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    Análise

    Reforma não resolve problemas que desembocam no ensino médio

    SABINE RIGHETTI
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    22/09/2016 15h16 - Atualizado às 20h15

    Pedro Ladeira-14.set.2016/Folhapress
    O presidente Michel Temer durante evento no Palácio do Planalto
    O presidente Michel Temer durante evento no Palácio do Planalto

    Uma das principais bandeiras do governo Michel Temer (PMDB), a reforma do ensino médio pode melhorar um pouco a situação de quem está na última etapa da educação básica. Não resolve, porém, os deficits educacionais que despontam no ensino médio.

    A proposta visa ampliar a carga horária e flexibilizar o currículo, criando uma série de disciplinas optativas. Também substitui as atuais 13 disciplinas rígidas por quatro grandes áreas do conhecimento e mais ensino técnico.

    É uma aproximação do Enem (Exame Nacional do Exame Médio) –que, sob Temer, volta a ser coordenado por Maria Inês Fini, criadora da prova no governo FHC.

    REFORMAS NO ENSINO MÉDIO - Principais mudanças propostas pela medida provisória do governo Temer

    Flexibilizar a grade e ter disciplinas optativas dá autonomia aos alunos e funciona bem em países desenvolvidos, como nos Estados Unidos.

    Reforma do ensino médio

    Pode ser uma forma de segurar na escola quem conseguiu passar bem pelo chamado ensino fundamental 2 –aquela fase da escola em que os estudantes (pré-adolescentes) começam a ter um monte de docentes e de disciplinas. Não resolve, no entanto, o problema de quem chega ao ensino médio com dificuldades.

    Se o aluno carregar deficits de anos anteriores –o que tem acontecido–, não haverá disciplina opcional que o segure na escola. Ele vai desistir.

    É especialmente no fundamental 2 que o aluno começa a derrapar nas notas. O Ideb 2015 (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), principal referência de qualidade da educação, mostra que as notas começam bem nos primeiros anos escolares, mas despencam a cada nova série.

    Rivaldo Gomes/Folhapress
    Escola estadual Antonio Vieira de Souza, em Guarulhos, na Grande São Paulo
    Escola estadual Antonio Vieira de Souza, em Guarulhos, na Grande São Paulo

    No fundamental 1, houve um crescimento de 5,2 para 5,5 entre 2013 e 2015 –alcançando a meta do Ideb de 2017.

    Já no fundamental 2, apesar do avanço de 4,2 para 4,5, a nota segue fora da meta de 4,7 do ano passado –e mais distante ainda da de 2017 (5).

    Mais: no Brasil, o aluno corre o risco de escolher apenas as disciplinas com as quais tem um pouco de afinidade e pode deixar de lado aquelas em que ele tem dificuldade. Com isso, pode terminar a escola com uma defasagem gigantesca –e sem condições de competir, com igualdade, por vaga no ensino superior.

    Ser "protagonista do seu percurso", como prega o ministro Mendonça Filho ao falar de escolha das disciplinas, é uma ideia tentadora. Vale lembrar, no entanto, que adolescentes ainda não têm condições psicológicas nem fisiológicas para decidir sozinhos.

    A parte cerebral responsável pelo planejamento de longo prazo, por exemplo, só amadurece por volta dos 24 anos. A escolha de disciplinas e o planejamento de estudos, portanto, devem ser feitos com orientação e mentoria. Isso vai acontecer de maneira efetiva ou os alunos ficarão soltos à própria sorte?

    Raio-x do ensino médio

    A possibilidade de abrir mão de educação física da grade também pode ter resultado desastroso. Há estudos em várias áreas do conhecimento que mostram que os esportes, além de melhorar a auto-estima, essencial na escola, aprimora a capacidade de concentração e memorização.

    Alguns especialistas chegam a recomendar redução de horas de estudos e aumento de horas de esportes –prática bastante adotada na Finlândia, um dos países-modelo em educação no mundo, inclusive durante os rigorosos invernos daquele país.

    Alguém, aliás, consultou os estudantes sobre isso?

    Hoje, o ensino médio encontra meninos e meninas desanimados e com dificuldades nas aulas, que vão ficando mais complexas. É um convite para a evasão escolar. Na prática, metade de quem começa a estudar no Brasil não termina o ensino médio.

    Se as disciplinas do ensino médio continuarem separadas da realidade do aluno, com professores exaustos, em aulas antiquadas no formato giz e lousa –e se a opção de ensino integral apenas ampliar a quantidade de horas dessas disciplinas conservadoras–, o estudante acabará largando a escola do mesmo jeito.

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