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    Vou construir de novo, diz morador de rua que montou 'casa' sob o Minhocão

    EDUARDO ANIZELLI
    ARTUR RODRIGUES
    DE SÃO PAULO

    25/04/2017 02h00

    Eduardo Anizelli/Folhapress
    Morador de rua Vlademir Delvechio, 33, sob o Minhocão após ter suas coisas recolhidas pela prefeitura
    Morador de rua Vlademir Delvechio, 33, sob o Minhocão após ter suas coisas recolhidas pela prefeitura

    Wlademir Delvechio, 33, saiu e quando voltou, no começo da tarde desta segunda-feira (24), sua casa não estava mais lá.

    Os móveis e pertences que formavam uma espécie de sala de estar debaixo do Elevado Presidente João Goulart (Minhocão), no centro de SP, já haviam sido empilhados em um caminhão da Prefeitura Regional da Sé.

    Conforme noticiou a Folha no sábado (22), há três meses o morador de rua começou a montar o cômodo com objetos que recolheu no lixo. O local tinha sofá, tapete, armários e quadros.

    "Estava começando a ficar famoso, acho que não gostaram. Mas vamos dar dor de cabeça para essa galera. Vou montar tudo de novo, até arrumarem nossa vida", disse.

    Ele afirmou já ter começado a receber doações para reconstruir a moradia a céu aberto. Na tarde de segunda, já tinha um colchão.

    "Acho que deveriam ajudar primeiro, para depois tirar as coisas", disse. "Dá a maior tristeza. Lutei para ter minhas coisinhas."

    Vlademir Delveccio nos dias 20 e 24 de abril, antes e depois de ter suas coisas levadas pela prefeitura
    Eduardo Anizelli/Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 20-04-2017, 23h30: Retrato de Vlademir Delveccio, 33, que mora na rua e fez sua casa na parte de baixo do minhocao, no centro de Sao Paulo. (Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress, COTIDIANO) ***EXCLUSIVO***
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 20-04-2017, 23h30: Retrato de Vlademir Delveccio, 33, que mora na rua e fez sua casa na parte de baixo do minhocao, no centro de Sao Paulo. (Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress, COTIDIANO) *EXCLUSIVO*

    Não foi o único que teve pertences recolhidos. "Também levaram meu colchão. Vou ter que dormir no chão frio", disse Breno Brito, 23.

    No sábado, os moradores de rua da área receberam a visita da primeira-dama, Bia Doria, e do secretário de Assistência e Desenvolvimento Social, Filipe Sabará.

    Delvechio afirma ter recebido deles oferta de encaminhamento para um albergue e emprego. "Eles disseram que estavam reformando, mas já vivi em albergue e é pior que a cracolândia."

    Já a possibilidade de conseguir trabalho interessou. "Mas só acredito vendo."

    Há três anos, ele foi parar na rua por causa do crack. Quando conversou com a reportagem na semana passada, estava sem fumar há duas ou três semanas, mas acabou tendo uma recaída.

    A reportagem presenciou quando evangélicos, que viram uma reportagem sobre Delvechio, tentaram levá-lo a um centro de reabilitação.

    "Já vivi na rua, já fui internado 22 vezes", disse o evangelista Robson Carvalho, 44, mostrando no celular fotos de antes e depois de viciados que passaram por tratamento.

    Delvechio se recusou a ir, justificando ter passado por vários tratamentos. Os evangélicos prometeram voltar.

    A dona de casa Simone Camargo, 44, que mora perto do local, abordou a reportagem para questionar sobre o futuro dos moradores de rua. "Já que tirou as coisas dele, tem que dar uma assistência. E agora, o que o prefeito João Doria (PSDB) vai fazer?"

    A prefeitura afirma que seguiu a lei, acionando equipes de assistentes sociais com antecedência. "O morador em situação de rua não estava no local, e a regional procedeu a limpeza como de rotina, retirando os objetos que ocupavam o espaço público", afirma a gestão. O comunicado diz ainda que os pertences estão no depósito da Prefeitura Regional da Sé, sendo possível a retirada por Delvechio.

    Novo decreto de Doria, de janeiro, suprimiu itens de norma anterior, de Haddad, e passou a liberar na prática a retirada completa das favelinhas da cidade. A regra da gestão anterior proibia a apreensão de "papelões, colchões, colchonetes, cobertores, mantas, travesseiros, lençóis e barracas desmontáveis" de moradores de rua. Agora essa retirada passou a ser permitida.

    Moradores de rua que presenciaram a ação sob o Minhocão afirmam não ter recebido assistência social ou informações sobre o paradeiro dos pertences.

    A nota diz que o secretário Sabará ofereceu trabalho a Delvechio no programa Trabalho Novo, pelo qual a prefeitura encaminha moradores de rua para empregos na iniciativa privada. "O morador demonstrou interesse. Entretanto, não retornou mais à região no decorrer do dia."

    A prefeitura diz que são feitas ações diariamente no local e, se Delvechio for localizado, será feito encaminhamento dele para o programa.

    Morador de rua improvisa casa no Minhocão

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