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    Investidor suspeito de desviar R$ 2,5 mi circulava na alta sociedade de SP

    VICENTE VILARDAGA
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    15/07/2017 02h00

    Bruno Santos/ Folhapress
    Edifício de alto padrão na zona sul de SP, onde mora o investidor suspeito de estelionato
    Edifício de alto padrão na zona sul de SP, onde mora o investidor suspeito de estelionato

    Iso Weinfeld, 62, tinha uma vida de príncipe. Educado e bem vestido, usava ternos Prada ou Ermenegildo Zegna, sapatos Salvatore Ferragamo e carregava sempre no paletó dois iPhones de última geração. Dirigia carros como o Land Rover Discovery ou o Pajero Full, que custam de R$ 200 mil a R$ 300 mil, modelos em geral blindados, e não repetia roupas.

    É tido com um homem distinto, de trato delicado. Circulava pela alta sociedade com desenvoltura e tinha entrada livre na comunidade judaica, da qual sua família é oriunda. No seu cartão de apresentação constava o cargo de Financial Fund Manager, Gerente de Fundos de Investimentos, em português.

    De acordo com um processo civil iniciado em 2015, uma ação criminal aberta pelo Ministério Público em junho deste ano e duas investigações em curso, as coisas não iam tão bem assim.

    Iso é suspeito de montar um esquema de pirâmide que desmoronou à medida em que parou de remunerar os investidores, um grupo de ao menos 12 pessoas, incluindo empresários e um jornalista. A Promotoria diz que Iso desviou cerca de R$ 2,5 milhões. Para os credores, o valor pode ultrapassar R$ 20 milhões.

    Reprodução
    Iso Weinfeld, 62, suspeito de operar esquema de pirâmide
    Iso Weinfeld, 62, suspeito de operar esquema de pirâmide

    Ele foi preso preventivamente em 6 de julho, quando chegava em seu escritório na avenida Francisco Matarazzo, zona oeste de São Paulo, dirigindo um Mercedes SL 500.

    O golpe da pirâmide se caracteriza por ser insustentável. As pessoas são recrutadas sucessivamente e financiam os ganhos das anteriores até o ponto em que o modelo entra em colapso e o desvio do dinheiro fica caracterizado.

    A mulher de Iso, Raquel Machado Pires, que segundo testemunhas se apresentava como alta executiva e especialista em finanças do banco Itaú BBA, também é acusada. Os depósitos dos investimentos dos clientes seriam feitos nas contas pessoais dela.

    As coisas começaram a se complicar para Iso a partir de uma ação civil movida por um cliente, da comunidade judaica, em 2015. Além de ressarcimento, a ação pedia também indenização por danos morais. Iso foi condenado. Somados os juros e os honorários de advogados, a dívida é de cerca de R$ 400 mil.

    RENDA FIXA

    O principal produto financeiro que Iso oferecia era um Fundo de Investimentos de Direitos Creditórios (FIDC), lastreado em ações de grandes laboratórios farmacêuticos. Ele garantia uma renda fixa que variava de 2,0% a 2,5% ao mês, e que, nos últimos tempos, chegava a até 3%.

    Embora não sejam impossíveis em uma carteira de renda variável, taxas assim são improváveis, principalmente se forem prometidas para se sustentar a médio e longo prazo. Segundo especialistas, aplicando em títulos do governo, lastreados na taxa de juro atual, um investidor pode ter retorno de 1% ao mês, o que é considerado excelente.

    Com a divulgação em alguns círculos sociais da ação civil, começaram a aparecer outras supostas vítimas. Três delas, que não pertenciam à comunidade judaica, procuraram o advogado criminalista Jonathan Raicher. A dívida com eles giraria em torno de R$ 5 milhões, diz o advogado.

    "A sequência de golpes caracterizava estelionato, mostrava que ele não era um simples devedor e, por isso, os novos casos foram levados para a esfera criminal", afirma Raicher. "Ele era um sedutor, que falsificava documentos e conquistava a intimidade de suas vítimas para tirar-lhes o dinheiro."

    O empresário João Batista de Oliveria Neves é um dos reclamantes. Ex-proprietário da loja de utensílios de cozinha Suxxar, eles se encontraram por acaso em um supermercado há oito anos. Na ocasião, Batista foi convencido a deixar suas economias sob a administração de Iso.

    O empresário também o aproximou de oito amigos, com quem se reunia todas as semanas em sua casa no Alto de Pinheiros, zona oeste de SP. Vendo perspectivas de ganhos vantajosos, todos toparam participar do tal fundo.

    Durante cinco anos, os dividendos entravam em dia e Iso passou a frequentar os encontros. Mas, de 2015 para cá, a situação começou a mudar."Descobrimos que o Iso era um psicopata, um estelionatário", diz Batista, que calcula ter perdido R$ 2 milhões. "E eu me julgo responsável por ter avalizado esse bandido para os meus amigos."

    REINCIDÊNCIA

    Inicialmente preso no 91º Distrito Policial, Iso apresentou um diploma de arquiteto que lhe garantiu prisão especial. Depois, foi transferido para uma cela em um Centro de Detenção Provisória (CDP) em São Paulo.

    A prisão preventiva foi decretada com base em dois motivos, segundo a denúncia do Ministério Público: Iso pressionou uma das vítimas a mudar sua versão dos fatos –o que lhe rendeu uma acusação de tentativa de coação– e na necessidade de garantia da ordem pública. A Promotoria constatou que ele reincidia na prática de crimes financeiros.

    Pelos crimes atuais dos quais é acusado, Iso pode pegar até 15 anos de prisão.

    Há duas semanas, porém, foi feito um novo boletim de ocorrência contra ele, dessa vez por fraude cambial. Iso é suspeito de ter intermediado um negócio com comerciantes chineses para a compra de uma turbina eólica de US$ 3,5 milhões.

    Tomou adiantado US$ 680 mil do comprador brasileiro, argumentando conseguir um câmbio favorável, mas não pagou o adiantamento para o fornecedor da China.

    OUTRO LADO

    Aristides Zacarelli Neto, advogado contratado por Iso Weinfeld na segunda (10), diz que desconhece a ação civil contra seu cliente e que só cuida do processo penal.

    Mas, segundo ele, as ações que Iso está sofrendo não correspondem aos fatos e sua inocência será comprovada. "Não há qualquer motivo para meu cliente ficar segregado, já que ele não oferece nenhum perigo", afirma.

    O advogado nega que Iso tenha recebido dinheiro para aplicar em fundo de investimento e que o que ocorreu, na verdade, foram empréstimos.

    "Parece que várias vítimas declararam os valores entregues para Iso como doação ou empréstimo, ou seja, usaram um ardil para encobrir ganhos financeiros", diz. "Fazer empréstimos é algo lícito, mas cobrar altos juros e não declará-los é usura, agiotagem". Segundo Zacarelli, Iso pagava juros e não dividendos.

    Nesta sexta (14), o desembargador Ivo de Almeida, da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, indeferiu um habeas corpus para a libertação de Iso.

    Quanto à tentativa de coação, ele diz que não faz sentido. "Essa suposta coação foi há sete meses e a prisão foi decretada há uma semana. Prendê-lo por causa disso é uma medida extemporânea."

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