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    Nem 10% do valor roubado em mega-assaltos é recuperado pela polícia

    MARCELO TOLEDO
    DE RIBEIRÃO PRETO

    12/07/2016 17h00 - Atualizado às 19h39

    Alfredo Risk
    Bandidos explodem empresa de valores em Ribeirão Preto
    Bandidos explodem empresa de valores em Ribeirão Preto

    Bombas, explosões que abalam prédios vizinhos, equipamentos que têm poder para derrubar aviões e roteiro pós-crime de relativo sucesso até aqui.

    Quadrilhas que fizeram mega-assaltos no interior de São Paulo nos últimos meses estão levando vantagem até o momento, também na missão de esconder o dinheiro roubado dos cofres das empresas de transporte de valor.

    Não se sabe oficialmente o valor exato roubado pelas quadrilhas em ações cinematográficas desde novembro em Campinas (duas vezes), Santos e Ribeirão Preto, mas sindicatos de vigilantes e policiais afirmam que só nos últimos três ataques o montante chega ao menos a R$ 135 milhões.

    Desse total, somente R$ 10 milhões foram apreendidos pela polícia até aqui, o equivalente a 7,4%.

    Em comum, os quatro ataques foram realizados entre 4h e 4h30, em dias úteis, tiveram explosões e foram feitos sem pressa pelas quadrilhas, que trocaram tiros com policiais. Na fuga, a ação mais comum foi atear fogo em carros e/ou usar veículos para interditar ruas.

    Três das ações tiveram como alvo a empresa Prosegur. Criticada pela polícia, a empresa alega ser vítima e que sua estrutura suporta ataques de até 30 minutos, tempo "suficiente" para a chegada dos agentes.

    OS MEGA-ASSALTOS EM SP - Ataques ocorreram em horários semelhantes e grupos usaram mesmo modo de ação

    A onda de ataques teve início em novembro, quando cerca de 20 homens com fuzis e explosivos atacaram a Prosegur em Campinas, trocaram tiros com policiais militares e destruíram transformadores de energia.

    Após o roubo, atearam fogo num caminhão e deixaram outro atravessado na rodovia Santos Dumont, para bloquear a passagem.

    Quatro meses depois, na mesma cidade, mas na empresa Protege, três paredes foram explodidas pela quadrilha, numa ação que durou uma hora e meia. Depois, ela incendiou três veículos num trevo entre a Anhanguera e a mesma Santos Dumont.

    Denny Cesare/Codigo19/Folhapress
    Policiais e funcionários da Protege em frente a cratera aberta na parede pela explosão
    Policiais e funcionários da Protege após explosão e assalto a unidade da empresa, em Campinas (SP)

    No mês seguinte, foi a vez de a Prosegur ser novamente assaltada, em Santos. Além de fuzis e explosivos, ladrões usaram um caminhão para destruir o portão da empresa, que ficou totalmente destruído. Na fuga, trocaram tiros com a PM em quatro locais de Santos e em Cubatão, na rodovia Anchieta. Três pessoas morreram, sendo dois policiais.

    Nesta terça (12), a polícia prendeu, em São Caetano do Sul (ABC paulista), um homem que confessou envolvimento no assalto em Santos. No local em que estava, os agentes encontraram dois carregadores de fuzil AR-15 e 90 cartuchos.

    Segundo as investigações, ele fazia a segurança dos outros criminosos. Os agentes apreenderam, ainda, celulares, uma balança de precisão e luvas. Ele vai ser indiciado por suspeita de latrocínio, organização criminosa, uso de documento falso e porte de munição de calibre restrito.

    Na última ação do tipo, semana passada, em Ribeirão Preto, num roubo em que foram disparados mais de mil tiros, 2.265 imóveis ficaram sem energia e até uma retroescavadeira foi usada para bloquear ruas no entorno da Prosegur, numa ação que resultou em duas mortes.

