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    Bairro de chacina em SP convive com mortes em série e tráfico até em escola

    MARIANA ZYLBERKAN
    DE SÃO PAULO

    07/04/2017 02h00

    No distrito do Jaçanã, na zona norte de SP, o tráfico de drogas ocorre até mesmo dentro de uma escola estadual.

    Parte do muro que separa os fundos da escola Professora Eunice Terezinha de Oliveira Frágoas da Favela do Fofão é rotineiramente derrubada por criminosos. O fluxo a partir desse buraco na parede inclui traficantes que oferecem drogas aos alunos pelas janelas das salas de aula. Para dificultar essa ação, a escola teve de instalar placas de metal diante de vidros e grades.

    A quadra esportiva do colégio também foi tomada pelos bandidos, que permitem sua utilização pelos alunos só em determinados horários. À noite, o local é usado para reuniões regadas a drogas e álcool, segundo funcionários que pediram para não se identificar.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Nesta quarta (6), quando a Folha esteve no local, policiais encontraram um carro roubado no pátio da escola.

    Nos últimos meses, o distrito ganhou a triste fama de o bairro das chacinas da cidade. A registrada na última terça (4), com um saldo de seis mortos, foi a terceira em menos de quatro meses.

    Todos estavam em um bar para comemorar com um churrasco o aniversário de um morador do bairro. "Meu sobrinho tinha acabado de chegar do trabalho e ido comemorar o aniversário do amigo", diz a auxiliar de dentista Fátima Aguiar, 50, tia de criação de Wellington de Souza, 35, o Neguinho, um dos mortos.

    O clima tenso no bairro chegou ao ápice na noite seguinte às mortes, quando correram boatos de que o crime organizado havia imposto toque de recolher após as 22h.

    Comerciantes fecharam as portas mais cedo, alunos de uma faculdade foram dispensados e moradores relataram ter recebido mensagens via aplicativo de celular com ameaças de que a delegacia seria incendiada. Por precaução, os policiais afastaram os veículos da corporação que estavam estacionados próximo da calçada.

    Região tem taxa de homicídios 77% maior que a cidade de SP

    CASAS VAZIAS

    O clima de insegurança é geral. No Jardim Guapira, uma das áreas mais nobres, para reduzir os casos de assaltos a residências moradores se reuniram para instalar câmeras pelas ruas, enquanto seguranças particulares fazem rondas de moto. Muitas das casas estão vazias e com placas de "vende-se" e "aluga-se".

    "Tenho muito medo, fui proibida pela minha família de passear na rua com meu neto", diz a dona de casa Vilma dos Santos, 62, moradora da região há dez anos.

    Os fundos de sua casa dão para um terreno alvo de ocupação onde antes era uma praça. Ela diz que já teve a casa invadida há dois anos, quando reforçou a segurança com cerca elétrica, grades nas janelas e câmeras de segurança. "Já instalei três vezes a tubulação de esgoto porque os canos foram roubados."

    Moradores atribuem a escalada de violência no bairro ao aumento das ocupações de terrenos da região. Elas se proliferaram nos últimos anos, inclusive com a atuação de facções criminosas. A mais recente, em um terreno de preservação ambiental na rodovia Fernão Dias, teve início há cerca de dois meses e já reúne mais de cem barracos.

    Há indícios de envolvimento do crime organizado com os líderes responsáveis por lotear alguns dos terrenos.

    A alguns quilômetros dali, centenas de famílias vivem em uma área federal pertencente à hidrelétrica de Furnas –casas de alvenaria foram construídas rentes às torres de transmissão de energia.

    Segundo o delegado José Roberto Toledo Rodrigues, titular do distrito policial local, há mais de dez pontos de venda de drogas no bairro. Entre janeiro e fevereiro, ele diz ter feito 27 prisões em flagrante.

    "A produtividade é alta, já que temos apenas oito policiais civis na ativa", diz.

    Ele afirma que o crime mais recorrente no bairro são os roubos de celulares por dependentes químicos para serem trocados por drogas.

    O distrito de Jaçanã registrou em 2016 taxa de 14 vítimas de homicídios para cada 100 mil habitantes, índice 77% acima do registrado na capital no mesmo período, quando ficou em 7,9.

    OUTRO LADO

    A Secretaria Estadual de Educação informou que a escola estadual citada teve o muro reerguido por três vezes nos últimos seis meses e que o portão de entrada foi furtado duas vezes. De acordo com a pasta, uma empresa foi contratada para fazer a reconstrução em obra orçada em R$ 44,8 mil, mas não informou o prazo previsto para início e término da melhoria.

    Já a Secretaria da Segurança Pública afirmou que prendeu no bairro 166 pessoas entre janeiro e fevereiro. Em relação à denúncia de tráfico de drogas nas áreas próximas à escola, a Polícia Civil informa que mapeia a ação desses criminosos e que registrou 25 ocorrências de tráfico no local desde o começo do ano.

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