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    Corrupção no futebol

    Blatter atraiu patrocinadores à Fifa e saiu sob pressão deles

    GUILHERME SETO
    DE SÃO PAULO

    03/06/2015 10h00

    Quando o suíço Joseph Blatter entrou na Fifa em 1975 como diretor de programas de desenvolvimento da gestão do brasileiro João Havelange, a Fifa tinha cerca de 12 funcionários e ficava em um pequeno edifício em Zurique.

    No seu último relatório de contas, referente a 2014, a Fifa declarou ter reservas de US$ 1,5 bilhão (cerca de R$ 4,8 bilhões). No ano da Copa do Mundo do Brasil, a entidade alcançou um recorde de US$ 2 bilhões de receitas (cerca de R$ 6,4 bilhões). São valores astronômicos para uma entidade que declarou em 2008 que não tinha valor algum em suas reservas.

    Capitão do processo de modernização comercial da Fifa, Blatter soube vender a Copa do Mundo como um produto para as televisões e aproximou patrocinadores com regimes diferenciados de fidelidade.

    Blatter modificou a hierarquia dos patrocinadores, agrupando-os em três categorias: os parceiros oficiais (Visa, Adidas, Emirates, Coca-Cola e Hyundai-Kia), os patrocinadores da Copa (oito ao todo) e os patrocinadores nacionais (empresas instaladas nos países-sede).

    Em 1982, a Fifa tinha nove patrocinadores ao todo, que contribuíam com valores variáveis e vinculavam-se pontualmente à entidade, em eventos como a Copa do Mundo. Apenas cinco dos nove parceiros estabeleceram vínculos mais longos.

    Em 2014, contavam-se 14 patrocinadores, com faixas de valores pré-determinadas.

    Os seis parceiros Fifa investem entre US$ 24 milhões (R$ 76,3 milhões) e US$ 44 milhões (R$ 140 milhões) anualmente para ter suas marcas expostas em todos os eventos da entidade, não somente na Copa do Mundo.

    Os oito patrocinadores da Copa pagam entre US$ 10 milhões (R$ 32 milhões) e US$ 25 milhões (R$ 79,5 milhões) anualmente para exibir suas marcas com exclusividade durante o evento, enquanto os patrocinadores nacionais desembolsam entre US$ 4,5 milhões (R$ 14 milhões) e US$ 7,5 milhões (R$ 24 milhões) para associarem suas marcas à Copa do Mundo.

    Com seu espírito expansionista, Blatter trouxe patrocinadores de confederações historicamente laterais, como a Satyam (Índia) e Yingli (China).

    O interesse dos patrocinadores se deve à abrangência mundial alcançada pelos eventos da Fifa, em especial a Copa do Mundo. Tal abrangência levou ao acirramento das disputas por direitos de transmissão, que então inflacionou os valores desses mesmos direitos.

    "A Fifa começou a crescer no momento em que o futebol se tornou mundial, universal", explicou Blatter antes de sua reeleição. "João Havelange, meu antecessor, me disse: 'você criou um monstro'. É o casamento da televisão e do futebol que fez essa explosão econômica da Fifa".

    Com Blatter, a exposição das marcas chegou no limiar da sobrecarga: na Copa do Mundo, o controle é minucioso, para que as marcas concorrentes não apareçam, e os parceiros estão em todos os lugares e espaços - produtos licenciados, "backdrops", propagandas nas redes sociais, na televisão, músicas oficiais, etc.. Com o suíço, os parceiros do espetáculo tiveram certeza de que suas marcas seriam exibidas à exaustão para milhares de consumidores-torcedores.

    Somados, os patrocínios e os direitos televisivos renderam US$ 4,1 bilhão (R$ 13 bilhões) à Fifa entre 2011 e 2014.

    Atualmente, a Fifa conta com 474 funcionários, com os quais gasta US$ 397 milhões (R$ 1,3 bilhão) por ano.

    PRESSÃO DOS PATROCINADORES

    Nos últimos anos, à luz dos escândalos envolvendo a Fifa, os patrocinadores pressionaram Blatter com frequência, pedindo "mais transparência".

    A Sony encerrou uma relação de dez anos de patrocínio em novembro de 2014, em meio a revelação do escândalo das compras de votos na escolha dos países-sede das Copas de 2018 e 2022.

    Parceira da Fifa desde 1974, a Coca-Cola declarou publicamente que considerava "desapontadores" os resultados da investigação da compra de votos encaminhada pela entidade, e pedia mais "transparência" e "eficiência".

    Alguns patrocinadores avaliaram positivamente a saída do suíço do comando da Fifa.

    "O anúncio de hoje é um passo positivo para o bem do esporte, futebol e seus fãs", disse a Coca-Cola em comunicado.

    "O Grupo Adidas está totalmente comprometido com a criação de uma cultura que promove os mais altos padrões de ética e transparência. A notícia de hoje marca um passo na direção certa ´para estabelecer e seguir os padrões de transparência em tudo o que fazem", publicou a marca alemã.

    "O futebol tem a capacidade única de unir o mundo enquanto impacta positivamente em comunidades e economias. As alegações de corrupção e ética questionável dentro da Fifa ofuscou o jogo e tirou o foco do esporte, dos jogadores e dos fãs. Esperamos que as mudanças sendo implementadas na Fifa sejam um grande primeiro passo em reformar positivamente a organização e recuperar a confiança dos torcedores no mundo inteiro", reforçou o McDonald's.

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