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    Presidente do handebol do Canadá, brasileira diz sofrer preconceito

    (...) Depoimento a
    MARCEL MERGUIZO
    ENVIADO ESPECIAL A TORONTO

    21/07/2015 02h00

    Danilo Verpa/Folhapress
    Raquel Pedercini Marinho, presidente da Confederação de Handebol do Canada
    Raquel Marinho, presidente da Confederação de Handebol do Canadá

    Ela podia ser mais uma entre os 20 mil voluntários no Pan de Toronto. Mas a mineira Raquel Marinho, 39, é presidente da Federação Canadense de Handebol. Única mulher e estrangeira a dirigir uma federação esportiva no país, ela conta como é enfrentar os preconceitos e as dificuldades da modalidade.

    *

    Sou nascida e criada em Belo Horizonte e estou há seis anos no Canadá. Me graduei e fiz mestrado em educação física. Uma vida ligada ao esporte, como jogadora, treinadora e administradora.

    Joguei na seleção brasileira de handebol nos anos 1990, quando até tínhamos que vender camisa para arrecadar dinheiro. Também joguei na de badminton.

    Vim para o Canadá fugir da violência e fazer doutorado. Fiz curso de treinadora para trabalhar com times de província. Comecei a dar aulas do que chamam de "esportes diferentes" na faculdade. São modalidades que ninguém conhece, como o handebol.

    Passei a treinar a equipe de Ontário, depois fui para a seleção feminina do Canadá. Me puseram como vice da federação e, em 2014, fui eleita presidente. Foi meteórico.

    CANADÁ

    A seleção não é forte por questões financeiras. O governo investe bilhões de dólares, mas apenas se o esporte está entre os cinco melhores do mundo. Aí há marketing e patrocínios privados.

    Se não, não há nada.

    Hoje, a federação não tem ajuda de ninguém. Sobrevive de doações, normalmente dos pais dos atletas.

    É graças ao amor dos atletas que estamos aqui. Para ficar na Vila do Pan, cada um pagou 8.000 dólares canadenses (cerca de R$ 20 mil).

    Houve promessa de verba do governo, que não veio. A gente tentou apoio, não conseguiu. Em média, cada atleta pagou mais 20 mil dólares canadenses (cerca de R$ 50 mil) para se preparar no ano.

    Ou seja, convoco 30. Mas os 30 têm condições de bancar? Não. Então convoco outros. Os 15 melhores do país estão aqui? Não, são os 15 que podem pagar. Os treinadores são voluntários, ninguém recebe nada na federação.

    HANDEBOL

    No Brasil, a gente falava que handebol é futsal com a mão. Aqui, o mais próximo que eles conseguem é dizer que é um polo aquático sem piscina. Hóquei sem gelo.

    Eles usam regras do basquete e gol do hóquei nas aulas. O goleiro joga agachado.

    Minha proposta é inserir o handebol nas escolas.

    Em Ontário [onde fica Toronto] é proibido ter handebol nas escolas porque, há muitos anos, um moleque se pendurou em uma trave, que caiu nele e ele morreu.

    E a culpa foi do handebol, porque a trave era a quadrada do handebol. A província proibiu, porque o handebol mata. Foi banido das escolas.

    PRECONCEITO

    Mulher presidente de federação, só eu. Estrangeira, só eu. Estou no processo de cidadania, mas informalmente sofro com preconceito.

    Por ser estrangeira, da América do Sul e brasileira, existe uma série de comentários que são "brincadeira", mas com fundo de verdade.

    De vez em quando, surge em reunião. Eles falam "você não é canadense, não entende". Mas eu entendo. É pejorativo no sentido de "você é do Terceiro Mundo, não sabe como é viver no Primeiro, não entende como é ser rico, como as políticas funcionam". Só que corrupção existe em qualquer lugar, inclusive em países do Primeiro Mundo.

    Falo para eles: "Sou latina, sou brasileira, sou mulher, mas não sou burra. Falo inglês com sotaque, mas eu sou presidente e vocês, não. Então, sou muito mais inteligente do que vocês pensam."

    CONFIRA AS MEDALHAS DO BRASIL NO PAN-2015

    Crédito: Editoria de Arte/Folhapress

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