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    Mesmo em época de 'camelos magros', Doria vai buscar investidor no Golfo

    DIOGO BERCITO
    ENVIADO ESPECIAL A ABU DHABI

    14/02/2017 02h00

    Os tempos são de "camelos magros", com o preço do petróleo em uma baixa histórica, e o Golfo hoje avalia seus investimentos com mais ressalvas do que no passado.

    O prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), está portanto diante de um desafio: ele iniciou nesta segunda-feira (13) uma rodada de consultas com bancos e fundos em busca de parceiros para um programa de privatizações. Ele precisará convencer um público que, nos últimos meses, tem se retraído.

    "Há mais cautela desde o início de 2016", disse à Folha Wada Al Taha, analista do CISI, um instituto britânico de títulos e investimentos.

    O preço do petróleo, fonte fundamental de renda na região, caiu de US$ 110 para US$ 50 o barril nos últimos três anos, sacudindo o Golfo.

    Isso não significa que os Emirados tenham deixado de investir, afirma, mas que não têm mais tanto apetite a se arriscar sem a certeza do retorno -e da estabilidade.

    O Brasil do impeachment de Dilma Rousseff e das investigações da Lava Jato é visto como lugar de algum risco político, diz Taha. "É um fator que previne o investimento."

    Há também as más memórias de relacionamentos passados com fins traumáticos.

    O fundo Mubadala, com o qual Doria se reuniu, investiu US$ 2 bilhões na holding de Eike Batista para ver esse império, em seguida, ruir. O grupo recuperou seus aportes assumindo uma série de ativos e agora negocia a compra de 24,4% na Invepar, que administra concessões como a do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo.

    CARRO-CHEFE

    Em Dubai, onde pontos de ônibus são climatizados diante de um verão com sensação acima de 50°C, Doria anunciou que as privatizações e concessões de 29 terminais paulistanos terão exigência de ar-condicionado.

    Disse que os terminais deverão ter creches, unidades do Poupatempo e estabelecimentos comerciais, em espaços vigiados por câmeras. Doria viajou de Dubai a Abu Dhabi, rota de 1h30 por estradas poeirentas, com um portfólio embaixo do braço. Reuniu-se com dois fundos de investimento, um banco e a Câmara de Comércio local.

    O prefeito mostrou imagens e estatísticas dos lotes abertos a parcerias, cujos carros-chefe são o Anhembi e o autódromo de Interlagos. O prefeito disse ter recebido bons sinais durante suas reuniões em Abu Dhabi. De um banco, por exemplo, Doria afirma ter escutado "o testemunho de que o Brasil vem reconquistando a confiança dos investidores". "Esses bancos têm analistas que olham com lupa para países em desenvolvimento."

    O interesse do banco FGB seria tão grande que seus representantes, segundo Doria, pediram informações sobre todas as 55 oportunidades de privatização mapeadas pelo tucano em São Paulo. O prefeito reuniu-se com o Mubadala, que havia investido em Eike Batista, e também com outros bancos e fundos já com alguma experiência ou interesse no Brasil.

    O grupo Adia, por exemplo, está envolvido no hotel Four Seasons que deve abrir neste ano na av. das Nações Unidas. Foi a reunião mais longa de Doria nesta segunda. Os ativos do Adia são estimados em US$ 800 bilhões. "É um dos mais cobiçados do mundo", disse o prefeito.

    O grupo sugeriu a São Paulo que crie um tipo de fundo público para a administração municipal, proposta que será estudada. Os Emirados são conhecidos por seus fundos soberanos, que fazem a gestão de reservas vindas do petróleo. É o caso do próprio Adia.

    "Eles disseram que o Brasil tem estabilidade política e criticaram as ações dos governos populistas, que afastaram os investidores."

    Doria viajou aos Emirados Árabes a convite do World Government Summit, fórum de gestão pública em que discursará na terça (14). Ele segue no dia seguinte a Doha, em viagem paga pelo governo do Qatar. Questionado pela Folha, o prefeito disse não haver conflito de interesses.

    INTERLAGOS

    Doria dirigiu um carro de corrida modelo Aston Martin GT4 e se aproximou de 210 km/h no autódromo de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, durante visita à região do Golfo.

    A passagem de Doria pelo autódromo visava conhecer o modelo de gestão da pista, ao qual ele se referiu durante sua campanha como exemplo para a privatização de Interlagos.

    Mas o prefeito deparou-se, no Golfo, com um esquema distinto: o autódromo de Abu Dhabi é um investimento do governo e tem apenas a gestão privada. Doria defende que Interlagos seja completamente privatizado.

    O prefeito argumentou que o contexto paulistano pede por solução específica. "Há características distintas. Há quase um dono do país", disse, referindo-se ao xeque Khalifa bin Zayed Al Nahyan, emir de Abu Dhabi e chefe de Estado dos Emirados Árabes.

    A família real é a responsável pelos fundos do empreendimento. A inspiração para SP seria outra: "seguir os modelos de eficiência do autódromo, que é cobrado pelo governo para que o investimento seja rentável", disse Doria. O prefeito reuniu-se com Al Tareq Al Ameri, CEO do autódromo de Abu Dhabi, e disse que buscaria "tropicalizar" a experiência.

    Ameri disse que, quando o projeto foi aberto, em 2009, um desafio foi lidar com a população sem costume de acompanhar corridas. O autódromo se cercou de outros empreendimentos (hotéis, parque de diversões, restaurantes), além de receber shows, workshops e de ser aberto duas vezes por semana para uso particular.

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