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    Sem esquecer Guga, Marcelo Melo pede valorização à sua geração

    PAULO ROBERTO CONDE
    DE SÃO PAULO

    27/10/2015 08h55

    Como todo bom mineiro, Marcelo Melo conduziu sua carreira sem alarde ao longo dos últimos 17 anos. Jogador sólido nas duplas, nos últimos anos acostumado a frequentar a lista dos dez melhores do mundo, na última sexta (23) ele ganhou o mundo.

    Com uma vitória nas quartas de final do ATP 500 de Viena –cujo título conquistaria no domingo (25) –, Melo, 32, assegurou que será o número 1 do ranking.

    A data da posse está confirmada: dia 2 de novembro, quando a ATP (Associação dos Tenistas Profissionais) atualizará a classificação.

    É a cereja do bolo da mais prolífica temporada da carreira do mineiro, que conquistou cinco troféus, entre eles o de Roland Garros, seu primeiro de Grand Slam.

    Nesta entrevista à Folha, ele reivindica a valorização dessa atual geração do tênis brasileiro, com jogadores entre os 50 melhores em todas as disputas.

    "Não é que a era Guga ficou para trás e não veio ninguém. Não. Tem o número 1 do mundo em duplas, tem o Bruno, tem o Thomaz, tem a Teliana", afirmou Melo.

    Bildagentur Zolles KG/Christian Hofer/Centauro
    Marcelo Melo devolve bola em jogo das quartas de final do ATP 500 de Viena
    Marcelo Melo devolve bola em jogo das quartas de final do ATP 500 de Viena

    *

    Folha - Como foram os primeiros dias como número 1 do ranking mundial, ainda que não oficialmente?
    Marcelo Melo - Este tem sido um ano muito especial. Após ganhar Roland Garros, virar número 1 foi um sentimento bem parecido. São dois sonhos que qualquer tenista tem desde pequeno.
    O título em Roland Garros foi algo que demorei a digerir. Me perguntavam: 'Marcelo, você já sabe o que aconteceu?' E eu dizia que não, que precisava chegar ao Brasil para realizar. E agora acho que será a mesma coisa com o número 1. Só depois do Masters 1.000 de Paris é que vou voltar ao país e devo realizar o que foi isso. Muitos jogadores tops de simples me deram os parabéns, porque acompanham o circuito de duplas e sabem o que é ser número 1 do mundo, ainda mais na era dos irmãos [norte-americanos Bob e Mike] Bryan. É gratificante, eu não esperava tanto reconhecimento.

    Dos dois sonhos, qual foi mais saboroso conquistar: um troféu de Grand Slam ou liderar o ranking mundial?
    Por enquanto, ter ganhado Roland Garros. Porque eu ainda não tive um sabor do que é ser o primeiro, né? Por mais que eu saiba que serei, a ficha só vai cair quando eu vir o 1 ali, com meu nome ao lado, no próximo ranking. Aí eu vou poder comparar um com o outro. Por exemplo, na semifinal de Viena, houve o anúncio dos jogadores e o locutor falou 'Melo, futuro número 1 do mundo'. Ali eu pensei 'sou eu mesmo'. Na hora eu nem estava lembrando disso. Mas o público bateu mais palmas, enalteceu muito mais o fato, sabendo que é especial para uma pessoa.

    E como foi conter essa emoção durante o jogo, já que você disputava vaga na final?
    Nas quartas de final, na verdade, eu senti uma pressão maior, porque sabia que se ganhasse lideraria o ranking. Jogávamos contra uma dupla que havia sido campeã de Wimbledon [o holandês Jean-Julien Roger e o romeno Horia Tecau] e havia pressão.
    Eu acho que naquele momento senti até mais do que na semifinal, mas quando ganhamos tiramos um peso das costas. Mas falei para o Lukasz que precisava focar no torneio e depois pensaria no que fiz. Preferi até me isolar um pouco, porque aquela empolgação de todos gera muita ansiedade. Nem ficava olhando para o celular.

    Houve comemoração?
    Vida de tenista tem dessas coisas. Quando saí das quartas de final já era mais de 1h da manhã e praticamente não falei com ninguém. Eu tinha que dormir por causa da semifinal. Meu celular tinha mais de 650 conversas no Whatsapp e eu não pude responder. Tive que ser um pouquinho frio, mas não podia pensar que seria número 1 do mundo, tinha jogo. A comemoração ficou para quando tiver tempo. Mas, com certeza, vamos ter que fazer.

    A que se deve essa temporada tão produtiva, com cinco títulos, um deles de Grand Slam?
    Se analisarmos o meu ranking, é possível ver que eu tenho evoluído desde 2008. Teve só um ano que foi meio intermediário, em que não subi mas me mantive. Com os resultados, consegui ficar mais experiente e mais sólido. E este título em Roland Garros me levou a outro patamar. Ganhar dos Bryan em uma final de Grand Slam é grandioso. Consegui canalizar estes momentos importantes e tudo tem ajudado.

