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    Atirar contra veículo em fuga deve ser sempre evitado, diz norma da PM

    THIAGO AMÂNCIO
    DE SÃO PAULO

    28/06/2016 18h58

    Agentes de segurança pública não devem atirar contra veículos suspeitos em fuga, mesmo que esses tenham furado um bloqueio policial. A exceção é quando a vida dos agentes estiver em risco.

    Isso é o que consta do método Giraldi, conjunto de normas ensinado pela própria Polícia Militar de SP para reduzir a letalidade policial.

    Desde a última sexta (24), três jovens morreram na capital paulista após abordagens de PMs ou guardas-civis. Todas ocorreram após perseguição. Da mesma forma morreu no começo do mês o menino Italo, 10, quando fugia com um carro furtado.

    O método Giraldi é claro: não se deve disparar contra veículos, incluindo motos, em fuga, mesmo que tenham rompido um bloqueio.

    Projéteis podem se transformar em balas perdidas e atingir inocentes nas imediações, diz o método. Com uma ressalva: "Só disparar contra agressor que estiver atentando contra a vida de alguém, incluindo a do policial."

    O método Giraldi é usado em treinamentos da PM em SP e boa parte de suas diretrizes foi aplicada nacionalmente em portaria do Ministério da Justiça de 2010.

    O coronel da reserva da PM e ex-secretário Nacional de Segurança Pública José Vicente da Silva Filho vai além: não se pode disparar mesmo quando bandidos atiram. "Atirar em veículo em movimento, só no cinema", diz.

    "Pode ter inocente dentro do veículo, uma pessoa sequestrada, por exemplo. O correto é desviar ou mesmo deixar fugir, acionar o centro de operações e dar características como marca, cor e itinerário para que algum veículo na frente possa fazer um cerco", diz o ex-secretário.

    Ele afirma que, no caso do menino Italo, em que um policial de moto chegou ao lado do motorista, o policial infringiu ainda outra norma. "Tem que ficar atrás do veículo suspeito para proteger a própria vida. É muito difícil alguém dentro de um carro dar um tiro para trás", afirma.

    Para Rafael Custódio, um dos coordenadores da ONG Conectas Direitos Humanos, "armas letais devem ser sempre usadas em último caso." "Veja como é irracional esse tipo de conduta: um agente público, para recuperar um bem privado, deve correr o risco de matar uma pessoa? Uma vida vale sim mais que um carro, seja o carro que for, seja a vida que for."

    Moisés Nascimento, major da reserva da PM e responsável por treinar novos agentes, explica que o tiro em movimento sequer é ensinado "para não incentivar a prática". Também não se pode atirar em pneus na tentativa de parar os carros, porque balas podem ricochetear.

    "É claro que em situações extremas, e o policial sabe que ele corre risco, há exceções. Se ele tem a convicção de que não há risco de atingir inocentes, pode ser diferente. Mas só treinamos o tiro desembarcando do veículo, nunca em movimento."

    'MINI-PM'

    Guardas municipais estiveram envolvidos na morte do menino Waldik, 11, no sábado (25), e do universitário Julio César Alves Espinoza, em ação na segunda (27).

    "Especialistas defendem um maior papel dos municípios e da União na segurança pública, hoje praticamente atribuição dos Estados", explica o coordenador da ONG Conectas. "Mas é preciso reformar a estrutura jurídica brasileira", diz.

    Guarda Civil em perseguição

    "Ao dar poder de polícia a guardas-civis, a gente faz um trabalho pela metade: cria uma nova corporação que age como se fosse polícia, mas que não tem preparo para isso. Há uma sobreposição de funções", afirma ele.

    Pesquisador do Núcleo de Estudos de Violência da USP, Bruno Paes Manso diz que a GCM acaba se tornando uma "mini-polícia militar". "É preciso que a Guarda Civil faça um trabalho complementar, de ajuda à PM", declara.

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