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    Ensino religioso em escola pública não deve promover crença, diz Barroso

    LETÍCIA CASADO
    DE BRASÍLIA

    30/08/2017 22h15

    Lula Marques - 24.fev.2011/Folhapress
    BRASÍLIA, DF, BRASIL, 24-02-2011, 13h30: A professora de ensino religioso Alzira Brandão dá aula sobre a criação do mundo e dos homens por Deus para os alunos da 2ª série da escola classe 407 de Samambaia, Distrito Federal. (Foto: Lula Marques/Folhapress, PODER) ***ESPECIAL***
    Professora de ensino religioso em escola de Samambaia, no Distrito Federal

    O STF (Supremo Tribunal Federal) retoma nesta quinta-feira (31) o julgamento de uma ação que discute se os professores podem pregar suas crenças na sala de aula. Relator do caso, o ministro Luís Roberto Barroso votou contra. Os outros ministros devem votar nesta quinta.

    A ação foi impetrada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) para discutir dispositivos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação sobre ensino religioso nas escolas públicas.

    Para a Procuradoria, o ensino religioso em escolas públicas só pode ser de "natureza não-confessional", ou seja, sem vinculação a uma religião específica, com proibição de admissão de professores na qualidade de representantes das confissões religiosas.

    O artigo 210 da Constituição determina que "o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental".

    Para Barroso, a interpretação que deve ser dada ao texto é que "o ensino religioso ministrado em escolas públicas deve ser de matrícula efetivamente facultativa e ter caráter não confessional, vedada a admissão de professores na qualidade de representantes das religiões para ministrá-lo". Barroso destacou que a Constituição também defende a liberdade religiosa e o Estado laico.

    De acordo com o ministro, o ensino público deve ter um "modelo não confessional como único capaz de assegurar o princípio da laicidade" do Estado brasileiro, com base em três pilares: separação formal entre Estado e igrejas; neutralidade estatal em matéria religiosa; e garantia da liberdade religiosa.

    Antes de Barroso votar, entidades se manifestaram a favor e contra o pedido da PGR, além do procurador-geral, Rodrigo Janot, e da advogada-geral da União, Grace Mendonça.

    DIVERSIDADE RELIGIOSA

    Barroso deu ênfase à a diversidade religiosa. Segundo ele, há cerca de 4 mil religiões distintas no mundo e, embora a crença tenha sido removida do centro dos sistemas sociais, a escolha é uma decisão importante para cada indivíduo.

    "O fenômeno religioso, no entanto, passa por transformações profundas, com grande diversificação. Religiões que historicamente contam com maior número de adeptos –como as religiões abraâmicas (cristianismo, islamismo e judaísmo), o hinduísmo e o budismo–, progressivamente cederam espaço a novas matrizes religiosas, originadas tanto da interação entre diferentes crenças ao longo do tempo, quanto de cismas internos", afirmou.

    O ministro destacou ainda que está cada vez mais difundido o "humanismo espiritualizado", que não segue uma religião específica, cujo conteúdo essencial consiste em "não fazer aos outros o que não gostaria que lhe fizessem".

    "Esse contexto de maior diversidade e pluralismo também deu lugar ao surgimento de manifestações genéricas de fé, que não se traduzem necessariamente na filiação a uma religião específica", disse.

    "Paralelamente às religiões institucionalizadas e à visão não religiosa da vida, existe também um humanismo espiritualizado, que se beneficia tanto da filosofia moral como de valores éticos colhidos em diferentes tradições religiosas."

    "É certo que a modernidade trouxe, efetivamente, a secularização, a laicidade do Estado e a separação entre ciência e fé, com o deslocamento da religião, predominantemente, para o espaço da vida privada", disse o ministro durante seu voto. "O fato inelutável é que a ascensão das ciências e o avanço tecnológico não deram conta das demandas espirituais da condição humana."

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