    O quanto o número no ranking influencia em termos de respeito dentro do circuito?
    O respeito é muito maior. Especialmente agora. Os adversários sabem que você não constrói uma liderança de ranking em poucos dias. Isso leva muito tempo, leva um ano todo, como este. E como joguei com vários parceiros ao longo do ano, ninguém pode dizer que fiz resultados por causa deste ou daquele parceiro. Abre um leque de oportunidades, mas ao mesmo tempo devo ter cuidado para fazer uma boa escolha.

    Você vê uma evolução do tênis brasileiro atualmente?
    Com certeza, está melhor do que antes. Nas duplas, eu e o Bruno estamos entre os melhores do mundo. Nas simples, o Thomaz [Bellucci] está muito bem neste ano. No feminino, a Teliana [Pereira] conquistou títulos do circuito e está no melhor ranking de sua carreira. Alguns juvenis têm jogado bem. Enfim, com certeza está melhor do que há alguns anos. Mas não podemos achar que, por estar melhor, está bom. É preciso continuar a evoluir, e isso vale para os meninos do juvenil e para nós, lá em cima. É importante saber que hoje está melhor do que ontem, mas é preciso que o amanhã seja melhor do que o hoje. Agora é usar este momento a favor do tênis brasileiro.

    É uma geração que deve ser valorizada e às vezes não é?
    Logicamente, é importante enaltecer aqueles que fizeram muito no passado, como é o caso do Guga. Mas também os presentes. Não gosto muito de quando uma pessoa só está levando o tênis. Hoje, são vários. É uma era de novos jogadores tentando enaltecer o tênis brasileiro.
    Não é a era do Bruno, a era do Marcelo, mas todos fazem um bom trabalho. A Teliana, no feminino, que era muito esquecido, tem feito muitas meninas acreditarem que podem ser grandes atletas.
    E eu não acho justo deixar o foco só em mim ou no Thomaz e esquecê-la. Tem espaço para todo mundo. Não é que a era Guga ficou para trás e não veio ninguém. Não. Tem o número 1 do mundo em duplas, tem o Bruno, tem o Thomaz, tem a Teliana.

    Com essas conquistas, você acha que escreveu o nome na história do tênis brasileiro e está junto com Guga e Maria Esther Bueno, entre outros?
    Ah, se eu não conseguir pôr agora, quando vou conseguir, né [risos]? Mas, no mesmo ano, ganhar um Grand Slam e se tornar número 1 do mundo, ainda mais na era dos Bryan, é muita coisa. Com certeza, independentemente do ano, ser número 1 do mundo me garante num lugar ali com eles.

    Você tem 18 títulos na carreira, dos quais cinco no ano, e US$ 3 milhões em prêmios. É muito menos do que qualquer jogador top 100 em simples. O que acha do abismo entre simples e duplas na ATP?

    Existe. A dupla ganha de 15% a 20% do que um jogador de simples fatura. Entendemos que as partidas de simples têm muito mais visibilidade, mas aos mesmo tempo os próprios jogadores de simples defendem aumento em premiação para os duplistas. É uma coisa que vem melhorando. Neste ano já percebi aumento de público, especialmente nos Grand Slam. É uma bola de neve que vai crescer e favorecer aos duplistas para elevar essa porcentagem de premiação.

    Como está a expectativa em relação aos Jogos do Rio?
    As chances são grandes [de medalha]. Eu venho jogando bem, o Bruno [Soares, com quem fará dupla] não vem em fase tão boa, mas pode evoluir. Nós chegaremos lá em nosso melhor nível para tentar a medalha. Todos sabemos que é uma competição que junta os melhores do mundo, então é preciso botar o pé no chão e trabalhar muito até lá. Por mais que esteja entre os três melhores do ranking lá, temos que pôr na cabeça que é provável encarar um Federer/Wawrinka na primeira rodada. É duro, mas estou certo de que chegarei lá no melhor nível possível.

    O piso escolhido para a Rio-2016 é o duro. Agrada?
    É o melhor piso para mim e o Bruno. É um piso no qual gostamos de jogar. Tudo está dentro do planejado e foi uma boa escolha.

    Como fica o seu final do ano e início da próxima temporada?
    Ainda tenho o Masters 1.000 de Paris [a partir do dia 2] e as Finais da ATP, em Londres. Eu e o Ivan [Dodig, croata, parceiro usual de Melo] estamos garantidos até o Aberto da Austrália. Depois teremos de conversar um pouco, porque vai depender do ranking de simples dele. Eu e o Bruno jogaremos alguns torneio juntos antes dos Jogos Olímpicos do Rio.

    RAIO-X
    MARCELO MELO

    NASCIMENTO
    23.set.1983 (32 anos), em Belo Horizonte (MG)

    PESO/ALTURA
    88kg/2,03 m

    TÉCNICO
    Daniel Melo (irmão)

    PROFISSIONAL
    Desde 1998. Tem 18 títulos em duplas, entre eles Roland Garros-2015. Em prêmios, acumula US$ 3.009,249

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