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    Empreiteiras negociaram propina para abafar apuração de cratera do metrô

    FLÁVIO FERREIRA
    MARIO CESAR CARVALHO
    ROGÉRIO PAGNAN
    DE SÃO PAULO

    17/11/2016 02h00

    Representantes de empreiteiras envolvidas no acidente nas obras da linha 4-amarela do metrô paulista em 2007 negociaram o pagamento de propina com um advogado que se dizia intermediário de um promotor de Justiça, segundo a Folha apurou com profissionais ligados a três das construtoras do consórcio que fez a linha.

    O objetivo da negociação era favorecer executivos das construtoras investigados no desabamento no canteiro de obras, que deixou sete mortos em janeiro de 2007, no início da gestão José Serra (PSDB). Esse foi o maior acidente da história do Metrô de SP.

    A obra foi feita pelo consórcio Via Amarela, que era liderado pela Odebrecht e tinha a participação de Camargo Corrêa, OAS, Queiroz Galvão e Andrade Gutierrez.

    As fontes que tiveram conhecimento sobre as tratativas, porém, dizem não saber se o suborno foi pago. A simples solicitação ou oferta de propina, porém, já configura o crime de corrupção, de acordo com o Código Penal.

    O Tribunal de Justiça julgará nesta quinta (17) o caso do desabamento em segunda instância. Em primeiro grau, a Justiça absolveu os 14 réus das empreiteiras e do Metrô por considerar que a Promotoria não conseguiu provar que os acusados tinham condições de evitar a cratera e as mortes.

    A denúncia do Ministério Público não apontava a responsabilidade de membros dos altos escalões das empreiteiras ou da estatal de trens.

    AS NEGOCIAÇÕES

    Segundo as fontes ouvidas pela Folha, nas tratativas de propina em 2007 um dos representantes das empresas foi o advogado Fernando Maximiliano Neto, que já havia trabalhado no departamento jurídico da Odebrecht. Outro nome é o do advogado Ismar Marcílio de Freitas Jr., que dizia representar o então promotor Ruy Pires Galvão Filho.

    À época do acidente, Galvão integrava a equipe de promotores do foro regional de Pinheiros (zona oeste da capital), responsável pelo caso. Ele nega ter atuado na apuração, apesar de ter assinado papéis da investigação.

    Galvão, que foi promovido a procurador, aparece citado de maneira cifrada em e-mail apreendido pela Polícia Federal na Operação Lava Jato, segundo a Folha apurou.

    Nessa mensagem, enviada em 2 de julho de 2007, o diretor da Odebrecht nas obras da linha 4, Marcio Pelegrini, pede autorização para pagar um "beneficiário" identificado como "Rui Falcão (prom)", referente à "metro-L.4". Justificativa: "Ação: apoio no processo de invest. MP".

    O "Rui Falcão" mencionado no e-mail é Ruy Pires Galvão Filho, segundo fontes que tiveram conhecimento sobre as negociações em 2007.

    A mensagem aponta também que a quantia inicial a ser paga seria de R$ 200 mil e caberia à Odebrecht arcar com um quinto do montante.

    Em avaliação sobre essa mensagem, a PF aponta em relatório que "ao que parece, o pagamento em questão se destinava à obtenção de algum favorecimento nos resultados da apuração e talvez da ação para ressarcimento que foi proposta pelo parquet [Ministério Público] estadual".

    A propina total, segundo papéis apreendidos em 2009 na Operação Castelo de Areia, que investigou a Camargo Corrêa, seria de R$ 3 milhões.

    A cúpula do Ministério Público abriu investigação sobre o suposto pagamento de propina no mês passado, após a Folha revelar que documentos obtidos pela PF mostravam indícios de suborno no caso.

    O advogado apontado como interlocutor do promotor já foi réu em um processo sob acusação de ter pedido US$ 500 mil a uma empresária para "sumir" com supostas provas que a ligariam a falsificações de certidões do INSS. Ao final, foi absolvido.

    A relação entre Galvão e Freitas Jr. já foi citada pela revista "Veja". Reportagem de 2006 diz que eles circularam por Brasília em 2005, auge do mensalão, dizendo que a promotora de eventos Jeany Mary Corner poderia entregar figuras do PT, algo interpretado pelo então ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, como tentativa de extorsão.

