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    Rio de Janeiro

    Rotina começa voltar ao normal na Rocinha dez dias após confrontos

    LUCAS VETTORAZZO
    DO RIO

    28/09/2017 19h09

    A rotina na Rocinha, maior favela do país, começa a voltar ao normal após quase dez dias de clima tenso na comunidade.

    As aulas nas escolas municipais que ficam na Rocinha, São Conrado, zona sul do Rio, voltaram a ter aulas nesta quinta-feira (28).

    A Folha percorreu as ruas da favela e encontrou somente uma das seis escolas municipais fechada. No patio da Escola Francisco de Paula Brito, crianças jogavam bola a despeito do portão fechado com correntes.

    A escola fica na parte alta do morro, onde o clima ainda é tenso entre moradores em razão da forte presença das Forças Armadas, que ocupam a comunidade desde o último dia 22.

    A funcionária da escola, que conversou com a reportagem sob condição de anonimato, disse que a escola só não estava funcionando porque a maioria dos professores são de fora da Rocinha e estariam ainda com medo de voltar lecionar.

    "A presença das Forças Armadas traz uma sensação de segurança, mas também deixa as pessoas com medo de que o tiroteio possa acontecer a qualquer momento", disse ela.

    Na sexta, a direção fará uma reunião com pais e docentes e as aulas devem retomar na segunda.

    O restante das escolas voltou ao normal. Na chamada Creche do Castelinho, que atende a 100 crianças, meninos jogavam bola numa das poucas quadras esportivas da favela.

    Desde o último dia 25 que as nove unidades escolares da prefeitura, entre escolas de ensino básico e creches, estavam fechadas. Ao todo, 3.344 alunos ficaram sem aulas. Muitos pais sem ter com quem deixar os filhos tiveram que faltar aos seus trabalhos.

    Também voltaram a funcionar os serviços de ônibus escolares que levam às escolas fora da favela, em bairros como Jardim Botânico e Botafogo, na zona sul.

    Moradores e os donos de redes de ônibus conseguiram negociar que os blindados da Marinha, posicionados nas principais vias do morro, manobrassem para permitir a passagem dos ônibus.

    O que se via na tarde desta quinta eram ônibus dividindo a pista com veículos de guerra e homens fardados de fuzil. O trânsito no horário de pico era caótico, com mototaxistas passando por espaços estreitos entre os veículos escolares e os blindados.

    O comércio foi reaberto e comerciantes tentam recuperar o prejuízo de quase dez dias de pouco movimento.

    Em frente ao bar da Maria José, na Estrada da Gávea, via que corta toda a favela, uma tropa da Marinha fazia revistas nos moradores. Homens negros e passageiros de mototaxistas formam o perfil de pessoas que é mais parado na revista.

    "Aos poucos, a rotina volta ao normal", disse ela. "Tomara que as vendas melhorem no final de semana".

    Na subida da localidade conhecida como Cachopa, a biblioteca municipal da Rocinha, conhecida como C4, ainda mantinha as portas fechadas, apesar de o prefeito do Rio, Marcelo Crivella ter anunciado ontem que uma das prioridades seria retomar as atividades por lá.

    O tradicional pula-pula na entrada da favela, uma das poucas áreas de lazer para crianças na favela voltou a funcionar após uma semana parado.

    Cristina*, moradora da região do Valão, uma das mais pobres da favela e um dos epicentros do conflito de facções, levou seu filho e sua sobrinha para brincar pela primeira vez em dias no pula-pula.

    Ela recebia uma irmã da Paraíba, mas a visita ocorreu num momento ruim, justamente quando eclodiu a guerra de facções no morro, no último dia 17.

    "Ser criança na Rocinha é muito difícil por causa da violência e também por causa da falta de praças e brinquedos", disse Sérgio Henrique, 42, nascido na comunidade e dono do parquinho que fica na entrada da favela.

    "Enquanto os militares estão aqui, a rotina volta aos poucos. Fica o receio do que vai acontecer quando eles forem embora", disse.

    No fim da tarde, uma roda de capoeira foi aberta na Via Ápia, um dos principais acessos da Rocinha.

    Jovens orientados pelo metre Manoel davam piruetas no meio do asfalto ao lado do ponto de mototaxis.

    Manoel Pereira Costa, 57, vive há 40 anos na Rocinha. Ele acabara de voltar de uma turnê pela Noruega e Itália quando soube do conflito na favela. Nesta quarta, com o clima menos tenso, ele decidiu montar uma roda de capoeira na entrada da favela. Um dos motivos era retomar a autoestima da população local, disse ele.

    "O pessoal daqui precisava ouvir um som diferente", disse.

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