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    Massacre em presídios

    No AM, famílias reclamam de falta de informações e relatam morte por PM

    RUBENS VALENTE
    ENVIADO ESPECIAL A MANAUS

    02/01/2017 21h00 - Atualizado às 21h57

    Usando camisetas para ocultar os rostos, quatro familiares de presos do complexo penitenciário de Manaus em que ocorreu a chacina que deixou 56 mortos afirmaram à Folha que um dos detentos foi morto a tiros por policiais após ter se rendido neste domingo (1º).

    Mulheres e parentes de presos também denunciaram a falta de informações sobre a situação de seus filhos, maridos e sobrinhos e por duas vezes tentaram romper o cerco feito por policiais militares em uma estrada de acesso ao presídio. Elas foram rechaçadas com empurrões e spray de pimenta.

    Massacre em Manaus
    Fachada da penitenciária Anísio Jobim, em Manaus

    Segundo os familiares, a morte do detento por policiais foi presenciada "por mais de dez pessoas" em uma via de acesso ao presídio. O detento, identificado pelo apelido de Anjinho e de nome Railson, teria tentado escapar durante a rebelião, mas acabou machucando uma perna e foi socorrido por familiares que também fugiam da confusão. Nesse momento, segundo os depoimentos à Folha, policiais o mataram a tiros.

    "Nós socorremos ele. Todo mundo viu. Ele ergueu as mãos e falou 'perdi, perdi', ele se entregou. Aí os policiais atiraram na cara dele", disse uma mulher que se identificou como Cátia.

    Outra mulher disse ter visto a mesma cena. Ela acrescentou que os policiais estavam encapuzados, mas seriam da Polícia Militar.

    Rubens Valente/Folhapress
    Maria da Conceição Nascimento Monteiro, 53, busca informações sobre seu filho Rodrigo Monteiro, 19, após rebelião e massacre em presídio de Manaus
    Maria da Conceição Monteiro, 53, busca informações sobre seu filho Rodrigo Monteiro, 19, após rebelião

    "Na nossa frente mataram um baleado. Ele se entregou, ele se entregou. Sabe o que fizeram? Mataram foi ele, na nossa frente, deram um tiro na cara dele", disse a mulher.

    Uma terceira mulher disse que após os tiros os policiais mandaram todos se dispersarem. Também teriam impedido a passagem de um veículo da imprensa de Manaus que poderia ter filmado o homem baleado.

    "Tinha um rapaz ferido, na descida da estrada. Ele já tinha se rendido, aí mandaram ele virar de costas e atiraram", disse uma terceira mulher, parente de um preso de 18 anos.

    Edmar Barros/Futura Press/Folhapress
    Parentes aguardam informações na entrada do Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus
    Parentes aguardam informações na entrada do Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus

    Cerca de cem pessoas tentavam chegar ao complexo penitenciário nesta segunda-feira (2), atrás de informações sobre os presos, mas a PM montou, a cerca de 5 km dos presídios, uma barreira que impediu o acesso.

    Nenhum representante do governo do Amazonas foi enviado ao local durante a tarde para manter contato e atualizar as famílias. Algumas mães gritavam em desespero e várias choravam.

    Maria da Conceição Nascimento Monteiro, 53, chorava muito e teve que ser amparada. Ela tentava obter informações sobre um filho, Rodrigo Nascimento Monteiro, 19, preso por tráfico de drogas há seis meses.

    "Eu só quero meu filho. Meu Deus do céu, senhor, dou minha vida pela vida do meu filho", gritava Maria em direção aos PMs da barreira. Ela disse que Rodrigo já estava para ser liberado. "Há três meses ele já podia ter saído, mas a juíza não liberou. Nossa Justiça não faz nada por nós."

    Editoria de arte/Editoria de arte/Folhapress

    "Cadê os direitos humanos? Eles não estão querendo ajudar, estão querendo nos matar. A gente quer notícia [sobre os presos]. Meus Deus, por favor, nos ajuda", disse outra mulher à Folha.

    Eles também abordavam os jornalistas em busca de informações. A PM permitiu que algumas equipes de TV se aproximassem do presídio para gravar imagens. Os jornalistas que saíam do presídio diziam às famílias que a situação nos presídios havia se normalizado por volta das 16h.

    Quando um agente penitenciário deixou o prédio, no mesmo horário, foi cercado por várias mulheres que pediam informações. Ele disse que a rebelião não estava mais em andamento e procurou acalmar as mulheres. "Vai ser dada a informação correta, o pessoal está trabalhando."

    À Folha, ele reconheceu que o governo deveria ter providenciado as informações básicas às famílias –ele pediu para não ter seu nome publicado.

    A assessoria da Polícia Militar, procurada pela Folha, informou que apenas a Secretaria de Segurança Pública, que estava concentrando as informações sobre a chacina, poderia comentar as denúncias dos familiares.

    A Delegacia de Homicídios da Polícia Civil responsável pela investigação das mortes nos presídios informou que a denúncia dos parentes dos detentos ainda não havia sido oficializada até a noite desta segunda-feira.

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