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    Justiça manda interditar prédio histórico próximo à estação da Luz

    PAULO GOMES
    RAUL JUSTE LORES
    DE SÃO PAULO

    20/07/2017 08h09 - Atualizado às 20h29

    Reprodução/Google Street View
    Prédio histórico na Luz, centro de São Paulo, cuja interdição foi determinada pela Justiça nesta quarta

    A Justiça Federal ordenou a interdição de um hotel que funciona em prédio histórico na região da Luz, no centro de São Paulo. O pedido foi feito em março pelo Ministério Público Federal (MPF) devido ao risco de incêndio no edifício.

    Localizado na esquina da rua Mauá com a avenida Cásper Líbero, em frente à estação de trem da Luz, o prédio foi inaugurado em 1903. O imóvel, que abriga comércios no nível da rua, além do hotel nos dois andares, é tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional) desde 2010 e pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental) desde 2016.

    O MPF exige dos proprietários reparos no edifício desde 2011, com base em laudos do Iphan de 2008 e 2011 que apontavam o estado de degradação do edifício. Em maio, relatório de nova vistoria reforçou o risco no local, que não conta com um sistema de prevenção, além de improvisos no sistema elétrico.

    Em audiência de conciliação na quarta-feira (19), os donos do imóvel alegaram não ter encontrado a planta do hotel nos órgãos públicos, necessária para fazer os reparos. Alegando questão de segurança, o procurador da República Matheus Baraldi Magnani pediu então a interdição do local, determinada pela juíza Leila Paiva Morrison, da 10ª Vara Federal Cível.

    Comerciantes e moradores deverão deixar o local até o fim desta sexta-feira (21), a fim de evitar uma "tragédia anunciada", conforme Magnani. Para Morrison, "a possibilidade de incêndio poderá conduzir a danos irreparáveis e inimagináveis". Em dezembro de 2015, um incêndio atingiu o Museu da Língua Portuguesa, que fica no complexo da estação da Luz, em frente ao prédio. O complexo não tinha aval do Corpo de Bombeiros para funcionamento. Um bombeiro civil morreu no episódio.

    Os proprietários deverão apresentar os planos para a regularização do imóvel, como um plano para evitar incêndios, que deverá ser enviado ao Corpo de Bombeiros e aos três órgãos de preservação do patrimônio histórico: Iphan (nacional), Condephaat (estadual) e Conpresp (municipal).

    O presidente do Condephaat, o arquiteto Carlos Augusto Faggin, disse à Folha que há uma cláusula do tombamento como alternativa para o proprietário que não tiver recursos. "Se comprovar que não tem recursos, o Ministério Público pode determinar que órgãos de preservação se responsabilizem."

    Segundo o Iphan, foi assinado um termo há cerca de cinco anos entre os proprietários e o MPF em que os donos assumem o compromisso de executar obras de restauro e segurança, o que não foi cumprido. O órgão informa ainda que o tombamento não se restringe à fachada, mas ao edifício como um todo.

    TOMBAMENTO

    O prédio é um exemplar característico das casas e hospedagens que surgiram ao redor da estação da Luz no início do século 20. Devido à estação ferroviária, a região teve muita valorização na época. Projetado pelo escritório do arquiteto Ramos de Azevedo –responsável pelo Theatro Municipal e pela Pinacoteca– e inaugurado em 1903, o edifício tem estilo eclético, e mistura o neoclássico e o neocolonial, então em voga.

    Faggin afirmou que o prédio está em condições "deploráveis". Para o arquiteto, o tombamento de certa forma força a conservação, o que leva alguns proprietários a "largarem mão" até que o poder público intervenha, para se eximirem do restauro. No caso do prédio do Hotel Queluz, Faggin entende que o investimento não oferece retorno, por ser uma região degradada da cidade –a cracolândia, por exemplo, fica a 700 metros.

    "Em outros lugares, do lado de estação de metrô, haveria uma valorização rápida", diz. Para ele, deve haver uma discussão sobre casos de tombamento em que o proprietário não tem recursos para a manutenção o não quer investir em restauro por não ver retorno.

    Ele cita como exemplos países como Portugal, em que imóveis tombados que estão há cinco anos sem manutenção podem ser desapropriados pelo governo. "Aqui se tomba, mas se deixa apodrecer. Seria bom que se discutissem novos usos. A habitação popular pode ser uma saída", afirma.

    Ainda assim, ele defende a manutenção das características originais do imóvel. "Se esse prédio desmorona, ninguém sai ganhando. Todo mundo perde", diz, explicando que novos prédios no local implicariam em perda da área total, já que não há recuo e o pé direito é alto.

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