• Cotidiano

    Wednesday, 24-Apr-2024 01:21:00 -03

    Cracolândia mantém 'feirão de droga' a céu aberto 4 meses após ação policial

    JOEL SILVA
    LEANDRO MACHADO
    GIBA BERGAMIM JR.
    DE SÃO PAULO

    07/12/2016 02h00

    Três mesas acomodam de maneira organizada pratos de cerâmica cheios de pedras de coloração bege. Ao lado, celulares, maços de dinheiro, balanças e pequenos vidros. Diante das mesas, três homens separam o material que será vendido a dependentes químicos eufóricos atrás de drogas: crack e lança-perfume.

    O comércio ilegal a céu aberto ocorre quatro meses após uma operação da Polícia Civil, sob responsabilidade da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), que prendeu o que chamou de eixo criminoso que abastecia a feira das drogas.

    Nessa área, funciona um projeto prioritário para a gestão Fernando Haddad (PT), o Braços Abertos –que oferece moradia e trabalho remunerado em troca da adesão a um tratamento de redução do uso de drogas. A administração petista acusa a polícia de ser ausente no local.

    O vaivém de traficantes e usuários dentro da feira foi registrado pela Folha nesta segunda (5). A negociação ocorre sob barracas instaladas na rua Dino Bueno, epicentro da cracolândia, próximo à Sala São Paulo, a 1,6 km do prédio do comando da PM e a 1,3 km do Denarc (departamento de narcóticos da Polícia Civil).

    Ali, diariamente agentes da prefeitura fazem uma operação de limpeza da área. No momento em que caminhões com jatos de água passam, usuários e traficantes desmontam as barracas e aguardam o fim da operação. Depois que a área é lavada, tudo retorna ao mesmo lugar. Tráfico e uso de drogas voltam a ocorrer normalmente.

    Nesta terça (6), a Folha revelou que a equipe do prefeito eleito João Doria (PSDB) estuda pagar agentes da Polícia Civil para que usem seus dias de folga para trabalhar no combate ao tráfico na região.

    LINHA DE MONTAGEM

    A venda de drogas na cracolândia ocorre num processo semelhante ao de uma linha de montagem. Nas imagens registradas pela reportagem é possível ver pedras picadas e prontas para o consumo. Cada uma costuma ser vendida livremente por R$ 5.

    Antes de chegar às mesas, elas saem de estabelecimentos comerciais da região em forma de tabletes.

    Passam às mãos de traficantes que atravessam o fluxo de viciados até chegar às barracas. Ali, com estiletes ou facas, outros vendedores cortam os tabletes em pequenas pedras. Também há pequenos vidros que, segundo dependentes, é lança-perfume.

    Ao lado dessas barracas há uma espécie de oficina de confecção de cachimbos. Os utensílios para uso da pedra são feitos com ferro e canudos semelhantes a antenas de rádio para carros. Também são vendidos ali por cerca de R$ 5.

    A prefeitura diz que a guarda municipal tem atuado para defender os agentes que trabalham na tentativa de atrair novos dependentes para o programa Braços Abertos.

    "As polícias Militar e Civil, responsáveis pelo combate ao tráfico de drogas, seguem ausentes da região há mais de 20 anos. E, pelo visto, continuarão assim", afirma o texto.

    Em nota, a Secretaria da Segurança Pública diz que Haddad já fez elogios ao trabalho da polícia na cracolândia. Afirma que o Denarc investiga a ação de grandes fornecedores de drogas na área.

    Neste ano, diz, foram presas 69 pessoas envolvidas com o tráfico e ao menos 110 mil pedras de crack foram apreendidas. Segundo a pasta, o policiamento é ininterrupto com seis bases fixas e policiais com motocicletas.

    Na sexta (2), uma operação do Denarc prendeu um traficante peruano que guardava 65 kg de cocaína num depósito na região da Luz.

    -

    AÇÕES NA CRACOLÂNDIA

    Jan.2012
    PMs fazem operações nas ruas e desocupam imóveis abandonados que eram usados por usuários, usando bombas de gás. Dependentes que se concentravam na rua Helvétia se dispersam para outras ruas

    15.jan.2014
    Assistentes sociais e funcionários de limpeza da prefeitura retiram usuários e limpam a rua. Segundo a prefeitura, após a ação, 300 pessoas foram cadastradas no programa De Braços Abertos

    29.abr.2015
    Uma operação desarticulada entre prefeitura e governo estadual transforma o centro em praça de guerra, com bombas de gás, barricadas, furtos a pedestres e depredação de ônibus. Dois dias depois, fluxo retorna à quadra ao lado

    5.ago.2016
    Sem conhecimento da prefeitura, as polícias civil e militar realizam uma grande operação com cerca de 500 homens. A Tropa de Choque dispersa usuários com jatos d'água, balas de borracha e bombas de gás, e policiais civis arrombam hotéis da região e prendem 32 suspeitos de tráfico

    Descaminhos da cracolândia

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024