato nesta quinta-feira (26) com a equipe do peemedebista, que não se pronunciou. A presidente afastada Dilma Rousseff (PT) usou o Twitter para falar do assunto no mesmo dia. "Mais uma vez, reafirmo meu repúdio à violência contra as mulheres. Precisamos combater, denunciar e punir este crime", escreveu.

    Para o ministro da Justiça, "o estupro representa a maior violência à dignidade da mulher e deve ser duramente reprimido".

    O presidente interino disse ainda que criará um departamento na Polícia Federal para crimes contra mulheres, que agrupará informações estaduais e coordenará ações em todo país. "Nosso governo está mobilizado, juntamente com a secretaria de segurança pública do Rio de Janeiro, para apurar as responsabilidades e punir com rigor os autores do estupro e da divulgação do ato criminoso nas redes sociais", disse.

    Desde a noite de quarta-feira (25), o Ministério Público do Rio de Janeiro e a Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática apuram denúncia de um estupro coletivo em uma comunidade no bairro da Praça Seca, na zona oeste da capital fluminense.

    CASO

    A Polícia Civil já pediu a prisão de quatro homens após a abertura de inquérito para identificar 33 suspeitos. A investigação teve início após um vídeo da jovem, nua e desacordada, ser postado em redes sociais na terça (24). Entre os quatro suspeitos identificados estão dois rapazes que divulgaram imagens da menina na internet; os outros dois teriam praticado abusos. O garoto com quem ela se relacionava também teve a prisão pedida. Os suspeitos têm entre 18 e 41 anos.

    Na gravação, um grupo de homens, em meio a risadas, toca nas partes íntimas da garota e diz que ela foi violentada por "mais de 30". Em 2009, a lei 12.015 foi alterada e passou a considerar, além da conjunção carnal, atos libidinosos como crime de estupro.

    A vítima depôs à polícia na madrugada desta quinta (26) e contou que saiu de casa no sábado (21), à 1h, para ir à comunidade da Barão, em Jacarepaguá. Lá, encontraria um garoto de 19 anos com quem estava "ficando" e a quem identificou como "Petão".

    Os dois se conheceram no colégio há três anos. A jovem contou que, ao chegar na Barão, foi para a casa do rapaz, onde ficaram sozinhos. A partir daí, afirmou só se lembrar de ter acordado no dia seguinte, domingo, em outra casa.

    Segundo seu relato, estava dopada, nua e sendo observada por 33 homens armados de fuzis e pistolas. A polícia suspeita que eles integrem a quadrilha de traficantes de drogas que atua na região.

    Editoria de Arte/Folhapress
    ONDE FOI O CRIME Caso é investigado pela Polícia Civil e Ministério Público do Rio

    REPERCUSSÃO

    A denúncia de estupro coletivo gerou fortes reações nas redes sociais, com manifestações de indignação e a convocação de protesto contra a violência sexual.

    O estupro coletivo da adolescente também desencadeou um amplo debate sobre a existência de uma cultura do estupro no Brasil em sites de publicações pelo mundo. Órgãos de imprensa de diferentes continentes relataram a investigação do crime e a campanha massiva que tomou as redes sociais no Brasil.

    A ONU Mulheres Brasil, um braço das Nações Unidas no país, também divulgou nota se solidarizando com as vítimas de estupro coletivo no país. A declaração cita, além do caso do Rio de Janeiro, um estupro ocorrido contra uma garota de 17 anos, no último dia 20 no Piauí.

    A organização pede às autoridades brasileiras que não permitam a exposição social das vítimas. "À sociedade brasileira, a ONU Mulheres pede a tolerância zero a todas as formas de violência contra as mulheres e a sua banalização", diz a nota.

    O crime também provocou reações no mundo jurídico. O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes divulgou nota repudiando o caso. "Estou extremamente indignado diante de tamanha violência que envergonha e provoca dor em todos os brasileiros", disse Mendes. O ministro disse ter certeza de que "os culpados serão punidos pela Justiça".

    A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) também repudiou o estupro no Rio e também um caso ocorrido no Piauí. "Esse tipo de crime bárbaro, além de chocar toda a população brasileira, evidencia a necessidade de punições rígidas contra a violência de gênero, que possui números alarmantes no Brasil. A conduta dos agressores merece rechaço e apuração rigorosa das autoridades policiais, a fim de coibir esse tipo de prática criminosa, que traz danos irreversíveis à integridade das vítimas", afirmou a entidade em nota.

    A procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, reforçou o discurso. "O compromisso que a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) assume diante desses bárbaros episódios é de vigilância e de responsabilização dos agentes públicos cujas iniciativas, inclusive no campo simbólico, comprometam uma Constituição que carrega dentro de si a percepção genuinamente utópica de uma comunidade livre e igualitária de indivíduos independentes".

    FAMÍLIA EM CHOQUE

    Após o depoimento, a garota foi encaminhada a um hospital público no qual recebeu um coquetel de medicamentos para evitar doenças sexualmente transmissíveis. Também foi examinada no Instituto Médico Legal.

    A família da adolescente, que é mãe de um garoto de três anos, soube do crime por meio de um vizinho, que telefonou após ver o vídeo na internet, na quarta (25).

    "Chorei quando vi o vídeo. Choramos todos. Me arrependi de ter visto. Quando ouvimos a história, não acreditávamos no que estava acontecendo. É uma situação deprimente", afirmou a avó materna da adolescente.

    "Ela não está bem. Está muito confusa. A coisa foi muito séria", afirmou. "Estamos muito fragilizados. O pai dela sofreu dois AVCs [Acidente Vascular Cerebral] no último ano", disse a avó.

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