• Cotidiano

    Friday, 03-May-2024 16:12:25 -03

    Guarda-civil errou do início ao fim em ação que matou garoto de 11 anos

    EMILIO SANT'ANNA
    DE SÃO PAULO

    MARINA ESTARQUE
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    27/06/2016 19h53

    Eduardo Anizelli/Folhapress
    Mãe de Waldick Gabriel Silva Chagas mostra a foto do filho morto por um GCM na noite do último sábado(25), na Cidade Tiradentes, zona leste da cidade de São Paulo
    Mãe de Waldik Gabriel Silva Chagas, por um GCM em São Paulo, mostra foto do filho no celular

    O tiro que matou Waldik Gabriel Silva Chagas, 11, na noite de sábado (25), resultou de uma ação totalmente errada da GCM (Guarda Civil Metropolitana). Do início ao fim.

    De acordo com o secretário Municipal de Segurança Urbana, Benedito Mariano, os três guardas envolvidos no caso não deveriam nem ter começado a perseguição que resultou na morte do menino.

    "A função fundamental da GCM é cuidar de patrimônio público e policiamento preventivo. Esse conceito não permite que a guarda faça perseguição a suspeitos", diz. "Foi uma ocorrência totalmente equivocada."

    Na noite de sábado, guardas-civis realizavam ronda em Cidade Tiradentes, bairro do extremo leste de São Paulo, a cerca de 30 km do centro da cidade, quando motoqueiros se aproximaram e disseram ter sido assaltados por homens em um Chevette prata.

    Os guardas localizaram o carro e começaram a perseguição. Segundo a polícia, os ocupantes do veículo efetuaram disparos contra os guardas, que revidaram.

    Um dos tiros atingiu, na nuca, o menino Waldik, que estava no banco de trás do veículo. Os suspeitos abandonaram o carro, com o garoto ferido, e fugiram. Segundo a família, estavam com o menino outros dois adolescentes, um de 13 e outro de 14 anos.

    Chefe da GCM, o secretário explica que, desde 2008, diretriz da corporação estabelece de forma clara que os guardas não devem se envolver em perseguições a suspeitos.

    Os agentes deveriam apenas ter avisado a PM e ficado onde estavam. "Se há a indicação de que um grupo efetuou algum delito, a orientação é comunicar através de rádio a PM ou a Polícia Civil as caraterísticas dos indivíduos e do veículo. Termina aí a atividade da guarda", diz.

    Waldik Gabriel Silva Chagas

    À GCM só é permitido agir em situação de flagrante. Se, nessa condição, os suspeitos escaparem, mais uma vez a orientação é acionar a polícia. "Nunca deve fazer perseguição de suspeito", afirma.

    Assim como o início da ação, o desfecho foi resultado de mais um erro.

    "O protocolo [da GCM] não foi observado. Só em casos muito excepcionais a guarda faz perseguições e, para disparar um tiro, é mais excepcional ainda. A vida de alguém tem que estar em risco, a dele ou alguém próximo dele", afirmou o prefeito Fernando Haddad (PT).

    Segundo o advogado criminalista Gustavo Neves Fortes, outro erro dos agentes foi não fazer a identificação das vítimas que teriam sido assaltadas pelos suspeitos.

    O autor do disparo foi preso por homicídio culposo (sem intenção). Ele pagou R$ 5.000 de fiança e foi liberado. O caso é investigado pela Polícia Civil. Os três agentes, que alegam terem reagido, foram afastados das ruas e farão serviços internos até o final da apuração do caso pela Corregedoria da GCM.

    ENTERRO

    Nesta segunda (27), o corpo de Waldik foi enterrado no cemitério de Vila Formosa, na zona Leste. A cerimônia foi marcada pelo clamor dos familiares por justiça. "Foi um tiro certeiro, eles atiraram para matar. Não dá para se conformar. O que ele [guarda] fez foi uma barbaridade. Se fosse com o filho dele, ele iria até o inferno buscar quem matou. Quero justiça", disse o tio do menino, Valmir Chagas, 39.

    A morte de Waldik acontece menos de um mês depois de o menino Italo, de 10 anos, ter sido morto por policiais militares na zona sul de São Paulo. Italo estava com outro garoto, de 11 anos, em um carro furtado, quando foi baleado durante perseguição. O caso ainda está sendo investigado pela Polícia Civil.

    -

    Região onde garoto foi morto

    CIDADE TIRADENTES
    Abriga o maior complexo de conjuntos habitacionais da América Latina. São cerca de 40 mil unidades, a maioria delas construída na década de 80

    220 mil habitantes

    Área do distrito: 15 km²

    15% das famílias em situação de vulnerabilidade

    21 vítimas de homicídio doloso e 1.283 roubos registrados em 2015

    Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) em 2010: 0,708 (considerado alto –quanto mais próximo de 1, melhor a qualidade de vida da população)

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024