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    Aluno fica sem merenda em reposição de aula por greve no Estado de SP

    EMILIO SANT'ANNA
    DE SÃO PAULO

    15/07/2015 02h00

    Após 89 dias da mais longa greve dos professores de São Paulo, a reposição de aulas na rede estadual está sendo feita sem que os alunos recebam a merenda habitual.

    Isso porque parte da reposição ocorre no atual período de férias, e as cozinhas que fornecem a comida para as escolas são terceirizadas e seus funcionários estão em férias.

    No lugar de arroz, feijão, carne e macarrão, as escolas da capital que têm em estoque disponibilizam alimentos que não precisam ser cozidos, como lanches, leite, sucos, frutas e barras de cereal, por exemplo. Onde esses itens faltam, é preciso improvisar.

    A merenda escolar é um "direito dos alunos da educação básica pública e dever do Estado", diz a Constituição.

    Além da merenda, o transporte gratuito dos estudantes também está prejudicado nessa fase de reposição de aulas, afirmam professores ouvidos pela reportagem.

    Zanone Fraissat/Folhapress
    Escola Carlos Aires, no Grajaú (zona sul) tem reposição de aulas sem merendas e transporte aos alunos
    Escola Carlos Aires, no Grajaú (zona sul) tem reposição de aulas sem merendas e transporte aos alunos

    A greve na rede da gestão Geraldo Alckmin (PSDB) se encerrou no mês passado. Como a adesão variou de acordo com a unidade, as escolas puderam montar o calendário de reposição da forma mais conveniente.

    Após o fim da paralisação, algumas não interromperam suas atividades em julho, outras começam a repor no próximo dia 20. O retorno para o segundo semestre das aulas deve ocorrer no próximo dia 3 –a partir de então, a reposição pode ocorrer, por exemplo, no contraturno escolar.

    Apesar da opção de contar com a "merenda seca", como pães e bolachas, professores e alunos ouvidos pela reportagem dizem que a solução ainda não foi implementada.

    "Eles passam a manhã inteira sem nada no estômago. Muitos ficam com dor de cabeça e isso também dificulta a concentração", diz uma professora da escola Carlos Aires, no Grajaú, no extremo da zona sul de São Paulo.

    Segundo ela, que pediu para não ser identificada, alguns alunos acabam não comparecendo às aulas. "É um problema, principalmente para os menores. Muitos vêm para a escola sem comer nada."

    Lucas Hideki, 16, e Henrique Brandão, 17, alunos do terceiro ano do ensino médio, estão repondo as aulas perdidas. "Se quiserem comer alguma coisa, os alunos têm que comprar na cantina", diz Lucas.

    Para a mãe de Henrique, a dona de casa Luzia Brandão, 41, a merenda seca não é a mesma coisa que a alimentação normal, "mas já ajuda". "Eles entram muito cedo, precisa ter um lanche", afirma.

    Nas escolas Benedito Ferreira de Albuquerque, Roberto Mange e Calhim Manoel Abud, as três na zona sul, o jejum se repete. Professores dizem que as merendeiras não aparecem e que a saída tem sido improvisar.

    "As pessoas que fazem a merenda estão de férias. Na segunda [6], os alunos ganharam um bolinho que não foi suficiente para todos", afirma um docente da Benedito Ferreira. "Na quinta [9], cada um recebeu três bolachas água e sal sem nada para beber."

    Segundo ele, os alunos estão sendo aconselhados a levar lanche de casa.

    "Hoje [terça-feira], dividi entre eles algumas bolachas, mas não tinha para todo mundo", afirma uma professora da Calhim Manoel Abud.

    O governo não informou quantas escolas recebem merenda de cozinhas terceirizadas ou onde elas estão.

    POUCOS APARECEM

    Professores e alunos dizem que a reposição de aulas em julho tem baixa frequência. "Como muitos acabam não vindo, vamos ter que passar um trabalho depois para repor essas faltas", diz uma professora da escola Calhim Manoel Abud, na Vila Califórnia, na zona sul de São Paulo.

    "Ontem [segunda-feira] tinha apenas eu e uma amiga na aula", afirma Carolina Soares dos Santos, 15, aluna do 9º ano da escola Carlos Aires, no Grajaú.

    Ela diz que alguns professores já fecharam as médias do segundo bimestre e não cobram presença."Estou indo porque quero viajar na semana que vem e tenho medo de perder algum trabalho."

    No dia seguinte à Folha encontrá-la, a mãe da menina, a diarista Silvana Soares de Lima, 38, achou que era melhor ela não ir à aula. "Ela tinha uma aula às 11h e depois outra só às 16h. Ela não mora perto e tinha que ir até lá assistir a aula, voltar para casa e depois ir de novo."

    "Não basta dizer que vai repor, a secretaria tem que garantir condições para isso", diz Maria Izabel Azevedo Noronha, presidente da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de SP).

    OUTRO LADO

    A Secretaria da Educação de SP afirma que todas as escolas estaduais têm estoques de "merenda seca", como pães e bolachas, e que esses estão sendo reforçados mediante "solicitações de cada unidade, conforme seu calendário de reposição".

    No caso específico de três das escolas mencionadas (Carlos Aires, Benedito Ferreira de Albuquerque, e Roberto Mange), diz a pasta, os pedidos de alimentos não foram realizados a tempo.

    Um dia após ser acionada pela reportagem, a pasta informou que essas unidades receberam a lote de "comida seca" nesta terça (14).

    No caso da escola Calhim Manoel Abud, que também não teria feito o pedido dentro do prazo previsto, a merenda deveria ser entregue até esta quarta-feira (15).

    Sobre a "merenda seca", sem necessidade de cozimento, a secretaria afirma que os alimentos oferecidos (lanches, leite, sucos, frutas e barras de cereal, por exemplo) foram selecionados por nutricionistas e atendem à necessidade calórica de acordo com o número de aulas a serem oferecidas.

    Em relação à falta de transporte para os estudantes, a secretaria afirma que orientou que as escolas "que tiveram a oferta do conteúdo parcialmente prejudicada em decorrência da paralisação" definissem o calendário de reposição das aulas com a comunidade escolar, os alunos e seus respectivos responsáveis.

    Em nota, a pasta também afirma que "a determinação foi para que, caso as unidades escolares não pudessem aditar o contrato de transporte escolar por inviabilidade legal, o cronograma de aulas fosse realizado a partir de agosto, no contraturno, por exemplo."

    Nas escolas Benedito Ferreira de Albuquerque, Professor Carlos Ayres, Roberto Mange e Calhim Manoel Abud a secretaria explica que não há a necessidade do uso de transporte, "já que os alunos moram nas imediações e já que não utilizam o ônibus em dias comuns de aulas."

    Com relação ao boletim escolar (médias dos bimestres), só foram lançadas as disciplinas que tiveram seus conteúdos ministrados por professores titulares ou substitutos, diz a secretaria. "Já as que necessitam de reposição serão lançadas após a reposição de aulas."

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