• Cotidiano

    Thursday, 02-May-2024 05:19:16 -03

    Rajada em megarroubo manteve casal paraguaio três horas debaixo da cama

    LEANDRO MACHADO
    EDUARDO ANIZELLI
    ENVIADOS ESPECIAIS A CIUDAD DEL ESTE (PARAGUAI)

    26/04/2017 02h00

    Mais um domingo acabava tranquilo para o empresário paraguaio Alejandro Anisimoff, 74. Deitado, ele assistia à televisão com a mulher, Angelina, 62. O sono já estava quase chegando, mas foi interrompido por uma rajada de tiros. Dessa vez, as balas não vinham da TV.

    O bairro Defensores Del Chaco, em Ciudad Del Este (fronteira com o Brasil), sofria um ataque de bandidos. O alvo estava bem à frente da casa de Alejandro, do outro lado da rua estreita: a empresa de valores Prosegur. "Foi uma guerra de três horas", conta.

    Ao final, estima-se que R$ 120 milhões foram roubados no episódio já conhecido como o maior assalto da história do Paraguai. A polícia desconfia principalmente de brasileiros ligados à facção criminosa paulista PCC.

    Quando começou o tiroteio, Alejandro percebeu que atiradores estavam em seu telhado. Ele e sua mulher, Angelina, esconderam-se embaixo da cama. Ficaram nessa posição por três horas. Do outro lado da rua, apenas três vigilantes armados faziam a segurança da empresa. Eles atiravam de volta, tentando inutilmente rechaçar o ataque.

    Segundo Abel Cañete, comissário da polícia paraguaia, o bando utilizou metralhadoras e fuzis que as polícias do Paraguai e do Brasil não dispõem. "Com esse armamento, era impossível um confronto", diz. Até havia um policial na rua no momento da ação, mas ele foi assassinado.

    Para as polícias brasileira e paraguaia, o ataque vinha sendo preparado há ao menos um mês. Foi quando um grupo de brasileiros passou a morar em um sobrado de luxo na pacata rua Manday, bairro de San José, a 2 km da Prosegur e da casa de Alejandro.

    O sobrado tem cinco quartos, sala, cozinha, ampla garagem, sala de jogos e de churrasco –ambientes equipados com ar-condicionado.

    "Havia umas dez pessoas na casa, todas brasileiras. Entravam com carros e motos. Uma vez até falei com um deles, que me respondeu: 'Sou seu novo vizinho'", disse o morador do lado, que preferiu não se identificar.

    A polícia não sabe ainda se a casa foi alugada ou comprada pelos bandidos. No local, foram encontrados cartuchos de munições, equipamentos para furar pneus e coletes salva-vidas (parte dos bandidos conseguiu fugir pelo rio). Peritos estão colhendo material biológico, como DNA e impressões digitais, para confrontar com os dos presos.

    No portão, a reportagem encontrou uma conta de luz de janeiro no valor de R$ 400, em nome de um paraguaio.

    Fabiano Bordignon, delegado da Polícia Federal brasileira, cita três pontos que sustentam a tese de que o PCC está envolvido no assalto:

    1) a facção tem homens na região da fronteira, trabalhando no tráfico de drogas; 2) assaltos parecidos que ocorreram no Brasil tinham participação do grupo; 3) alguns dos homens presos sob suspeita pelo roubo são oriundos de São Paulo.

    As polícias também investigam a participação de paraguaios e de funcionários da empresa Prosegur.

    "As semelhanças com outros roubos, inclusive no Estado de São Paulo, nos fazem acreditar que a ação foi organizada pelo PCC. Esse tipo de crime não é para amadores", disse Bordignon.

    A Prosegur informa que "o valor subtraído ainda está sendo calculado" e que sua ação e seus aparatos de segurança "permitiram suportar um ataque por mais de duas horas e limitaram a ação".

    Rotas de fuga

    BARRICADAS

    No dia do assalto, parte dos assaltantes partiu do sobrado. No caminho, encontraram outros. Ao todo, a polícia estima que 30 participaram da ação. Carros e caminhões foram incendiados em ruas e avenidas para que policiais não pudessem chegar perto da empresa.

    Debaixo da cama, Alejandro tentou ligar para a polícia paraguaia, mas os agentes não conseguiram se aproximar. "Minha filha, que mora aqui perto, ligou para a polícia brasileira para pedir ajuda, mas eles também não tinham como chegar porque o caminho estava bloqueado", conta Angelina.

    Na rua, o tiroteio continuava: os bandidos tentavam entrar à força na empresa. Para isso, explodiram as paredes do prédio. "Escutei seis explosões. Para mim, foi um ruído de bomba atômica", conta Alejandro. Vizinhos contam que as explosões foram ouvidas a 5 km de distância.

    O impacto destruiu a casa de Alejandro: todas as janelas se estilhaçaram, um portão de ferro está retorcido, um telhado caiu, as paredes racharam e parte do teto corre risco de desabar. O casal agora está morando com os filhos.

    No domingo, os dois só saíram de casa quando os tiros e bombas cessaram e uma de suas três filhas gritou por eles. Ela não mora no bairro, mas chegou antes da polícia.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024