    "As armas usadas pelas quadrilhas são muito mais potentes, são de guerra, é impossível segurar um ataque assim", disse João Batista Marcon de Castro, diretor do Sindforte (sindicato dos vigilantes) em Ribeirão.

    Vigias da cidade foram alvo também de um roubo a um carro-forte em Luiz Antônio (a 273 km da capital), em abril, quando tiros de.50, usadas em baterias antiaéreas, atravessaram a blindagem do veículo.

    No intervalo de um ano, ocorreram ao menos 17 ataques a veículos e empresas de transporte de valores em sete Estados.

    INVESTIGAÇÃO

    A polícia localizou sete veículos usados pela quadrilha que assaltou a empresa em Ribeirão Preto, quatro deles blindados, num canavial próximo à cidade. Como os ladrões fugiram a partir do abandono dos carros é um mistério -é investigada inclusive a hipótese de terem usado pequenas aeronaves.

    A chácara utilizada pelos ladrões nos dias que antecederam o ataque também foi encontrada, assim como disfarces usados para não serem reconhecidos. Por enquanto, não há pistas do dinheiro.

    De acordo com a Secretaria de Estado da Segurança Pública, não há evidência concreta que aponte para a participação de uma organização criminosa específica nos crimes e a investigação também apura se há elo entre os ataques.

    No vídeo é possível ouvir os disparos feitos pelo grupo durante roubo a empresa de valores

    No velório do policial rodoviário Tarcísio Wilker Gomes, 43, morto em Ribeirão, o secretário da Segurança Pública, Mágino Alves Barbosa Filho, disse ser possível existir ligação entre os mega-assaltos.

    "Pode ser, não é de se descartar, pode ser. Mas as investigações estão muito no início e é precipitado falar qualquer tipo de coisa, mas pode ser que tenha sim", afirmou.

    MEGA-ASSALTO EM RIBEIRÃO-PRETO
    Quadrilha assalta transportadora de valores

    Diretor do Deinter (Departamento de Polícia Judiciária do Interior) 3, João Osinski Junior disse que a investigação será lenta, para tentar desarticular a quadrilha toda.

    Osinski criticou também a Prosegur, ao afirmar que o volume financeiro era muito alto para ficar aos cuidados de, segundo ele, um vigilante só.

    "Por que havia três carros-forte na rua? Eles estavam lá porque ele [o vigia] não queria que alguém batesse com a retroescavadeira e derrubasse a parede. Então ele já sabia que iam assaltar."

    Conforme a secretaria, da ação de Santos foram apreendidos quatro veículos blindados, oito fuzis, munição, coletes e três explosivos, além de terem sido recuperados R$ 10 milhões.

    Já sobre o roubo deste ano em Campinas, sete homens foram presos e houve apreensões de armas e munições, além de cerca de R$ 80 mil. Em relação ao ataque de novembro na cidade, quatro criminosos foram presos, conforme o Estado.

    REPÚDIO

    Por meio de um comunicado, a Prosegur informou repudiar a tentativa de ser responsabilizada pelo crime e disse que a polícia precisa "atuar de forma mais contundente na raiz do problema, coibindo a entrada dessas armas ilegais no país, investigando e prendendo os líderes dessa quadrilha".

    Ainda conforme a empresa, todas as regras são seguidas e os investimentos são feitos de forma a tornar as bases capazes de suportar ataques de até 30 minutos, "tempo que seria suficiente para a chegada das autoridades policiais". A base da empresa em Ribeirão fica a dois quilômetros do quartel da Polícia Militar.

    Diz ainda que os carros-forte na frente da base têm como objetivo criar mais uma barreira para dificultar os roubos e que o efetivo estava adequado às necessidades.

    Já a ABTV (Associação Brasileira de Transporte de Valores) informou que as empresas "são vítimas da frágil situação da segurança pública do país". "A responsabilização das transportadoras de valores é uma conclusão simplista e cômoda, distorcida da realidade, e que coloca em risco toda a sociedade, pois não ataca o problema real e da forma correta", diz trecho de comunicado da entidade.

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