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    Em greve, PM do RN ganha folga se pagar conserto de veículo da polícia

    THIAGO AMÂNCIO
    BRUNO SANTOS
    ENVIADOS ESPECIAIS A NATAL

    03/01/2018 02h00

    A farda custou R$ 240. O coturno, na promoção, foi R$ 170. Se pagarem do próprio bolso o conserto dos carros parados no estacionamento, são recompensados com dias de folga. Os sacos de gesso para reformar as paredes gastas foram doados por vizinhos. Já a reforma foi feita pelos próprios policiais militares.

    Esse é o ambiente de trabalho na 2ª Companhia do 9º Batalhão da Polícia Militar do Rio Grande do Norte. A Folha visitou a unidade e ouviu os relatos dos próprios PMs. E a situação, dizem, é a mesma em todas as outras companhias do Estado. Com os salários de novembro, dezembro e 13º atrasados, a maior parte dos agentes do Estado está aquartelada há mais de duas semanas –isso motivou a chegada das Forças Armadas na semana passada.

    Os PMs, porém, negam que estejam em greve: dizem que comparecem aos batalhões, mas não podem sair às ruas com coletes balísticos vencidos e carros danificados e sem documentação. "Não tem nem munição. A gente sai com dez balas na arma por dia. Se se envolver em tiroteio, volta e acabou. Se tiver ocorrência grave, não tem como atender. Dá para trabalhar assim? Vou sair com colete a prova de balas vencido?", indaga um cabo.

    "Meu motorista aqui não tem nem habilitação." Sem folha sulfite, diz, não consegue nem imprimir a escala de trabalho dos agentes. Na 2ª Companhia, nenhum dos sete carros funcionava. O cenário é o mesmo em outros locais: a 3ª companhia do 5º BPM é mais organizada, dizem os agentes, porque fica em área rica e vizinhos pagam por reformas. Os agentes fizeram uma vaquinha para comprar coletes.

    "Tive que pedir dinheiro ao meu irmão para pagar a conta de luz. O banco liga me cobrando dívida o dia todo. Eu digo: ligue para o governador", conta um soldado.

    Os agentes têm receio de se identificar sobretudo depois de decisão judicial que, no domingo, determinou que os chefes da PM, dos bombeiros e da Polícia Civil prendam em flagrante os agentes que promoverem, incentivarem ou colaborarem com a paralisação.

    "E ainda impedem a gente de trabalhar com outra coisa. Eu trabalho 24 horas e folgo 72 horas. Mas vou fazer segurança de loja nesses três dias ganhando R$ 50. Porque, se não, como vou almoçar?"

    A situação dos carros é admitida pela Secretaria de Segurança, que baixou portaria em que exime os agentes de riscos ou danos que os veículos possam causar "já que se trata de estrito cumprimento de ordem judicial".

    BAIXO EFETIVO

    Hoje, no Estado, são pouco menos de 8.000 policiais militares, segundo a PM. O total vem caindo: em 2011, eram 11 mil agentes, diz a Associação de Cabos e Soldados da PM. O efetivo previsto em lei é de 13.466 agentes.
    "O crime se organizou, a população cresceu, e a polícia diminuiu", diz Roberto Campos, da Associação de Cabos e Soldados, que afirma nunca ter enfrentado crise parecida.

    Um policial entra hoje na corporação com salário de R$ 2.904 e vale alimentação de R$ 10. Segundo levantamento de 2015 da Anermb (associação de entidades da PM e Bombeiros), o vencimento é o 19º entre os 27 Estados. Com a paralisação, o Estado registrou uma ligeira alta na taxa de crimes violentos.

    Presidente da Associação de Subtenentes e Sargentos, Eliabe Marques diz que "sofre com esse número porque também é população"."A nossa intenção não é causar o terror e até pedimos desculpas. Mas na certeza de que estamos fazendo a coisa certa. Porque não dá para trabalhar sem qualquer proteção", diz.

    Oficialmente, a PM reconhece que, "por questões orçamentárias", falta fardamento, mas diz que isso "não implica que todos os policiais ficam sem receber uniforme".

    A corporação nega, entretanto, que haja coletes balísticos vencidos. Diz que recebeu 3.000 unidades do governo federal, suficiente para o efetivo que faz o patrulhamento nas ruas. Diz que a munição em estoque é suficiente para as ações da corporação.

    A PM diz desconhecer incentivo a policiais que restaurarem veículos. Reconhece que há uma baixa no efetivo, mas afirma que o governo lançará em breve edital para contratar 1.000 novos agentes.

    O Governo do RN afirma que terminará de pagar o mês de novembro até sábado (6), pagando os salários de quem ganha acima de R$ 4.000. O 13º salário deve ser depositado "o mais breve possível".

    A Polícia Civil também está parada. "Se eu for preso é até bom, que aí tenho almoço e jantar", diz um agente.

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