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    Transição Paulistana

    Doria corta salário, mas dará comida e moradia a viciados da cracolândia

    ARTUR RODRIGUES
    DE SÃO PAULO

    EDUARDO SCOLESE
    EDITOR DE "COTIDIANO"

    14/12/2016 02h00

    A equipe do prefeito eleito João Doria (PSDB) decidiu acabar com o pagamento em dinheiro a viciados em crack, mas oferecerá hospedagem e alimentação aos que trabalharem para a prefeitura.

    O pagamento em dinheiro é um dos eixos do programa Braços Abertos, criado pela gestão do prefeito Fernando Haddad (PT) para enfrentar o problema da cracolândia.

    Dependentes que participam do programa recebem R$ 15 ao dia em troca de serviços de varrição nas ruas do centro de São Paulo. Eles têm direito ainda a uma vaga em hotéis pagos pela prefeitura.

    Durante a campanha, Doria prometeu acabar com o Braços Abertos, que preconiza a redução de danos: o dependente deve diminuir o consumo das drogas enquanto aumenta sua autonomia, sem internação, por meio da oferta de emprego e moradia.

    A ideia de Doria seria incluir todos no programa Recomeço, criado em 2013 pela gestão estadual de Geraldo Alckmin (PSDB) e que propõe tratamentos por internação, às vezes involuntárias, e passagens por comunidades terapêuticas.

    Passada a eleição, porém, a equipe tucana passou a admitir a manutenção de parte das ações criadas por Haddad, combinando os dois projetos.

    O pagamento em dinheiro pelo trabalho, por exemplo, será vetado, com o objetivo de impedir a compra de drogas. Uma das possibilidades é que os dependentes recebam comida ou algum tipo de tíquete para fazer as refeições.

    A hospedagem dos atendidos pelo programa, hoje feita principalmente na região central, também terá ajuste.

    O modelo em estudo prevê que os viciados vivam em casas terapêuticas, com direito a alimentação e roupa lavada. Poderiam ainda receber vales para a compra de roupas,

    O local de moradia a partir de 2017 seria mais distante da cracolândia, mudança já iniciada na gestão de Haddad. Outra proposta, também iniciada por Haddad, é diversificar as ofertas de empregos, que hoje enfocam a limpeza de ruas do centro.

    A equipe de Doria quer fazer uma espécie de novo censo com os dependentes e descobrir afinidades para o oferecimento de empregos na própria prefeitura da cidade, como cuidar de um jardim, pintar um prédio ou ajudar no conserto de veículos.

    A avaliação de cada um dos quase mil dependentes que passam o dia na cracolândia também servirá para determinar se esse precisa ou não de internação imediata.

    O psiquiatra e professor da Unifesp Jair Mari concorda com essa combinação das duas políticas públicas. "É possível refletir sobre os dois programas e aproveitar o que de melhor há neles", diz Mari.

    "É muito importante que o paciente possa escolher e avaliar quais alternativas existem e quais acha que poderiam se enquadrar com as necessidades e valores dele", completa.

    Descaminhos da cracolândia

    'CONTRASSENSO'

    Idealizador do Braços Abertos, o psiquiatra e professor da Unifesp Dartiu Xavier afirma ser um "contrassenso" e "fadado ao fracasso" misturar dois programas que pregam visões tão contrárias de tratamento.

    Ele afirma que a proposta do Recomeço, da busca pela total abstinência, é de "baixa eficácia" e perde força em todo o mundo. A questão de distribuir dinheiro ou não aos atendidos, segundo ele, poderia eventualmente ser discutida, mas no caso da proposta da equipe de Doria se trata de uma forma de negar a política de redução de danos.

    "Dentro de redução de danos, ele não vai usar, não porque não tem dinheiro, mas porque optou por não usar. Esse é a grande conquista que a proposta deles está inutilizando", diz o psiquiatra.

    Desafios de Doria

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