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    Matar familiares e se suicidar pode indicar 'proteção', dizem psicólogos

    JAIRO MARQUES
    DE SÃO PAULO

    30/08/2016 02h05

    Cometer um ato extremo como o suicídio e envolver familiares, de acordo com profissionais consultados pela Folha, pode ter significados distintos para o autor, como avaliar que a família é parte de sua própria existência ou ainda que a medida tem o sentido de proteger quem ficaria vivo de mais sofrimento.

    Esses especialistas em psicologia também levantaram a hipótese de o suicida generalizar o sentimento que o aflige para os demais membros familiares, principalmente filhos e cônjuges.

    Dois casos com características semelhantes chocaram o país nesta segunda-feira (29).

    No Rio, um executivo da área de telecomunicações é suspeito de assassinar a mulher e dois filhos antes de se matar em condomínio de classe média alta na Barra.

    Uma carta indica que ele estava insatisfeito com a recente mudança de emprego.

    Em São Paulo, um homem se jogou com seu filho de quatro anos no colo do 17º andar de um fórum trabalhista. Os dois morreram. Ele deixou bilhete no qual fala em dívidas e desentendimento com a ex-mulher, além de um recado: "Às vezes tem um suicida na sua frente e você não vê".

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    GENERALIZAÇÃO

    "O suicida pode incorporar o sentimento que o mundo não vale a pena e que, matando um familiar, ele estaria poupando a pessoa desta sensação. Pode recair sobre o suicida uma sombra cinza que o faz generalizar sensações e, assim, ele é convicto de que o outro sente o mesmo que ele", diz Aurélio Melo, professor da Faculdade de Psicologia do Mackenzie.

    O professor e psicólogo da PUC-SP Antonio Carlos Amador Pereira destaca que, quando um suicida envolve uma criança em um ato anterior, um homicídio por exemplo, pode se revelar um "apego incomum" ou um conflito, pendência com o indivíduo.

    Moacyr Lopes Junior/Folhapress
    Corredores do Fórum Trabalhista Ruy Barbosa em 2012
    Corredores do Fórum Trabalhista Ruy Barbosa em 2012

    "A ligação do suicida com a criança pode ser tão forte que ele a vê como parte dele, como um objeto dele. Os níveis de desequilíbrio e sofrimento são tão grandes que não se consegue ver o ponto de vista do outro", afirma.

    Para os que falaram à reportagem, não é possível isolar apenas um fator que tenha determinado atitudes tão dramáticas como as ocorridas nesta segunda no Rio e em SP.

    "A dificuldade financeira pode ser um fator desencadeante, nunca a causa principal de um suicídio, que acontece quando falha nosso freio interno que impede que tomemos atitudes assim. Há uma série de possibilidades, como conflitos internos desesperadores, fatores sociais, fatores morais ou um quadro de depressão", declara o professor da PUC-SP.

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    De acordo com os especialistas, embora pessoas que pensem em cometer suicídio possam dar alguns sinais do sofrimento, muitas vezes ou eles são difíceis de detectar pela sutileza de uma mudança de padrão de comportamento ou são ignorados.

    "Cada vez mais, a vida caminha para a individualidade e estamos muito pouco sensíveis ao sofrimento alheio, a observar que o outro está passando por um momento complicado. Mas há também casos de pessoas que não se permitem expressar sentimentos, o que torna quase impossível dimensionar a profundidade de um apelo", diz o professor do Mackenzie.

    QUALIDADE

    Dario Teófilo Schezzi, do Conselho Regional de Psicologia de SP, diz que é preciso repensar a "qualidade dos encontros sociais e familiares".

    "Que tipo de relação se tem em casa? Que sentimentos o outro desperta na gente em nossos contatos? Os sinais de que algo não caminha bem até podem ser dados, mas não damos importância."

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    SINAIS
    Sinais de alerta para potencial vítima de suicídio

    • Mudança drástica de comportamento
    • Abandono das atividades sociais
    • Instabilidade emocional e depressão
    • Agitação e irritabilidade
    • Consumo de álcool e drogas

    141 é o telefone para atendimento com voluntários do CVV (Centro de Valorização da Vida)

    Divulgação
    Família é encontrada morta em condomíno na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro
    Família é encontrada morta em condomíno na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro
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