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    Executivo vive em aeroporto, passa por reviravolta e acumula R$ 30 mil

    BIBIANA MAIA
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, NO RIO

    10/12/2017 02h00

    Sorridente, Vilmar Mendonça, 59, nem de longe transparece ter vivido na rua por cerca de dois anos na área externa e nas dependências do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro.

    Com experiência em recursos humanos, hoje ele mora em um hostel em Santa Teresa, trabalha em uma consultoria de contabilidade e conta que acumulou uma poupança de R$ 30 mil, para usá-la em momentos difíceis.

    O pesadelo dele começou no Carnaval de 2013, quando foi assaltado e teve um prejuízo de cerca de R$ 9.000 entre saques e 24 compras no cartão. Logo depois, foi dispensado de uma empresa.

    O dinheiro acabou em 2015, conta. "Comecei a verificar um local adequado, inclusive cheguei a passar uma noite no aeroporto, mesmo ainda morando num hostel."

    A preocupação era a segurança. Vilmar preferia não se juntar a outros moradores de rua para não se envolver com bebidas e drogas.

    "Eles querem e precisam ficar juntos. É o medo dos predadores, que andam em bando e podem até colocar fogo na pessoa", conta.

    Vaidoso, Vilmar criou uma rotina. Logo cedo, começava a higiene no banheiro do Santos Dumont. Os banhos eram improvisados perto do mar, com garrafas de água e sabão.

    Vestido com roupas sociais doadas, usava a internet do aeroporto para enviar currículos até as 8h, quando seguia para bibliotecas ou livrarias. Nos finais de semana, o destino era a praia.

    A reviravolta veio com a entrevista para uma agência de notícias francesa, que pensou ser para um emprego.

    Nas redes sociais, ofereceram dinheiro, abrigo e até pedidos em casamento.

    Vilmar ganhou 50 camisas, nove calças e três paletós, que, segundo ele, valem juntos mais de R$ 5.000.

    A princípio, ficou preocupado: "Não queria caridade. Se quisesse, ligaria para a minha família. Nunca pensei em voltar [para Santa Catarina] porque não aceito derrota."

    Vieram também ofertas de trabalho. Ele topou administrar um restaurante em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, com carteira assinada, alimentação e moradia.

    Ficou lá por três meses. Há duas semanas, tornou-se cooperado em uma consultoria de contabilidade.

    "Eu me sinto um microempreendedor. Já administrei carteiras com 400 clientes, então vou atrás deles agora."

    GASTADOR E POUPADOR

    Vilmar já foi um gastador, mas hoje poupa cada centavo. Na época de Santos Dumont, caminhava distâncias de até 12 km para entrevistas e empregos temporários.

    Dos salários, guardou quase tudo. Hoje, tem uma poupança de cerca de R$ 30 mil.

    "Quero ir a Londres, Paris, e Dubai assim que me estabelecer. A partir do momento em que me aposentar [no ano que vem], eu já posso pensar melhor nisso."

    Outros planos são lançar um livro, dar palestras e apadrinhar uma criança.

    Quando alguém lhe pede dinheiro na rua, ele indica locais onde é possível se alimentar e buscar emprego.

    Vilmar diz acreditar que pessoas em situação de rua podem dar a volta por cima sem caridade, mas com apoio. "Morar na rua não é para ninguém. Eu sou a exceção da exceção."

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