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    Alemanha escolhe museu para receber avião sequestrado que está no Brasil

    DHIEGO MAIA
    DE SÃO PAULO

    31/07/2017 12h14

    O avião que entrou para a história da Alemanha como símbolo de resistência contra o terrorismo já tem um lugar definido assim que deixar o Brasil.

    A aeronave, conhecida como "Landshut", ficará exposta no Museu Aeroespacial de Friedrichshafen, disse à Folha Sigmar Gabriel, atual ministro das Relações Exteriores do governo de Angela Merkel, em entrevista por e-mail. Hoje, ela repousa numa espécie de "cemitério para aviões" no Aeroporto Internacional Pinto Martins, em Fortaleza, no Ceará.

    O Boeing 737-200, que fazia parte da frota da Lufthansa, foi sequestrado em 1977 com 91 pessoas a bordo por membros do grupo terrorista de extrema esquerda RAF (Fração do Exército Vermelho). A ação durou cinco dias e terminou com a morte de piloto e mais três sequestradores e deixou o mundo em choque.

    "Para muitos alemães e também para mim, o 'Landshut' é o símbolo do 'outono alemão' há 40 anos, quando na época a ainda jovem República Federal se opôs ao terrorismo da RAF. O Landshut mostrou que nossa democracia e nossa sociedade são capazes de se defender", afirmou Gabriel.

    Após o ato terrorista, o Boeing ficou sob a posse da Lufthansa até 1985. Depois disso, ganhou vários donos. Pertenceu à americana Presidential Airways. Passou depois pelas mãos de outras seis companhias, de Honduras à Indonésia, até ser vendido pela Transmile Air Services, da Malásia, para a brasileira TAF, em 2002.

    Paulo Wagner/AFP
    *** FOTO ALTA*** The former Lufthansa machine "Landshut" is parked and unfunctioning at the the airport in Fortaleza, Brazil, 31 January 2017. She was last used as a transport machine for the Brazilian airline TAF. Photo: Paulo Wagner/ TMA Fortaleza/ DPA ORG XMIT: 99-284004 ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Aposentado, avião fica no 'cemitério' do aeroporto de Fortaleza

    Ao longo dos últimos 40 anos, o governo alemão desconhecia seu paradeiro. "Quando descobrimos onde ele estava, ficou muito claro para mim que esse avião não pertencia à prensa de sucata, mas à Alemanha", disse o ministro.

    As negociações começaram em 2014 e demandaram esforços das autoridades dos dois países envolvidos, contou. "O retorno de um avião incapaz de voar, na verdade, de um avião sucateado, não ocorre do dia para a noite. Inicialmente foi preciso esclarecer a questão da propriedade, depois o compramos ao preço de sucata."

    Um acordo judicial foi assinado em 24 de maio entre o governo alemão, a Infraero (estatal brasileira que administra aeroportos) e a empresa TAF Linhas Aéreas, última proprietária da aeronave, que cedeu ao governo alemão a posse da aeronave. A Alemanha topou pagar R$ 75.936 à Infraero, valor referente ao que estatal cobrava da TAF pelo custo da permanência do avião no aeroporto

    Ainda não sabe quando a sucata desembarcará em solo alemão. Apesar de intacta, a aeronave não tem mais condições de voo e será desmontada com ajuda da Lufthansa, segundo o ministro, para seguir viagem até a sua terra de origem. A previsão do governo Merkel é que a estrutura já esteja no país antes de 13 de outubro, dia em que o sequestro completará 40 anos.

    Para Ariston Pessoa Filho, proprietário da TAF, o governo alemão não receberá uma sucata. Em entrevista à Folha, o representante da empresa afirmou que o avião será devolvido com todos os assentos e equipamentos desde quando ela parou de operar, em 2009.

    O empresário explicou ainda que não sabia que o avião, adquirido pelo pai dele em 2002, havia sido alvo do sequestro que parou o mundo em 1977. O Boeing despertou o interesse da empresa porque era um curinga: funcionava tanto para o transporte de passageiros como para o de cargas. "Eu só soube uns três anos atrás, quando pela primeira vez alguém da Embaixada da Alemanha nos procurou", contou Pessoa.

    Fundada em 1957, a TAF se especializou em transporte de cargas, mas hoje está inativa. O acordo de transferência da sucata se arrastou por alguns anos desde o primeiro contato do governo alemão porque, mesmo parada, ela era usada pela TAF como garantia financeira a processos em que é ré.

    Para Sigmar Gabriel, o Landshut (batizado em homenagem a uma cidade bávara) será restaurado antes de ser exposto no Museu Aeroespacial do país. "Agora estamos concretamente trabalhando para que ele seja transportada o mais rápido possível para casa", disse.

    Heinz Wieseler - 18.out.1977/AFP
    *** ALTA*** Some of the liberated hostages, partly covered with sheets, leave the Lufthansa aircraft "Cologne" in Frankfurt am Main on the 18th of October in 1977 in Frankfurt am Main. The Lufthansa aircraft "Landshut" with more than 80 travellers on board was hijacked by four terrorists five days ago during the flight from Mallorca to Frankfurt. After an odyssee via Rome, Cyprus, Dubai and Aden, the hostages were liberated by the German elite unit GSG-9 in Mogadishu/Somalia. PHOTO HEINZ WIESELER / DPA / AFP ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Reféns chegam a Frankfurt após terem sido libertados em Mogadício, na Somália

    SEQUESTRO

    Em 13 de outubro de 1977, o Boeing 737-200 da Lufthansa foi sequestrado em Palma de Mallorca, na Espanha, pouco depois de iniciar a rota planejada até Frankfurt (Alemanha) com 86 passageiros e cinco tripulantes a bordo.

    A ação aconteceu em meio ao "outono alemão", período marcado pela intensificação dos crimes cometidos pelo grupo terrorista de extrema esquerda RAF (Fração do Exército Vermelho), em apoio às ações na Alemanha do grupo Baader-Meinhof.

    Os terroristas exigiam a libertação de presos ligados aos palestinos e aos alemães e o pagamento de US$ 15 milhões. Por cinco dias, o avião passou por cinco países diferentes, sempre pousando para reabastecer, até descer em Mogadíscio, capital da Somália, onde um grupo da elite da polícia alemã conseguiu invadir a aeronave.

    Três dos quatro terroristas morreram na ação —o piloto do avião, Jürgen Schumann, havia sido morto com um tiro horas antes. Os demais tripulantes e passageiros saíram ilesos.

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