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    Obra do metrô em Higienópolis perde resistência seis anos após polêmica

    THIAGO AMÂNCIO
    DE SÃO PAULO

    09/08/2016 17h56

    Joel Silva/ Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL-09-08- 2016 : Rua Sergipe interditada para obras do metro em Higienopolis. ( Foto: Joel Silva/ Folhapress )
    Obra na rua Sergipe, em São Paulo, onde ficará a futura estação Angélica-Pacaembu do metrô

    "Drogados, mendigos, uma gente diferenciada." Foi essa a maneira como moradores de Higienópolis, bairro nobre de São Paulo, definiram, em 2010, o que aconteceria se ali fosse construída a estação Angélica-Pacaembu, da linha 6-laranja do metrô.

    Exatos seis anos depois, começaram as obras da estação no coração do tradicional bairro judaico paulistano. O trânsito de parte da rua Sergipe foi interditado nesta segunda-feira (8). Nesta terça (9), operários trabalhavam na demolição de casas onde ficarão entradas da estação.

    Pedro Iwanov, presidente da Associação Defenda Higienópolis, que organizou um abaixo-assinado contra a construção da estação na esquina da avenida Angélica com a rua Sergipe, como estava prevista, diz que a história é "página virada".

    "Nunca fomos contra o metrô, porque é impossível, Higienópolis é um dos bairros mais atendidos por metrô, tem a estação Santa Cecília, Marechal Deodoro, Paulista, até a Clínicas. Só éramos contra o local dela", diz, se referindo à proximidade com a futura estação Higienópolis-Mackenzie, 600 metros adiante, porque "o metrô não poderia pegar velocidade".

    "Só queríamos que fosse para mais perto do Pacaembu, mais próximo da [faculdade] Faap", afirma. "Do nosso ponto de vista, a questão se encerrou quando ele mudou de local". Hoje, duas saídas são construídas: uma ainda na rua Sergipe, próximo ao local da polêmica, e outra na rua Armando Álvares Penteado, na lateral da Faap.

    "GENTE DIFERENCIADA"

    Após uma moradora dizer à Folha, em 2010, que a estação atrairia "drogados, mendigos, uma gente diferenciada", a reação virou piada na internet e um grupo chegou a organizar um "churrascão da gente diferenciada", em maio de 2011, que reuniu centenas de pessoas na avenida Higienópolis.

    A percepção no bairro parece ter mudado. "Não querer metrô é indefensável", diz o aposentado Hiran Leão, 86. "Metrô tem que ter a cada dez metros".

    O mesmo diz a advogada Carolina Jorge, que prefere não revelar a idade. "Morei fora muito tempo e acho que o metrô é sempre bem-vindo. Em Nova York e em Paris, só andava de metrô. É uma questão de facilidade", conta. "O pessoal aqui reclama mesmo, mas, depois que for construído, vão usufruir", diz Sabrina Cohen, 39, enquanto passeava com seu bebê.

    Presidente da Associação Moradores e Comerciantes de Santa Cecília e Higienópolis, Fábio Fortes diz que o metrô "vem com atraso". "É um transporte extremamente eficiente, de massa, que atende a demanda da cidade", afirma.

    Nem todos são a favor, porém. Para o engenheiro Eduardo Morais, 63, a saída do metrô da avenida Angélica só piorou a situação. "Isso é lugar de construir uma estação? Por que não na Angélica, onde passa ônibus, tem comércio? Vai construir aqui, que é tranquilo?", questiona.

    Ricardo Santos, 58, engenheiro agrônomo afirma que ainda não sabe o que esperar. "Acho que pode até melhorar um pouco o trânsito, seria benéfico. Mas o maior receio é encher de ambulante, ter muita muvuca", diz ele, que não utiliza o metrô. "Torço para manter essa tranquilidade."

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    TRABALHADORES

    São os trabalhadores da região os mais otimistas. "Pego metrô no Jabaquara e preciso depois pegar outro ônibus para chegar aqui, agora vou poder vir direto", diz Maria Eda, 52, cuidadora de idosos.

    "O pessoal aqui é mais chato, acham que vai tumultuar. Mas o metrô é válido, ajuda todos", diz Daniela Alves, 36, que trabalha numa seguradora nas redondezas. "Para mim vai ser ótimo, mas a minha patroa tem reclamado muito", diz Maria Aparecida da Silva, 69, também cuidadora. Ela trabalha em um prédio ao lado de uma das construções e tem sofrido com o barulho.

    A obra tem afugentado os clientes do empresário Redivaldo Araújo, 46, cujo salão de beleza fica bem em frente a uma casa em demolição e onde o trânsito foi interrompido.

    "Já dispensei o serviço de terapia, de massagista, porque ninguém vai relaxar com esse barulho. Não conseguem mais vir de carro. Minha cliente é exigente, tolerância zero. E perder cliente nessa crise não dá", afirma ele, que teve sete clientes na segunda, quando começou a interdição –em geral, ele diz que o movimento não é menor que 25 pessoas por dia.

    LINHA 6

    A linha 6-laranja ligará a Vila Brasilândia, na zona norte, a São Joaquim, região central, com 15,3 quilômetros de extensão ao longo de 15 estações. A previsão de entrega é em 2021. Haverá integração com as linhas 1-azul e 4-amarela do metrô, além da linha 7-rubi da CPTM. O custo total da implantação da linha é de R$ 9,9 bilhões.

    RIO

    A ampliação do metrô no Rio também enfrentou polêmicas durante a construção de estações em bairros nobres da cidade. Desde 2011, moradores de Ipanema protestam contra a construção de uma estação na praça Nossa Senhora da Paz, prevista no traçado da Linha 4, recém-inaugurada para os Jogos Olímpicos.

    Sob o argumento de que a circulação de pessoas prejudicaria a tranquilidade da praça, os moradores juntaram 12 mil assinaturas em um abaixo-assinado e organizaram protestos contra a derrubada de árvores.

    Assim como moradores de Ipanema, os do Leblon se queixaram da construção de estações. Argumentam que o bairro é pequeno e já teria infraestrutura de transporte considerada adequada pelos moradores. Este ano, a instalação dos respiradouros do metrô, na praça Antero de Quental, também foi alvo de críticas.

    O impacto das obras da Linha 4 também serviu de combustível para as críticas. Moradores se queixaram de rachaduras em prédios e buracos nas ruas que teriam sido provocados pelas escavações.

    Colaborou LUISA BUSTAMANTE, do Rio

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