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    Joga-se sem controle no Brasil, mas com emoção, diz Osorio

    RAFAEL VALENTE
    DE SÃO PAULO

    26/07/2015 02h00

    Falar de futebol é algo que agrada a Juan Carlos Osorio, 54, técnico do São Paulo há 56 dias e que chegou ao Brasil com o apelido que o fez famoso na Colômbia: professor.

    Com formação focada no esporte, com cursos reconhecidos pela Uefa (associação europeia de futebol), o colombiano não veio só para ensinar. Está aprendendo e se adaptando ao futebol local.

    Uma diferença ele já sentiu: o comportamento do jogador brasileiro em campo.

    Não os atos de indisciplina, como reclamações dos atletas ao serem substituídos, e sim o estilo de jogo. Para Osorio, o brasileiro é mais emotivo que em outros países por tomar decisões não necessariamente táticas.

    Ao receber a Folha no centro de treinamento do São Paulo, onde está morando desde que chegou ao Brasil, reforçou que a constatação não é uma crítica, mas sua avaliação do nosso estilo.

    *

    Folha - Como está a adaptação do senhor ao Brasil?

    Osorio - As minhas expectativas estão correspondendo ao dia a dia. Infelizmente, a maior barreira é o idioma. Fiz quatro aulas de português até agora, mas não falar fluentemente atrapalha. A mensagem é muito importante para que os jogadores entendam meus métodos de trabalho.

    Qual é o método do senhor?

    É mesmo dos americanos: perguntas e respostas. O mais importante é conhecer a opinião do jogador. Não se trata de impor minha decisão, mas sim fazê-los entender que há outras maneiras de jogar futebol. Minha forma de treinar está totalmente ligada à minha formação acadêmica.

    O que propõe aos jogadores?

    Tomada de decisão. O ser humano toma decisões a todo momento na vida. O futebol é assim. Minha responsabilidade é desafiar os jogadores nos treinos para que eles tomem as melhores decisões e repitam elas nas partidas.

    De onde veio a inspiração?

    Da vida. A maior decisão que tomei foi aos 23 anos. Jogava na Colômbia e decidi ir aos EUA estudar e trabalhar [na construção civil, operando britadeira] para ser treinador. Isso mudou minha vida. Na Inglaterra, onde fui auxiliar técnico no Manchester City [2001-2006], aperfeiçoei o método. É a melhor forma de trabalhar com jogadores.

    O senhor disse que o jogador brasileiro é mais emotivo. Poderia explicar melhor?

    Utilizei essa expressão para descrever como se joga no Brasil: sem controle do jogo, mas com emoção. O jogo dá inúmeras possibilidades, mas não há princípios que regem a decisão do jogador brasileiro. Um jogador pode dar um passe de letra [calcanhar] no jogo, mas essa jogada é válida na área rival. Não tem sentido no meio ou na defesa. Na Europa não se permite. Aqui, se o técnico não tem regras específicas, o jogador faz isso em qualquer parte do campo.

    Ainda estou conhecendo o Brasil. Já investiguei que os jogadores do Sul sofrem menos riscos durante o jogo, são mais equilibrados. Por outro lado, os jogadores do Rio são mais alegres, têm mais liberdades e arriscam mais.

    Como tem feito para estudar o futebol brasileiro?

    Pergunto, observo e converso com jogadores e técnicos. Acompanho o futebol brasileiro há 20 anos. Não é surpresa o que estou vendo.

    Infelizmente, as torcidas influenciam muito as decisões dos clubes. Outro dia estava decidido a assistir um jogo em São Paulo e me aconselharem a não fazer pela rivalidade. Na Inglaterra, assisti muitos jogos e nunca houve problema. Depois dos jogos, conversava com os técnicos. Havia uma troca de informações entre nós. É uma maneira de aprender e melhorar. Acredito que os clubes devem trabalhar juntos para melhorar o espetáculo.

    Os americanos foram mal na Guerra do Vietnã por não conhecerem o cenário, o ambiente e o adversário. O mesmo conceito vale no futebol.

    Após a Copa-14, criou-se um consenso de que o futebol brasileiro está atrasado tecnicamente. O que acha?

    A discussão é correta. Se deve falar e confrontar o futebol. Creio que outros técnicos vieram aqui para aprender sobre o futebol brasileiro. Talvez tenham entendido como pensam, trabalham e jogam os brasileiros. E os brasileiros não se deram a oportunidade de conhecer outros países e outras formas de treinar.

    Mas não posso dizer que o Brasil está atrasado. O campeonato é muito bom, tem bom nível técnico, com oito grandes times. Acredito só que o futebol brasileiro não avançou tanto como avançaram os outros países.

    Nesses 50 dias, aprendeu algo com o futebol brasileiro?

    Aprendi muitas coisas. Vou falar de uma. Aqui temos saudades. É natural. Os argentinos têm de Maradona, os franceses têm de Zidane. E o Brasil tem de Falcão, Zico, Pelé... Isso é bom, mas também é mal. Atrapalha o progresso. Os grandes exemplos devem ser ponto de referência para produzir atletas similares.

    Qual marca o senhor gostaria de deixar no São Paulo?

    O mais importante é que me reconheçam como um profissional consagrado, que trabalhou o máximo para fazer o São Paulo e os jogadores alcançarem o sucesso.

    RAIO X - JUAN CARLOS OSORIO

    NASCIMENTO
    8.jun.61 (54 anos), em Santa Rosa de Cabal, na Colômbia

    FORMAÇÃO ACADÊMICA
    Graduado em ciências do exercício físico e do rendimento humano pela Univ. Southern Connecticut; pós-graduado em ciências superiores de futebol pela Universidade de Liverpool

    CLUBES QUE TREINOU
    Millonarios-COL, Chicago Fire, New York, Once Caldas-COL, Puebla-MEX e Atlético Nacional-COL

    PRINCIPAIS TÍTULOS
    4 Campeonatos Colombianos e 2 Copas da Colômbia

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