Estado com uma das piores crises financeiras do país, o Rio Grande do Sul viu se agravar a falta de estrutura em suas escolas. Como consequência, já são mais de cem escolas ocupadas por estudantes, em um movimento similar ao de São Paulo.
As instituições sofrem com falta de refeitórios, merenda e materiais básicos –como canecas para suco e até papel higiênico– e há salas interditadas por rachaduras.
O número de escolas ocupadas varia de acordo com a fonte. Segundo levantamento do movimento "Ocupa Tudo RS", de 22 de maio, são 128. Já o sindicato dos professores diz que são mais: 170 ocupações. A Folha visitou três dessas unidades.
Os problemas estruturais se agravaram com o atraso do repasse de verbas às escolas. O último pagamento do governo de José Ivo Sartori (PMDB) foi parcial, de R$ 5,7 milhões, referente a março –o valor mensal é de R$ 8,4 milhões.
No colégio estadual Florinda Tubino Sampaio, na capital gaúcha, além da ausência de refeitório, os alunos reclamam do número insuficiente de canecas para a merenda: são cem para mil estudantes.
O problema causa uma cena curiosa: assim que terminam o lanche, os alunos entregam as canecas às funcionárias da cozinha. Os utensílios são lavados imediatamente para atender os demais que esperam na fila.
A unidade tem merenda, mesmo que produzida com limitação. "A gente se vira nos 30", diz a merendeira Iara Roseli Machado, 44, que opera um fogão com metade da capacidade –apenas três das seis bocas funcionam.
Só que, sem refeitório, os alunos do Tubino, como o colégio é chamado, comem de pé ou sentados no pátio.
A escola tem ainda uma sala de aula interditada por causa da rachadura que atravessa uma parede, causada por infiltração. Os estudantes também reclamam da sala de artes, que está fechada, assim como o laboratório de informática. A internet wi-fi prometida pelo governo, dizem, não funciona.
PAPEL EMPRESTADO
Ocorre o inverso no Instituto Estadual Rio Branco, que tem refeitório, mas não merenda. Outro problema é a falta de papel higiênico nos banheiros. "A gente tem que ir na sala dos professores antes para pegar papel, porque são eles que compram", conta João Marcelo de Souza Vaz, 17, aluno do terceiro ano.
A situação precária se repete no Instituto de Educação General Flores da Cunha, também em Porto Alegre, onde os alunos chegaram a arrecadar material de limpeza em uma gincana no ano passado, segundo Clara Ghiggi, 14, estudante do nono ano.
Em comum, as ocupações pedem a retirada do projeto do Executivo que permite que organizações sociais assumam a administração de escolas públicas. O projeto é visto como uma maneira de privatizar os colégios.
GREVE
Os estudantes também apoiam a greve dos professores estaduais, que chegaram a ter o salário parcelado em nove vezes por Sartori neste ano. O sindicato Cpers (Centro dos Professores do RS) estima que 60% das escolas tenham aderido à paralisação.
A paralisação foi aprovada em 13 de maio numa assembleia com 3.000 professores –equivalente a 4,1% dos 72 mil da rede no Estado. Eles estão distribuídos por 2.500 escolas, que somam 963 mil alunos.
Os professores reivindicam reajustes de 13,01% (2015) e 11,36% (2016) relativos ao piso nacional da categoria. Na última terça (23), foram recebidos pelo governo, mas não houve negociação. Sartori falou que o Estado passa por crise financeira.
"Queremos que o governo apresente alguma proposta. Se não tudo, quanto pode ser?", diz Helenir Aguiar Schürer, presidente do Cpers. Segundo ela, o governo "não apresentou nada".
Além da questão financeira, os professores também pedem a retirada do projeto de lei criticado pelos alunos.
OUTRO LADO
O secretário da Educação, Carlos Eduardo Vieira da Cunha, disse à Folha que a maior dificuldade em relação às ocupações é o diálogo. "Estamos com dificuldade para sentar com eles, alguns estão muito arredios. Já fiz contatos e aguardo uma oportunidade. Recebi o retorno de que eles ainda estão deliberando [se participam da reunião]."
Sobre a greve dos professores, Cunha diz que o governo "não tem condições de fazer qualquer reajuste". "É mais do que complicado. O governo sequer consegue pagar em dia." Ele diz, porém, que as demais pautas serão avaliadas, como o projeto das organizações sociais. Quanto ao atraso das verba de autonomia, Cunha admite a demora, mas diz que tudo será pago.