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    Alalaô

    O Carnaval resiste e, neste ano, a folia venceu a patrulha

    MARILIZ PEREIRA JORGE
    NO RIO

    28/02/2017 02h00

    Só há uma coisa tão bonita, poderosa e simbólica no Carnaval quanto a ala das passistas das escolas de samba, a bateria.

    E o Carnaval poderia ser feito apenas desses dois elementos que tanto se completam e que fazem o samba ganhar vida e pulsar de forma tão contagiante e sedutora.

    Com 11 ou 12 anos eu passava horas em frente ao espelho, tentando domar as pernas desengonçadas e dar algum molejo ao quadril. Colocava bobes no cabelo mirrado, entupia de laquê, queria ser uma daquelas deusas seminuas. Queria o corpo escultural, a fortaleza das ancas, o gingado enlouquecedor e o sorriso contagiante. Depois de muito tempo, entendi que ou (muito mal) sambo ou sorrio. Resignei-me a aplaudir.

    Quando vestiram a Globeleza, pensei ser o fim do reinado absoluto das rainhas da festa. As passistas sucumbiriam à patrulha, às regras (dos outros), deixariam de ser donas de seus corpos, de suas ancas, de sua nudez. Tão logo proibirão o rebolado. Não pode.

    Mas elas estavam lá, na avenida, vibrantes, pulsando em carne, exuberância e sorrisos, fazendo o coração da bateria ecoar ainda mais forte, dando fôlego à festa, sambando na cara da sociedade.

    Aplaudi sem culpa. E nos dias que se seguiram, pulei Carnaval com cocar de índio, cantei "olha a cabeleira do Zezé", e acordei com tanta purpurina em meus lençóis que, se tocasse uma marchinha, sairia um bloco debaixo da cama. O Carnaval resiste.

    Este ano, a folia venceu a patrulha. Mas, do jeito que a coisa anda, um dia passistas, marchinhas, purpurina e o próprio Carnaval estarão apenas em nossa lembrança. Espero já ter morrido.

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