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    Fortaleza lidera em violência e discriminação dentro da escola

    ADRIANO QUEIROZ
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM FORTALEZA

    21/03/2016 02h00

    "Tem uma menina da minha sala que me xinga o tempo todo. Uma vez, ela pediu um lápis emprestado e eu disse que só tinha o que estava usando. Depois da aula, ela me deu um soco na cara."

    A fala da estudante de 11 anos do quinto ano de uma escola municipal em Fortaleza retrata a violência nas redes públicas de ensino da cidade.

    Essa realidade foi captada em pesquisa inédita sobre casos de agressão física e psicológica nesse tipo de unidade.

    Feito nas sete capitais com as mais altas taxas de homicídio entre jovens, o levantamento apontou Fortaleza como a cidade onde mais crianças e adolescentes relatam ter sofrido violência em 2015.

    Segundo a pesquisa —uma parceria entre o Ministério da Educação, a Organização dos Estados Interamericanos e a Flacso (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais)—-, 67,2% dos alunos da redes públicas de Fortaleza dizem ter sido agredidos verbal ou fisicamente em 2015.

    Infográfico: violência em escolas

    O número representa mais de dois em cada três alunos e é ligeiramente superior ao de Belo Horizonte, com 66%. A média nacional é de 42%. As outras cinco cidades pesquisadas foram Maceió, Vitória, Salvador, São Luís e Belém, com taxas de homicídios entre jovens superior à nacional, que é de 82,7 por 100 mil.

    Fortaleza também lidera no número de casos de alunos que sofreram discriminação na escola: 32% dos alunos de escola pública relatam discriminação em 2015, contra 27,4% da média nacional.
    Ana (nome fictício), 9, é um exemplo. Está no quarto ano de uma escola municipal no bairro Conjunto Palmeiras. Diz ser xingada por ser negra.

    Todos conhecem alguma história. O estudante Vitor, 13, do oitavo ano de uma escola estadual, diz que agressões coletivas são comuns.

    "Um dia, um aluno esbarrou em um rival e o ameaçou. Na saída, o que ameaçou se juntou a três amigos, e espancaram o meu colega", conta.

    O coordenador de escola pública Christian de Sousa, 40, avalia que o problema começa fora da escola. "Uma vez presenciei uma briga entre duas alunas. Descobrimos que a rivalidade vinha de serem de gangues rivais."

    Ele conta que já viu três alunos usando cocaína na escola e que um colega de outro colégio teve de intervir para evitar que um estudante ficasse armado dentro da sala.

    Na pesquisa, 21% dos alunos das sete capitais dizem já ter visto armas na escola. Outros 28% narram casos de cyberbullying (ofensas na internet) e 25% de roubos e furtos.

    Mas a violência não envolve apenas alunos e não está restrita ao ensino público.

    Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
    Nas capitais mais violentas, 42% dos alunos já foram agredidos na escola
    Colégio na zona leste de São Paulo; 42% dos alunos já foram agredidos na escola

    Carol Ribeiro, auxiliar administrativa, diz que o irmão largou a escola particular devido a agressões psicológicas sofridas de uma professora.

    Casos de professores agredidos também são comuns, segundo uma educadora que não quis se identificar. "Já sofri tanta ameaça de alunos, pais e gestores que passei em concurso público da capital e decidi não assumir o cargo."

    Para o coordenador do Laboratório de Estudos da Violência da federal do Ceará, César Barreira, as altas taxas de homicídio e de agressões nas escolas estão ligados ao contexto de desigualdade.

    "Há estudos que apontam Fortaleza como uma das dez cidades mais desiguais do mundo. E temos um fenômeno muito forte na periferia que são os conflitos de gangues. Essas disputas passam a circular dentro da escola."

    ESTRATÉGIAS

    A Secretaria da Educação do Ceará afirma que uma das estratégias para ajudar a combater a violência nas escolas, principalmente as de ensino médio, é ampliar a educação profissionalizante e a escola em tempo integral.

    A pasta diz que o Estado tem 112 escolas profissionalizantes e que outras 26 adotaram tempo integral neste ano.

    A secretaria diz ainda ter dois programas que buscam criar uma cultura de pacifismo na rede pública estadual.

    A pasta da Educação de Fortaleza não respondeu aos questionamentos da Folha.

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