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    Menino de dez anos suspeito de furtar carro é morto por PM em SP

    SIDNEY GONÇALVES DO CARMO
    PAULO SALDAÑA
    LEANDRO MACHADO
    GUILHERME MAGALHÃES
    PAULO GOMES
    DE SÃO PAULO

    03/06/2016 09h58 - Atualizado às 00h23

    Um menino de dez anos foi morto a tiros por policiais militares na noite de quinta-feira (2) na zona sul de São Paulo. A criança e um colega de 11 anos, segundo a Secretaria Estadual da Segurança Pública, haviam furtado um carro em um condomínio da região e passaram a ser perseguidos.

    Segundo a PM, os policiais deram ordem de parada, mas os dois meninos aceleraram o Daihatsu preto e fugiram. Durante a perseguição policial, na região do Morumbi, Italo, que conduzia o carro, perdeu o controle e bateu em um ônibus e em um caminhão.

    Quando os policiais se aproximaram com duas motos e um carro, segundo a PM, foram recebidos a bala. Italo, 10, que dirigia, foi atingido na cabeça e morreu no local. J, 11, que estava no banco traseiro, foi levado à delegacia. O menino prestou depoimento e foi entregue aos responsáveis -de acordo com a legislação, menores de 12 anos não podem ser detidos.

    Segundo o governo, no relato ao delegado de madrugada, na presença da mãe, o menino disse que o colega atirou duas vezes na polícia, num primeiro momento, e, depois que bateu o carro, disparou de novo antes de ser atingido.

    À noite, em novo depoimento, mudou a versão e disse que o colega deu três tiros durante o trajeto –não tendo disparado depois da batida do carro. Nesse momento, disse, os policiais atiraram nele.

    O secretário da Segurança Pública, Mágino Alves Barbosa Filho, afirmou à Folha que considerou legítima a ação da PM. "Não me apresentaram qualquer evidência que a ocorrência não tenha sido absolutamente legítima por parte da polícia", declarou.

    "Esse menino não levou tiro na rua, levou tiro na troca de tiros. Ninguém tem dúvida que ele estava dirigindo o carro. Criança manusear uma arma impropriamente, a gente está cansado de ver casos e casos", completou Mágino.

    Já o ouvidor da Polícia Militar, Júlio César Fernandes Neves, cobrou investigação, e a Corregedoria da PM abriu inquérito administrativo. A Polícia Civil fará uma reconstituição do caso e irá oferecer às famílias vaga no programa de proteção à testemunha do governo estadual.

    Em entrevista, a diretora do DHPP, Elisabete Sato, disse ainda não ter elementos para afirmar se houve "isso ou aquilo". "Neste início, nada é descartado", afirmou ela, ao ser questionada sobre a dinâmica do caso.

    "Todas as dúvidas que vocês [jornalistas] têm nós também temos. Isso vai ser dirimido a partir das perícias e da reconstituição", disse a delegada, reafirmando ainda que o órgão não protege nenhuma instituição. "Vamos apurar todas as dúvidas".

    Os dois meninos já tiveram ao menos três ocorrências de roubo neste ano. Nos três registros policiais, eles não portavam armas. Foram uma tentativa de furto no parque Ibirapuera, em janeiro, em hotel, em abril, e a condomínio -este último em 28 de maio, quando eles quebraram o vidro de um veículo.

    Os pais do menino morto também têm condenações judiciais. O pai está preso por tráfico, e a mãe, Cintia Francelino, 29, já cumpriu pena por furto e roubo.

    Na tarde desta sexta (3), enquanto aguardava a liberação do corpo do filho no IML de São Paulo, Cintia desabafou. "O meu filho era uma criança. Ninguém vai trazer o meu filho de volta." Só por volta das 21h ela conseguiu entrar no IML para reconhecer o corpo do menino, que estava matriculado no segundo ano em uma escola estadual e, disse a mãe, sonhava ser cantor.

    A família, que já perdeu tudo em dois incêndios em favelas, vive na comunidade do Piolho, no Campo Belo, na zona sul. "Moramos na favela. Eles vão vir atrás de nós. Não vai ter justiça", disse um tio, que não quis se identificar.

    O menino será enterrado neste sábado (4). Um dia antes, a família gastou R$ 628 com caixão e coroa de flores. "O último dinheirinho que a gente tinha", afirmou a mãe do menino.

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