    OUTRO LADO

    O procurador Ruy Galvão Filho nega ter negociado vantagens a empreiteiras na investigação do maior acidente da história do Metrô e diz que nunca poderia ter favorecido as construtoras porque não atuou no caso.

    Mesmo após a Folha enviar ao Ministério Público cópia de um requerimento assinado por ele nos autos dessa apuração, Galvão reafirmou, por meio de nota enviada pela assessoria de comunicação do Ministério Público, que teve apenas uma "atuação meramente formal, corriqueira e lateral", ou seja, sem participar da investigação do caso.

    Luiz Carlos Muraukas - 12.jan.2007/Folhapress
    Perfil - Salva-vidas - Coronel Jair Paca de Lima - ORG XMIT: 182901_1.tif Desastre nas obras da linha 4-amarela do metrô: vista aéra mostra cratera que se abriu após desabamento das obras da linha 4 do Metrô, na rua Capri, em Pinheiros (SP). As obras na linha 4, que vai interligar as estações desde a Vila Sônia à Luz desabou engolindo um micrônibus com 7 passageiros, pessoas que estavam passando na rua e casas perto do local. (São Paulo - SP, 12.01.2007 - Luiz Carlos Muraukas/Folhapress - Digital)
    Vista aéra mostra cratera que se abriu após desabamento das obras da linha 4 do metrô

    Galvão pedia no documento mais prazo para a conclusão do inquérito policial.

    "O então promotor e atual procurador de Justiça Ruy Galvão não atuou no caso. Portanto, era impossível negociar qualquer tipo de vantagem", afirma o texto.

    "O fato é que ele não participou da investigação e tampouco do oferecimento da denúncia, esta a cargo do profissional responsável pelo caso desde janeiro de 2007."

    O promotor que iniciou a apuração foi José Carlos Blat. Já a denúncia foi apresentada por Arnaldo Hossepian.

    Galvão também nega que tenha participado em 2005 de atos de extorsão contra petistas durante o mensalão.

    Dez anos atrás
    Acidente em obras da linha 4-amarela do metrô de SP ocorreu no dia 12.jan.2007

    Segundo a nota da Promotoria, "episódio de 2005 foi devidamente investigado pela Corregedoria do Ministério Público. O procedimento foi arquivado, uma vez que nada se apurou contra a atuação do membro do MPSP".

    O advogado Ismar Marcílio de Freitas Jr., apontado por representantes das empreiteiras como o intermediário na negociação da propina nas apurações sobre o acidente, diz que não atuou no caso.

    "Na época do acidente eu estava fora de São Paulo. Nunca advoguei para empresas, nunca estive na Odebrecht ou OAS. Não tenho contato com ninguém dessas empresas", afirma.

    Freitas Jr. diz que conhece Galvão e defende-o. "Ele nem atuou nesse caso", diz, repetindo a versão do promotor.

    O advogado afirma que a versão de que tentou extorquir petistas durante o mensalão, quando defendia a promotora de eventos Jeany Mary Corner, "foi apenas ilação" da revista "Veja".

    Freitas Jr. diz que o único caso em que foi réu sob acusação de extorsão acabou arquivado. Ele era acusado de pedir US$ 500 mil a uma empresária para desaparecer com papéis que poderiam envolvê-la em crime de falsificação. "Foi uma montagem que fizeram contra mim."

    O ex-advogado da Odebrecht, Fernando Maximiliano Neto, apontado como negociador pelas construtoras, afirmou à Folha que preferia não se manifestar.

    A Camargo Corrêa, OAS e Odebrecht não quiseram se pronunciar.

    -

    Cronologia

    12.jan.2007
    Desabamento nas obras da linha 4-amarela do metrô em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, mata sete pessoas

    Entre 2007 e 2008
    Ministério Público de SP investiga o caso, concluindo que, desde dez.2006, já havia sinais de que o terreno estava cedendo

    Jan. e fev.2009
    Promotores denunciam 14 pessoas (cinco funcionários do Metrô e nove do consórcio construtor ou de terceirizadas)

    11.mai.2016
    Juíza acata a tese do consórcio de que terreno era imprevisível e inocenta os 14 acusados; falta julgar indenização

    19.out.2016
    A Folha revela que documentos apreendidos pela PF sugerem suborno a promotores por empreiteiras; MP abre inquérito

    17.nov.2016
    Nesta quinta, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgará o caso do desabamento em segunda instância

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