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    Obrigatório nas escolas, futebol vira prioridade de Estado na China

    MARCELO NINIO
    DE PEQUIM

    07/03/2015 02h00

    Kevin Frayer - 14.jun.2014/Getty Images
    Crianças praticam futebol na província de Guangdong, na China
    Crianças praticam futebol na província de Guangdong, na China

    Agora é oficial: futebol virou prioridade de Estado na China. O plano de renovação do futebol chinês foi o primeiro item discutido pelo Comitê Central de Reformas, que se reuniu na semana passada sob o comando dos dois homens mais poderosos do país, o presidente Xi Jinping e o premiê, Li Keqiang.

    O recado foi claro: não basta ser a maior economia do mundo e uma potência global. A China quer ser também um gigante no futebol.

    O empurrão vem do mais alto escalão comunista. Fã declarado de futebol, Xi Jinping elevou o esporte a política de Estado desde que chegou ao poder, há dois anos.

    O resultado foi o plano aprovado pelo Comitê de Reformas e apresentado nesta semana na sessão anual do Congresso Nacional do Povo, evento mais relevante do calendário político chinês.

    "Precisamos desenvolver e revitalizar o futebol para garantir que nos tornemos uma nação forte no esporte", disse o comitê, num comunicado. "Este também é um desejo desesperado do povo".

    O plano torna obrigatória a prática do futebol nas escolas e prevê a construção de milhares de campos de futebol pelo país. A meta é que até 2017 a China tenha 100 mil crianças jogando.

    Apesar de ter se tornado potência do esporte e ficado em 2º lugar na tabela de medalhas da última Olimpíada, a China no futebol é sinônimo de vexame e frustração para seus torcedores.

    A seleção só se classificou uma vez para a Copa do Mundo, em 2002, quando foi eliminada na primeira fase com três derrotas.

    Atualmente está em 82º lugar no ranking da Fifa, depois de subir 14 posições graças a um desempenho surpreendente na recente Copa da Ásia, na qual venceu os três jogos da primeira fase antes de ser eliminado pela anfitriã Austrália, campeã do torneio.

    "Uma questão que sempre nos fazemos é: com uma população enorme de quase 1,4 bilhão de pessoas, por que a China não é capaz de escolher 11 jogadores para formar um time forte?", escreveu o jornal oficial "Global Times", repetindo algo que é consenso no país: o problema é que simplesmente não há muitos chineses jogando futebol.

    Segundo o jornal, o país tem 30 mil jogadores registrados, contra 1,5 milhão no Brasil e 6,8 milhões na atual campeã mundial, Alemanha.

    Algumas escolas em Pequim foram além da ordem oficial e incluíram o futebol em seus exames de admissão.

    Os testes devem ser simples, mas a decisão pegou os professores de surpresa, tendo pela primeira vez que julgar chutes e passes. O plano levantou várias dúvidas, entre elas se é possível aprender futebol na escola e se a obediência pode criar uma potência do futebol.

    Li, técnico de uma escolinha de futebol para crianças de até 10 anos, se diz incrédulo. "É importante investir na construção de mais campos, mas é impossível ensinar o amor ao futebol. Isso só acontece naturalmente", diz.

    Ele ficava irritado quando os pais lhe perguntavam se os filhos iriam receber créditos na escola pelos treinos com a bola. "Não é assim que se formam craques".

    A falta de apoio das famílias é um dos maiores obstáculos para o desenvolvimento do esporte.

    Com a política de filho único, elas se tornaram superprotetoras. A maioria dos pais prefere que os filhos se dediquem aos estudos e não a uma carreira incerta no futebol, que tem a imagem desgastada por anos de escândalos de corrupção e má gestão.

    Isso cria uma distorção: enquanto cresce o número de fãs, como mostra a popularidade dos principais campeonatos europeus, a quantidade de crianças que praticam o esporte está em declínio.

    Peladas de rua, cena comum em outros países da Ásia, são raras na China.

    Um dos principais problemas para o desenvolvimento de talentos é a falta de equipes de base nos times da principal divisão chinesa.

    Alguns times dão os primeiros passos, como o Shandong Luneng, que firmou parceria com o São Paulo e mantém um centro de treinamento para jovens promessas comandada por profissionais do clube brasileiro.

    QUERO SER GRANDE

    Xi Jinping disse um dia que a China deve ter três ambições no futebol: classificar-se para a Copa, sediar o evento e ganhar o título mundial.

    As metas são citadas com obediência por funcionários do governo e também inspiram grandes negócios.

    Na linha de frente, está o bilionário do Wang Jianlin, o homem mais rico da China, que tem feito investimentos pesados no futebol.

    Depois de pagar 45 milhões de euros (R$ 149 milhões) para adquirir 20% do Atlético de Madri, no mês passado, Wang comprou a empresa de marketing esportivo suíça Infront por 1,05 bilhão de euros (R$ 3,5 bilhões).

    Comandada por Philippe Blatter, sobrinho do presidente da Fifa, Joseph Blatter, a Infront detém direitos de transmissão das duas próximas Copas do Mundo, na Rússia e no Qatar.

    Os milhões de chineses também têm movimentado a Super Liga, como é conhecido o campeonato da primeira divisão.

    Na última janela de transferências, a China foi pela primeira vez o país que mais gastou na contratação de atletas brasileiros. Foram R$ 119 milhões, por seis jogadores.

    Editoria de arte/Folhapress

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