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    CET pediu ar-condicionado e furadeira para mitigar trânsito sob Haddad

    FABRÍCIO LOBEL
    DE SÃO PAULO

    21/09/2017 02h00

    Para liberar a instalação ou a reforma de empreendimentos de grande porte em São Paulo, como shoppings, condomínios e universidades, a prefeitura deve, pela legislação, exigir das empresas contrapartidas para atenuar possíveis impactos no trânsito.

    Sob a gestão Fernando Haddad (PT), no entanto, a CET aprovou estabelecimentos em troca de equipamentos sem nenhuma relação direta com a circulação de veículos e pedestres na vizinhança das regiões atingidas.

    Ronny Santos/Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 16-05-2017 - MARRONZINHOS MULTAS - Multas aplicadas por agentes da CET crescem na gestao doria. Marronzinhos na avenida Rio Branco. (Foto: Ronny Santos/Folhapress, CIDADES) ***EXCLUSIVO AGORA *** EMBARGADA PARA VEICULOS ONLINE *** UOL E FOLHA.COM CONSULTAR FOTOGRAFIA DO AGORA *** FOLHAPRESS CONSULTAR FOTOGRAFIA AGORA *** FONES 3224 2169 * 3224 3342 ***
    Agentes da CET na avenida Rio Branco, em São Paulo

    Entre os itens pedidos para mitigar os transtornos ao tráfego estiveram furadeiras, ar-condicionado, empilhadeiras, impressora serigráfica, aparelhos celulares e até a reforma de prédios da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) e da SPTrans (empresa que cuida do transporte).

    Levantamento da Folha em quase 200 certidões emitidas desde 2013 identificou pelo menos 12 casos do tipo –que, segundo especialistas, prejudicam diretamente as áreas que recebem esses polos geradores de tráfego.

    Todos ocorreram na gestão Haddad. O ex-secretário Jilmar Tatto (PT) nega irregularidades e diz que qualquer benefício à CET, na prática, significa uma melhoria ao trânsito. A gestão Doria diz que a prática atual para minimizar os impactos no trânsito é pedir "adequações viárias em locais próximos" à região afetada.

    -

    ENTENDA

    O que são polos geradores de tráfego
    Empreendimentos de grande porte que causam impacto no trânsito das ruas que lhes dão acesso

    O que a prefeitura e a CET têm que fazer
    Analisar projetos de construção ou reforma desses locais e, se for o caso, exigir melhorias viárias ao empreendedor

    Como isso é feito

    Pedidos de compensação mais comuns
    - Manutenção ou troca de semáforos
    - Criação ou iluminação de faixas de pedestres
    - Redesenho de ruas
    - Instalação de câmeras de monitoramento

    Certidões de diretrizes emitidas por ano -

    O que aconteceu na gestão Haddad (PT)
    De 2013 a 2016, a CET permitiu pelo menos 12 vezes que empreendedores fornecessem equipamentos para a companhia, como furadeiras, ao invés de realizar compensações viárias

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    SEMÁFOROS E OBRAS

    Entre as exigências tradicionais para mitigar os transtornos provocados por grandes empreendimentos estão a manutenção ou troca de semáforos, obras viárias, criação ou iluminação de faixas de pedestres, sinalização e instalação de câmeras de tráfego.

    Nos casos inusitados identificados pela reportagem estão a modernização do sistema de ar-condicionado da central de operações da CET na rua Bela Cintra –exigida em troca de obras do Hospital Santa Catarina– e a reforma do subsolo e da sobreloja de prédio da SPTrans no centro, pedida em troca de obra do Hospital Nove de Julho.

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    SÃO PAULO, SP, 20.09.2017: HOSPITAL-SP - Fachada do Hospital Santa Catarina na avenida Paulista em São Paulo. (Foto: Fabrício Lobel/Folhapress)
    Fachada do Hospital Santa Catarina, na avenida Paulista, em São Paulo

    Para mitigar os impactos no trânsito devido à implantação de dois prédios do condomínio Jardim das Perdizes (zona oeste), foi exigida a reforma de dois edifícios da CET, no Tatuapé (leste) e na Vila Leopoldina (oeste).

    "É um absurdo, porque muita gente vai ser atraída pelos prédios novos. O meu condomínio está praticamente desabitado, imagina quando estiver cheio. O trânsito com certeza vai piorar", afirma Danilo Hipólito, 41, engenheiro e morador de um desses novos empreendimentos.

    Seu novo condomínio, com duas torres de 30 andares e oito apartamentos por andar, teve como única contrapartida a reforma das duas sedes regionais da CET, uma delas a 11 km do polo de trânsito.

    Segundo Hipólito, há dez anos a estrutura viária daquela região é praticamente a mesma. Enquanto isso, os congestionamentos crescem.

    Fabrício Lobel/Folhapress
    SÃO PAULO, SP, 15.09.2017: IMÓVEL-SP - Prédios do condomínio Jardim das Perdizes na zona oeste de São Paulo. (Foto: Fabrício Lobel/Folhapress)
    Prédios do condomínio Jardim das Perdizes, na zona oeste de São Paulo

    O arquiteto e urbanista Kazuo Nakano afirma que essas requisições da CET são claras distorções do objetivo original da lei municipal que regula a licença dos polos geradores de tráfego.

    "A cidade de São Paulo não tem capacidade de analisar os impactos de prédio ou empreendimento ao trânsito local. Diante disso, os pedidos de compensação são desmedidos, sem rigor técnico", diz.

    O urbanista Renato Cymbalista concorda que os pedidos feitos pela CET não são apropriados. "As compensações do tráfego causado por estes empreendimentos deveriam gerar retorno para a cidade, para a população, e não para a CET e sua equipe operacional", defende.

    Para ele, a regra para autorizar grandes prédios poderia ser revista e passar a exigir atendimento de outras demandas da população atingida, como a construção de creches e áreas de lazer.

    A CET também já foi questionada durante a gestão Fernando Haddad sobre desvio de finalidade na aplicação do dinheiro arrecadado com as multas de trânsito.

    Uma liminar chegou a barrar a utilização dessa verba para custeio –pelo fato de a legislação prever os recursos para educação, policiamento e engenharia de tráfego.

    Uma ação de improbidade foi movida pela Promotoria contra Haddad, mas, já sob Doria, a Justiça autorizou a aplicação do dinheiro para pagar salários e serviços.

    DENTRO DA LEI

    Jilmar Tatto, que foi secretário de Transportes e presidente da CET na gestão Fernando Haddad (PT), afirma que as requisições de equipamentos e de reformas em prédios públicos são comuns e obedecem a legislação.

    Segundo ele, nenhum pedido de compensação de tráfego foi questionado pelo Tribunal de Contas do Município ou pela Promotoria. Tatto argumenta que qualquer melhoria na infraestrutura de trabalho da CET resulta em fluidez na cidade.

    Na avaliação dele, nem mesmo a reforma do sistema de refrigeração de prédio da CET é um problema, já que "ar-condicionado não é luxo, é uma necessidade". O ex-secretário de Haddad diz ainda que a obtenção de aparelhos de celular provocou enorme economia à CET, que antes os alugava.

    A gestão Doria (PSDB) afirma que "cabe à administração passada justificar as decisões tomadas" e que a prática atual é pedir aos estabelecimentos "adequações viárias em locais próximos" ao polo gerador de tráfego.

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